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Diálogo continua em último dia do prazo para restituir Zelaya

O prazo final imposto pelo presidente deposto de Honduras, Manuel Zelaya, para que haja uma saída negociada para a crise no país termina nesta quinta-feira (15), à meia-noite. Negociadores de Zelaya e do governo golpista, liderado por Roberto Micheletti, voltam à mesa de negociações para buscar um pacto. Micheletti decretou hoje feriado nacional, após Honduras conseguir, ontem à noite, se classificar para a Copa do Mundo da África do Sul, informou o jornal local "La Prensa".

Ontem, os negociadores de ambas as partes anunciaram terem chegado a um consenso sobre o retorno de Zelaya ao poder, mas o texto ainda seria submetido ao presidente legítimo e ao golpista. Pouco depois, Micheletti negou que houvesse acordo. Segundo ele, a restituição esbarraria em uma questão jurídica.

"Estão pedindo que seja o Congresso que determine se ele pode regressar ou não, mas este é um assunto legal, definitivamente é a Corte Suprema de Justiça (quem deve decidir)", afirmou o ditador à imprensa local. Na prática, Micheletti rechaçou o texto acertado pelos seus próprios negociadores, um sinal de que está em descompasso até mesmo com seus apoiadores.

A insistência de Micheletti em relação à Corte Suprema se dá pelo fato de o Congresso ter se colocado contra a restrição de garantias constitucionais imposta pelo golpista. Além disso, desde que Zelaya voltou ao país e abrigou-se na Embaixada do Brasil, há 25 dias, o Legislativo tem dado mostras de que espera que a crise se resolva e que está menos favorável a Micheletti.

Zelaya não disse que atitudes pretende tomar caso o prazo imposto por ele para um acordo expire. A preocupação do presidente legítimo, ao estipular um limite para sua restituição, é que a permanência dos golpistas no poder inviabilize as eleições convocadas para 29 de novembro. Ontem à noite, após Micheletti negar ter entrado um consenso, Zelaya disse que está disposto a discutir mudanças na proposta sobre sua restituição, mas que tem pouca confiança sobre o comprometimento de Micheletti por um acordo.

"Eu não acredito no que os líderes do golpe dizem. Eu acho que, quando chega no ponto de rejeitar o golpe, o que significa minha restituição, Micheletti dará outro tapa no mundo porque ele se oporá", disse Zelaya à Radio Globo, estação fechada pelo governo interino sob estado de sítio e que transmite apenas pela internet.

Consequências

Um eventual fracasso do diálogo entre as partes em Honduras poderá mergulhar o país num limbo político e legal. Internamente, zelaystas já planejam boicotar a eleição presidencial de 29 de novembro e não reconhecer seu resultado, caso o governo de fato de Roberto Micheletti não concorde com a restituição do presidente deposto Manuel Zelaya. Afinal, que legitimidade teria o pleito organizado por um governo golpista?

Externamente, países e organizações internacionais seguem a mesma linha e afirmam que não terão como reconhecer o processo eleitoral conduzido por um regime que consideram ilegítimo. Carlos Eduardo Reyna, assessor de Zelaya, garantiu que, diante da eventual falta de consenso sobre o tema da restituição até hoje à noite, um plano de boicote às eleições de novembro seria "imediatamente" posto em prática.

Responsável por garantir as eleições segundo a Constituição hondurenha, o Exército diz estar preparando medidas adicionais contra um eventual boicote. "Nossos serviços nacionais de informação estão em ação", disse um membro do alto comando das Forças Armadas que pediu anonimato. "Temos uns 600 veículos pesados para garantir a entrega dessas urnas e o bom funcionamento do processo eleitoral."

No campo da diplomacia, um eventual naufrágio do diálogo prolongaria indefinidamente o isolamento hondurenho. Dias depois do golpe, Honduras foi suspensa da Organização dos Estados Americanos (OEA). Em seguida, a Assembleia-Geral da ONU aprovou uma resolução não vinculante contra o governo de facto e seu secretário-geral, Ban Ki-moon, declarou que não daria apoio a uma eleição sem a restituição de Zelaya.

"Esse isolamento nos levou a uma catástrofe econômica sem precedentes", disse o ex-ministro do Comércio Jaime Turcios. "Torramos quase US$ 1 bilhão das reservas do país com essa ruptura", completou, expondo as cruéis consequências da investida golpista.

Até tropas estão cansadas

Além da questão econômica, três meses e meio de impasse político, entre pancadarias e diálogos infrutíferos, foram mais que suficientes para acabar com a paciência dos hondurenhos. Ontem, até os policiais mobilizados para conter uma pequena manifestação ao lado do hotel onde ocorrem as negociações reclamaram.

"É muito tempo de crise. Vamos para a rua todo dia com risco de choques, de violência. Dá um tremendo cansaço", disse ao Estado um oficial que se identificou como Luís, encolhido sob a sombra de um arbusto. "Nem sei se conseguirei acompanhar o jogo de hoje (ontem)", continuou, referindo-se à partida entre as seleções hondurenha e salvadorenha de futebol, que valeu um vaga para Honduras na Copa do Mundo de 2010.

Os policiais antidistúrbio de Tegucigalpa usam equipamento moderno, de fabricação americana e sul-coreana. Mas os coletes e fardas são pretos e cinzas, pouco convenientes num país caribenho. Assim, pelotões costumam buscar refúgio na sombra de árvores e postes. A ação, em geral, é a de reprimir protesto com gás de pimenta e jatos d"água com produtos químicos.

Com agências