Projeção de alta dos juros é injustificável, dizem economistas
Para Kliass e Oreiro, BC age em favor do capital financeiro em detrimento do povo
Publicado 25/09/2024 17:28 | Editado 25/09/2024 17:45
A ata da reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC), divulgada nesta terça-feira (24), diz que a última elevação da taxa Selic de 10,50% para 10,75% ao ano [aumento de 0,25%] foi o início de um ciclo “gradual” de altas.
Dado que o próprio BC projeta um aumento em novembro na taxa de juros de 0,5%, isso deixaria a Selic em 11,25% ao ano.
O Portal Vermelho ouviu os economistas Paulo Kliass e José Luís Oreiro que não veem justificativas para essa projeção e apontam os interesses do capital financeiro no aumento da taxa.
“Foi contra toda e qualquer argumentação do ponto de vista do cenário externo, porque o Fed [Federal Reserve, Banco Central norte-americano] reduziu os juros de lá, nosso diferencial poderia até baixar. Do ponto de vista interno, teve redução de preços na última pesquisa do IPCA [Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo], uma deflação. Os argumentos conservadores de risco de inflação não havia”, avalia Kliass.
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Ele diz que o Copom mente ao dizer que consultou o mercado. “O mercado seria o conjunto de empresários da área da indústria, serviço, comércio, agricultura, pecuária, pequenos, microempresários e agricultura familiar. Mas não, eles ouviram apenas, como sempre, 171 pessoas identificadas até o umbigo com os interesses do sistema financeiro”, critica.
O economista acusa que são os banqueiros que ditam como deve ficar a taxa Selic. Trata-se de uma política contra o desenvolvimento do país que depende de condições de financiamentos razoáveis com taxa Selic e spread bancários baixos [Diferença entre os juros cobrados dos tomadores de crédito e o quanto é pago aos depositantes] para quem quiser tomar créditos e financiar investimentos.
“Por outro lado, isso aliviaria as despesas. A Selic é o remunerador básico da dívida pública. O Brasil está acumulando, nos últimos 12 meses, R$ 870 bilhões de pagamento de despesas financeiras relativos a juros da dívida”, lembra.
Inflação sob controle
José Luís Oreiro, que é professor de Economia da UnB, avalia também que não há justificativa para essa projeção.
Ele cita a desaceleração do IPCA em agosto que foi de 0,19%. Ou seja, muito abaixo da expectativa do mercado que apostava em 0,33%.
“Com isso, a inflação acumulada em 12 meses, medida pelo IPCA 15 caiu. Isso, por si só, já mostra que a inflação não está descontrolada. Ela não está aumentando a tendência de queda e, portanto, não há nenhuma justificativa para o aumento que ocorreu de 0,25 pontos percentuais”, diz o economista.
Além disso, o professor assegura que isso vai impactar toda curva de juros do Brasil. “Vai aumentar os juros de longo prazo e vai ter queda na bolsa de valores. Portanto, vai aumentar o custo médio do ponderado capital”, considera.
Oreiro diz que essa política vai tornar mais caro o investimento produtivo e, com isso, reduzirá a taxa de crescimento que é compatível com a estabilidade de preços.
“Porque quanto menor for a taxa do investimento, menor é o crescimento da oferta e, portanto, menor é o crescimento compatível com uma inflação estável. Então, é tiro no pé um atrás do outro”, critica.
Para o professor, as consequências do aumento de 0,5% em novembro também são danosas.
“Em primeiro lugar, lembrando que cada 0,25 pontos percentuais de acréscimo da Selic representa um gasto adicional de R$ 13 bilhões em 12 meses. Então, 0,5 pontos percentuais de aumento na próxima reunião significa mais R$ 26 bilhões de gastos com juros da dívida. Somando 0,5% com 0,75%, nós vamos ter quase R$ 40 bilhões acumulados em 12 meses”, contabiliza.
Num tom irônico, Oreiro afirma que essa política é incompatível com o mercado que se diz preocupado com o ajuste fiscal.
“Os juros não são despesas? Os juros são despesas e essas medidas estão aumentando a despesa pública. E pior: estão tirando da grande maioria da sociedade brasileira para dar para 75 mil rentistas. É uma política de redistribuição de renda dos pobres para os ricos”, conclui.