LC Antero – Comunistas debatem 48 anos de reorganização do PCdoB
O Comitê de Fortaleza viveu uma noite de casa cheia, ontem, 24 de fevereiro , na sua programação permanente das Quartas Vermelhas. Foi a data escolhida para a comemoração do aniversário da reorganização do Partido Comunista do Brasil, um momento muito especial que vive anualmente a organização política revolucionária do proletariado e do povo brasileiro, a cada 18 de fevereiro. A ocasião foi exemplar das frequentes iniciativas do partido vivo que temos em Fortaleza.
Publicado 26/02/2010 09:33 | Editado 04/03/2020 16:34
Neste inesquecível e festejado dia heróico, no ano de 1962, reuniram-se para o combate aproximados 100 comunistas — remanescentes e resistentes à onda reformista e revisionista que se abateu sobre as fileiras partidárias após o 20º Congresso do Partido Comunista da União Soviética.
Este punhado de aguerridos lutadores — numericamente ainda apenas um terço dos espartanos que barraram o avanço de cinco mil persas no desfiladeiro de Termópilas, na antiga Grécia — empreenderam a gigantesca e hercúlea tarefa de soerguer o partido revolucionário que naquele ano completava seus 40 anos, saindo de uma dura e provada adolescência e ingressando na mais árdua fase adulta.
Pois, logo em seguida, no dia 1º de abril de 1964, ocorreria o golpe militar que baixaria um manto de trevas de 21 anos sobre o País, mas que ofereceria aos comunistas o cenário para a justa e dura comprovação de que o capitulacionismo, o revisionismo, o liquidacionismo e a acomodação não fariam prosperar os ideais de construção de uma nova sociedade, socialista.
Brilhante intervenção
Coube ao camarada Luis Carlos Paes, presidente do Comitê Municipal da Capital Vermelha — denominação conquistada pela capital cearense após sucessivas históricas vitórias da esquerda, além disso uma cidade há séculos erigida em torno de uma fortificação militar —, discorrer, de modo generoso e objetivo, sobre os acontecimentos que permearam a vida do Partido Comunista ao longo dos quatro decênios.
Luis Carlos, numa brilhante conferência que lotou o Auditório Cesar Uchoa (homenagem a um militante sindical e bancário do Ceará falecido precocemente), manteve a atenção do público com um exame articulado das circunstâncias que, no Brasil e no mundo, ocasionaram a reorganização.
O dirigente comunista, antes de se deter no processo imediato de reorganização, descreveu um pouco da história de luta dos explorados em todo o mundo, particularmente na atual etapa histórica da humanidade sob a hegemonia do capitalismo. Acentuou o papel de Marx e Engels, como fundadores da ciência que possibilita aos trabalhadores compreender o funcionamento da sociedade capitalista, entender os processos pelos quais a história da sociedade humana se desenvolve e, principalmente, como organizar as suas forças para a conquista de uma nova sociedade sem oprimidos e opressores.
Ciência marxista: arma contra os desvios
Luís Carlos destacou também que, no início do século passado, o jovem e combativo movimento operário brasileiro sofria a influência das ideias anarquistas, mas, sob a impactante Revolução de Outubro na Rússia; compreendeu que o caminho para a sua verdadeira emancipação exigia a construção de um Partido inspirado no exemplo daquele (Vladimir Ilitch Ulianov Lenin ou Lenine) que conduzira o proletariado russo à vitória.
Observou que, pela falta de um conhecimento maior da ciência marxista, o Partido oscilava entre desvios em políticas de esquerda e direita. Ressaltou, entretanto, o esforço desenvolvido, em especial nos anos 1950, de edição de obras marxistas, da revista teórica do partido, de sua escola de formação e da ampliação da imprensa comunista em todo o território nacional.
Neste rumo, o esforço de conhecimento do marxismo e da realidade brasileira, além de subsidiar a elaboração do primeiro programa do partido em 1954, forjou um certo número de quadros na direção nacional e em alguns estados, possibilitando o enfrentamento do revisionismo contemporâneo, desde a realização do XX Congresso do PCUS em 1956.
Firme combate à rendição e ao oportunismo
Este núcleo, explicitou Luis Carlos, confrontou idéias que semeavam a crença segundo a qual o capitalismo não tinha como reagir ao avanço do socialismo no mundo e que, portanto, seria possível realizar o enfrentamento pacífico no plano externo e em cada país.
Tratava-se da transfiguração dos partidos comunistas, de organizações de combate em agremiações reformistas preocupadas essencialmente em ampliar os seus espaços nos embates eleitorais, venerando, em total rendição, a legalidade burguesa, aderindo em decúbito às suas regras e determinações.
