Jornalista Valdemar Menezes defende política externa de Lula

O presidente Lula teve uma posição corretíssima – em que pese o furor da direita – ao reconhecer a decisão soberana da Bolívia de nacionalizar seus recursos naturais. A medida açulou a reação do capital financeiro

por Valdemar Menezes*

O presidente Lula teve uma posição corretíssima – em que pese o furor da direita – ao reconhecer a decisão soberana da Bolívia de nacionalizar seus recursos naturais. A medida açulou a reação do capital financeiro e de seus porta-vozes, principalmente no Brasil, que queriam retaliações de tipo imperialista, rompendo a tradição diplomática brasileira de apostar sempre na negociação. O dever que tinha o Governo brasileiro de defender os interesses nacionais foi cumprido: arrancar da Bolívia o compromisso de que os suprimentos de gás para o Brasil não seriam cortados. Era aí que estava o cerne do interesse nacional. O segundo passo foi obter do Governo boliviano a promessa de que o preço do gás será negociado. Claro que vai subir, pois os bolivianos estavam perdendo com os preços atuais. A idéia é chegar a um número em que ambos os lados ganhem. Quanto à Petrobras em si, aí o problema se dá em dois níveis. Um é o dos interesses particulares de acionistas. Aí, se trata da negociação destes com o Governo boliviano. O outro é a Petrobras enquanto representante do Estado brasileiro. Aí é mais fácil, pois pode até se consorciar com a nova estatal boliviana. O que não pode é querer cantar de galo sozinha, como se tivesse de prestar contas apenas aos acionistas.

 

Sacralidade dos contratos

 

Os contratos, como alardeiam o grande capital e seus porta-vozes e testas-de-ferro, não são intocáveis, quando se trata dos interesses maiores da nação. Às vezes, foram arrancados de governos ilegítimos, fragilizados ou que estavam com a faca no pescoço. Na hora que um país retoma sua soberania, e tem um governo legítimo que responda às aspirações de seus cidadãos, este pode recolocar as coisas no lugar e enfrentar a chantagem. Essa idéia de ''intocabilidade" de contratos é coisa do consenso neoliberal, que quer pôr o mundo sob seus ditames e estabelecer um modelo econômico único que favoreça a seus interesses. A soberania de um país e os interesses coletivos estão acima de interesses de um punhado de investidores. Ademais, o capitalismo é risco – não é essa a cantilena quando se quer condenar um governo que defende a intervenção do Estado na economia?

 

Punição legal

 

Quanto à siderúrgica EBX, que violou as leis bolivianas – como bem esclarece o jornalista Luis Nassif em sua coluna na Folha de S. Paulo -, o Governo brasileiro não tem nada com isso. A empresa foi instalada ferindo as determinações constitucionais bolivianas, sobre meio ambiente e segurança nacional (por se localizar a menos de dez quilômetros da fronteira, quando a distância mínima é de 50 quilômetros). O pior são as ligações desta com os secessionistas de Santa Cruz de la Sierra, a província mais rica do país e que está nas mãos de setores oligárquicos e ligados às multinacionais de mineração, cuja elite não se identifica com a maioria índia do país. Preferem se identificar com Washington. O Brasil precisa vigiar a fronteira para não ser usada por sabotadores contra o governo legítimo da Bolívia.

 

Brincando de imperialismo

 

A arrogância de certos setores do empresariado paulista em relação à decisão soberana da Bolívia parecia emular com a prepotência da elite americana contra os países dominados. Por que não tiveram a mesma indignação quando a Embraer foi obrigada a cancelar uma encomenda de dezenas de aviões para a Venezuela, por imposição do Departamento de Estado Americano? E olhe que o Governo venezuelano comprou 36 navios petroleiros ao Brasil, o que vai gerar cerca de 40 mil empregos, aqui. A política externa brasileira está certa: apostar na integração sul-americana. Associar todas as empresas que cuidam dos recursos naturais para formarem um bloco só em favor dos interesses do subcontinente. Submissas, as elites econômicas de cada país repetem como papagaio a bula de excomunhão impetrada pelo capital financeiro internacional, acusando de ''atrasados" e ''populistas" os governos que se recusam a assumir o cabresto neoliberal.

*Jornalista

Fonte: Adital