A elite brasileira alimenta o preconceito, diz Edson França
Para Edson França, da executiva da Unegro, é importante lutar contra o PSDB e o PFL, que formam o que ele chamou de “núcleo racista da política nacional”. Em entrevista ao jornal A Classe Operária, que reproduzimos aqui, no Parti
Publicado 23/05/2006 19:58
A pergunta era simples, mas foi o gatilho para que Edson França, da executiva nacional da União de Negros pela Igualdade (Unegro), tivesse sua face transformada. Em um instante, seu olhar tímido brilhou. Ao falar para o jornal A Classe Operária sobre o resultado da plenária realizada pela Unegro na cidade de Olinda, em abril – quando foi aprovado o Manifesto de Olinda e a realização do 3º Congresso da Unegro em 2007 na capital mineira – França fez um relato contundente sobre a luta que tem sido travada pelo fim das desigualdades raciais e sociais, a participação da entidade neste flanco e o salto que o PCdoB deu nesta direção.
Neste ponto, França destacou o papel do PCdoB na defesa dos interesses nacionais e a crescente participação do partido também na luta dos negros. O artigo 58 do novo estatuto do PCdoB, aprovado no 11º Congresso, estabelece que “o combate ao racismo é parte integrante do projeto de emancipação social e nacional pelo qual luta o Partido, e envolve não apenas militantes que atuam nessa frente específica, mas todo o coletivo partidário”. Segundo França, houve uma sensível evolução na visão do partido sobre esse assunto. “O PCdoB alcançou um alto grau de maturação sobre o assunto e vem avançando muito nessa discussão, o que é muito importante para aumentar a inserção do partido em camadas variadas da sociedade, em especial as mais populares”.
Unegro mais forte
Ao longo de dezoito anos de existência, a Unegro cresceu e passou a influenciar mais o movimento anti-racismo. “Trata-se de um instrumento viável de luta contra a discriminação. Hoje, precisamos aproximá-lo das lutas mais gerais”, explica França. Ele ressalta que é uma grande vitória a realização do 3º Congresso da Unegro no próximo ano, que deve reunir, de acordo com a meta estabelecida na plenária, cerca de 500 pessoas. Segundo o dirigente, “o objetivo é aproximar cada vez mais a Unegro das lutas sociais e ampliar o diálogo com outros segmentos, com maior atuação na Coordenação dos Movimentos Sociais (CMS). Da mesma forma, queremos participar ainda mais da vida política, contribuindo para o desenvolvimento nacional e da América Latina”.
França ressaltou que é necessário mudar a perspectiva da luta racial no Brasil. Ele explicou que, em geral, o movimento negro acaba por privilegiar clivagens. Embora existam diferenças, elas não chegam a ser hegemônicas, pois, do ponto de vista étnico e cultural, o povo brasileiro em seu interior expressa grande unidade. Ao adotar uma postura sectária, o movimento vai na contramão da união nacional. Neste sentido, ele lembra que a forma como os Estados Unidos, por exemplo, tratam a questão racial é uma falácia, que acaba muitas vezes influenciando o debate da luta racial em nosso país. Para França, “não há ódio racial no Brasil, como há entre os norte-americanos. O cidadão comum não é racista e quando o preconceito aparece, é mais uma caixa de ressonância do preconceito da elite brasileira, que alimenta a discriminação”, disse. “O país tem, inclusive, condições de, ao conseguir mudar a realidade do negro brasileiro, influenciar outros países no combate aos conflitos étnicos. O Brasil pode dar boas lições neste campo”.
Avanços
Quando assumiu a Presidência da República, o presidente Lula revolucionou o poder no Brasil. Era a primeira vez que um homem, realmente vindo do povo, assumia o maior cargo da nação e de quebra, colocava em pauta questões como o racismo e os direitos da mulher. Foi assim que surgiu a Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, que, para França, foi um grande avanço. “A Seppir coloca a questão racial em um outro patamar. É um instrumento para se pensar o problema da discriminação e uma forma de se superar esse estágio”, disse.
Além disso, França salienta que igualmente importante foi a sansão presidencial à lei 10.639, que inclui no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática História e Cultura Afro-Brasileira. “Ao assinar essa lei, Lula pôs no centro do debate a tolerância e o respeito à diversidade como princípios que devem ser transmitidos às nossas crianças, bem como o conhecimento e a valorização da cultura e da história negra”. Ele explica ainda que “o presidente trabalha muito com a questão subjetiva do combate ao racismo. Um exemplo disso foi a nomeação, logo no início de sua gestão, do ministro Joaquim Benedito Barbosa Gomes, o primeiro negro a assumir o STF. Isso tem uma carga muito positiva, de reconhecimento do negro em nossa sociedade”.
Contra o retrocesso
As discussões realizadas em Pernambuco resultaram no Manifesto de Olinda que, entre outros pontos, fala sobre o retrocesso que representaria a eleição de Geraldo Alckmin à Presidência da República. Numa análise quase premonitória, Edson França falou sobre a falência do sistema de segurança durante o governo tucano e sobre a violência gerada pela exclusão social. “Em São Paulo, o Estado foi condicionado a simplesmente apertar o gatilho contra a população e a ser omisso com relação ao crime organizado que absorve parte da nossa juventude. Nossa infância, ao ser arregimentada para o tráfico, é igualmente vítima do crime. E para combater esse problema, Alckmin implantou uma política nefasta na Febem”, denunciou. E completou: “O crescimento e fortalecimento do PCC (Primeiro Comando da Capital) são pouco noticiados, de forma a esconder a ineficiência de Alckmin em enfrentar este problema. O ex-governador é blindado pela mídia contra essas constatações”.
Por Priscila Lobregatte