Milei ameaça veto e embate com Congresso após reforma previdenciária
O Senado desafiou o presidente ao aprovar um aumento nas pensões para corresponder à taxa de inflação de três dígitos do país.
Publicado 23/08/2024 16:46
O presidente da Argentina, Javier Milei, deve vetar a reforma previdenciária aprovada pelo Senado nesta quinta (22), uma medida que provavelmente aprofundará o confronto entre o líder de extrema direito e o Congresso, majoritariamente controlado pela oposição. “Toda vez que os degenerados procuradores políticos quiserem romper o equilíbrio fiscal, vou vetar tudo, não dou a mínima”, disse o presidente sobre o projeto que tramitava no Congresso.
O Senado aprovou um aumento nos gastos com pensões, alinhando-os à inflação de três dígitos que assola o país. A votação, com um placar de 61 a 8, demonstrou a força da oposição, que busca desafiar o rígido programa de austeridade do presidente. Apenas um dos votos contrários veio de fora do partido de Milei, evidenciando a dificuldade do presidente em negociar com partidos centristas.
Milei, que assumiu a presidência em dezembro com a promessa de adotar medidas rigorosas de austeridade para combater a inflação galopante e a pobreza crescente, não hesitou em manifestar sua oposição ao projeto de lei. Em declaração publicada na plataforma X, o gabinete de Milei afirmou que a proposta tem como único objetivo “destruir o programa econômico do governo”, acrescentando que a medida exigiria um aumento de 1,2% no Produto Interno Bruto (PIB) para ser implementada.
“O presidente prometeu aos argentinos que manteria um superávit fiscal a todo custo, e ele o fará”, declarou o gabinete, reafirmando o compromisso de Milei com um “déficit zero” e com a rejeição de qualquer legislação que possa comprometer as finanças públicas.
A derrota no Senado reforçou a fragilidade política de Milei, que tem enfrentado uma dura batalha para implementar sua agenda no Congresso. Com menos de 15% de controle nas duas casas legislativas — apenas sete das 72 cadeiras no Senado pertencem ao seu partido — o presidente tem se apoiado amplamente em decretos executivos para avançar suas políticas, muitas vezes sem o apoio necessário do Legislativo.
Na semana passada, o Congresso anulou um decreto presidencial que teria multiplicado o orçamento de inteligência, sob o argumento de que esses recursos poderiam ser mais bem utilizados em necessidades sociais urgentes. A decisão veio como um revés significativo para Milei, que se vê cada vez mais limitado em sua capacidade de governar com o Legislativo contra ele.
Após seis meses de governo, Milei havia conseguido garantir sua primeira vitória legislativa em junho, quando seu projeto de reforma econômica foi aprovado por uma margem estreita no Senado, apesar dos confrontos entre manifestantes e a polícia. No entanto, a recente aprovação da reforma previdenciária, que prevê um aumento de mais de 8% nos benefícios de aposentadoria ainda neste ano, reacendeu preocupações entre investidores sobre a viabilidade de sua agenda radical.
Nos primeiros seis meses de mandato, Milei conseguiu atingir um superávit fiscal raro, cortando gastos públicos, interrompendo projetos de obras e reduzindo transferências de receita para as províncias. Entretanto, as políticas de austeridade também agravaram a recessão econômica, elevaram a pobreza para 55% e fizeram a inflação anual disparar para 260%.
Marcelo J Garcia, diretor para as Américas da Horizon Engage, uma consultoria de risco político sediada em Nova York, comentou que a reforma previdenciária é particularmente sensível, pois impacta diretamente o núcleo do programa fiscal de Milei. “O que mais preocupa os investidores é que essa onda negativa é resultado do lado linha-dura e mais confrontacional do círculo interno de Milei assumindo a liderança”, afirmou.
A possibilidade de veto por Milei à reforma previdenciária e a resposta do Congresso — que poderia derrubar o veto com uma maioria de dois terços — irão definir os próximos capítulos deste embate, com potencial para ampliar ainda mais as tensões políticas e econômicas na Argentina.
Para anular o veto, ambas as câmaras devem reunir uma maioria absoluta de dois terços dos votos dos membros presentes. Se for alcançado, o projeto é promulgado e o veto presidencial é derrubado, obrigando o Executivo a promulgar a lei. Os tribunais podem rever a constitucionalidade de um veto se for argumentado que este afecta direitos fundamentais ou viola tratados internacionais.