Enfim, significava a liquidação de qualquer possibilidade de transformação revolucionária, de destruição do estado burguês e de construção da nova sociedade socialista.
O ambiente político brasileiro, desfrutando de uma certa liberdade e de um desenvolvimento econômico acelerado, era propício a que esse ideário frutificasse, inclusive no seio do Partido Comunista. E assim, a partir da adesão de Prestes, que reunia forte influência sob a direção e militância partidárias, foi aprovada a Declaração de Março de 1958.
Somente não esperavam — os tergiversadores — que João Amazonas e Maurício Grabois, entre outros destacados dirigentes marxistas-leninistas, comandassem uma resistência heróica em defesa das idéias e do programa revolucionário, seja no debate interno durante o V Congresso em 1960, seja na traição de 1961, quando os reformistas verde-amarelos (tão verdes quanto amarelos) mudaram os estatutos, desfiguraram o programa e criaram uma nova organização chamada Partido Comunista Brasileiro, à revelia do Congresso partidário, sob o argumento de que assim obteriam o registro legal da legenda.
Rumo teórico anti-oportunista e construção coletiva
Assim, a resistência à desfiguração da imbatível legenda comunista possibilitou a reorganização do original Partido Comunista do Brasil, em fevereiro de 1962, quando foi aprovado um programa revolucionário. E, pode-se afirmar que, após 40 anos de sua fundação, consolida-se uma consciência e uma maturidade política que lhe permite desenvolver até os nossos dias uma ação ao mesmo tempo ampla e flexível, democrática, simpática às massas e articulada, sem abrir mão de seus princípios e da luta revolucionária pela instauração do socialismo em nosso país.
O dirigente comunista enumerou, enfim, algumas lições acerca da necessidade:
(1) de se fomentar o estudo e a assimilação das bases teóricas do socialismo, desenvolvidas por Marx, Engels e Lênin, sem desconhecer as contribuições de outros intelectuais revolucionários, inclusive a rica produção de nosso partido;
(2) do combate permanente às idéias oportunistas e seus desvios, de direita ou de esquerda, que teimam em assediar cotidianamente os quadros comunistas e predominam nas demais organizações de esquerda, traficando com os princípios, visando afastar as massas do caminho revolucionário; e
(3) da construção coletiva do partido, do fortalecimento do princípio da direção coletiva, do funcionamento regular e cotidiano das organizações de base como centros de formação política e de planejamento da ação dos comunistas nas mais diversas frentes de luta.
Rico debate
Em seguida, diversos camaradas presentes contribuíram no rico debate que se seguiu, pontuando interessantes questões voltadas para o aprofundamento do tema, correlacionando com as lutas atuais na cidade e informando sobre atividades da frente comunitária (Luis Leão), juvenil (Marcelão) e de mulheres (Francileuda).
Outros, a exemplo de Marcelo Nogueira, abordaram a questão do culto à personalidade e dos erros cometidos durante a construção do socialismo na União Soviética que abriram espaço para a liquidação revisionista. Ricardo Mendes ponderou que as lições históricas mostram também que as lutas devem estar articuladas à construção soberana do Estado nacional e ao fortalecimento da nação.
José Maia acentuou que a influência e autoridade preponderantes do PCUS no movimento comunista, também sob a influência do culto à personalidade, ajudaram a disseminar o falso caminho, ressaltando a moderna importância da assimilação do marxismo e do conhecimento da realidade de seus países, pelos partidos nacionais, procurando caminhar com suas próprias pernas. Acentuou que o tempo deu razão aos revolucionários na sua luta contra o reformismo no início dos anos 1960.
Um outro camarada ressaltou que o Partido Comunista do Brasil foi saudavelmente influenciado pelas lições extraídas da intensa luta ideológica verificada até o período da reorganização, com desdobramentos posteriores, inclusive acerca do culto à personalidade, que não encontrou guarida nos organismos de direção fundamentais. Exemplarmente, João Amazonas, até seus últimos dias, costumava atribuir a Mauricio Grabois, que tombou em combate na Guerrilha do Araguaia no natal de 1973, sua admiração e afeto, seu elevado protagonismo.
E , ele próprio, no leito de onde se despediu da família, dos camaradas e dos amigos, assinalou seu desejo de ser cremado e de ter suas cinzas espalhadas na região sem um local ou monumento onde se realizasse qualquer tipo de veneração individualizada a sua memória, que sempre considerou associada à construção coletiva do partido revolucionário.
Luis Carlos Antero é Mestre em Sociologia, escritor e jornalista. No início anos 70 atuou no Jornal dos Esportes, O Globo, Última Hora e Diário de Noticias. Assessor parlamentar no Congresso Nacional desde 1995.
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