Deflação e aumento do PIB atestam erros do mercado na avaliação da economia
“Previsões do mercado têm sido bastante errôneas e têm gerado uma interpretação muito equivocada sobre o que está acontecendo na economia brasileira”, diz economista da UFMG
Publicado 10/09/2024 19:49 | Editado 11/09/2024 15:47
O Brasil registrou, em agosto, a primeira deflação (queda de preços), de 0,02%, em 14 meses — uma redução de 0,40 ponto percentual em relação a julho. Na semana passada, foi anunciado o crescimento de 1,4% do PIB no segundo trimestre. Ambos os resultados, mensurados pelo IBGE, atestam o cenário positivo vivido pela economia brasileira, na contramão do que diz o setor financeiro.
A deflação foi verificada pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), divulgado nesta terça-feira (10) pelo IBGE. Com a retração do mês passado, a inflação ficou em 4,24% nos últimos 12 meses e em 2,85% neste ano. A principal influência para o resultado veio da redução de 2,77% no custo da energia elétrica residencial. Os segmentos de habitação e de alimentação e bebidas também contribuíram com quedas de, respectivamente, 0,51% e 0,44%.
“Estes dados são mais um exemplo de que as previsões do mercado têm sido bastante errôneas e têm gerado uma interpretação muito equivocada sobre o que está acontecendo na economia brasileira”, analisa o economista Diogo Santos, da Universidade Federal de Minas (UFMG).
Ele lembra que o mercado financeiro “errou muito quanto à perspectiva de crescimento no último trimestre — ninguém chegou nem perto de prever a taxa que a economia brasileira apresentou. E agora a inflação vem negativa. E eles também não previram isso. Todo mundo apostava no aumento, mesmo que leve, da inflação nesse período”.
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Conforme as expectativas do mercado, veiculadas antes do anúncio do PIB, o crescimento seria de apenas 0,9% — e no final foi de 1,4%. Além disso, a perspectiva era de inflação de 0,01% em agosto e não de deflação de 0,02%. Santos salienta que esses erros são importantes não apenas pela diferença dos índices em si, mas porque eles apontam para um movimento na direção contrária do que efetivamente ocorreu, atrapalhando a economia.
Além disso, avalia o economista, a deflação mostra que o crescimento mais forte da economia brasileira no último período não gerou uma inflação crescente como se propalava. “Pelo contrário, gerou uma inflação controlada com queda do nível geral de preços agora no mês de agosto. Ou seja, essa ideia de que se a economia crescer um pouco mais vai gerar uma forte inflação e vai prejudicar a economia, é uma leitura equivocada do funcionamento da economia, feita a partir de modelos liberais, ortodoxos, utilizados pelo mercado financeiro”.
Taxa de juros
Os dados recém-divulgados vieram pouco antes da próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central, marcada para os dias 17 e 18. A taxa de juros atual está em 10,5%, índice que foi mantido na mais recente reunião, ocorrida em 31 de agosto.
A Selic vinha caindo a passos lentos — mesmo com críticas recorrentes do governo, setores produtivos e especialistas — desde agosto do ano passado, quando era de 13,75%, sendo que o último corte ocorreu em maio deste ano e, desde então, ficou inalterada.
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Segundo veículos ligados ao mercado financeiro, a tendência agora seria de alta. Para Diogo Santos, “se o Banco Central entrar numa rota de elevação dos juros, mesmo que leve, ele vai prejudicar muito a economia porque vai sinalizar aos empresários e à sociedade que está vendo a inflação fugindo ao controle. E isso não é verdade. Se Banco Central fizer isso, ele vai estar jogando para atrapalhar a economia”.
Outro aspecto salientado pelo economista é que neste momento, em que a economia brasileira está progredindo, “é muito importante que o investimento cresça junto para ampliar a capacidade de produção”, de maneira que mais adiante, quando a maior parte da capacidade instalada da economia for utilizada, “ainda haja uma parte ociosa capaz de absorver o crescimento da demanda”. Para ele, se o Banco Central aumentar a taxa de juros agora, “vai sinalizar que ficará mais caro pegar empréstimo para as empresas investirem”, atrapalhando esse ciclo favorável ao país.
Além disso, ele destaca que o aumento da Selic agora seria negativo também considerando os graves efeitos da crise climática que o país está vivendo, como as secas e as queimadas. “Esses eventos adversos poderão aumentar os custos de produção e gerar a necessidade de mais mais crédito. E se o Banco Central aumenta a taxa de juros, ele encarece o crédito, encarecendo também os custos de produção”. Ele acrescenta que “o Banco Central dos Estados Unidos deve reduzir juros e, se isso acontecer, seria ainda mais prejudicial o BC brasileiro aumentar a Selic”.