Impactos da aprovação da PEC 09 na luta por recursos eleitorais 

É inadmissível que, em um país 27% de mulheres negras, esse grupo represente apenas 2% do Congresso Nacional e menos de 1% na Câmara dos Deputados

Deputada federal Daiana Santos, PCdoB/RS. Foto: Arquivo

A tendência de que a PEC 09 fosse aprovada sem alterações no texto original nos levou a uma mobilização intensa para reverter alguns pontos críticos do projeto. O retrocesso representado pela proposta inicial era inaceitável, esvaziando o primeiro de muitos passos necessários para combater as múltiplas barreiras de acesso igualitário de pessoas negras a cargos políticos. Por isso, tentamos reduzir os danos para a população negra na política, preservando avanços essenciais para a promoção da igualdade racial.

O parecer do projeto incluía o estabelecimento de prazos para o repasse de recursos às candidaturas de mulheres e de pessoas pretas e pardas. Na prática, esse texto poderia conflitar com dois artigos da Constituição: o artigo 2º e o artigo 17, que obrigam o gasto de 30% dos recursos para pessoas negras e mulheres, respectivamente.

Leia também: PEC estabelece mínimo de 30% para financiamento de candidaturas negras

Em detalhes, a proposta exigia que o candidato negro e/ou mulher gastasse todo o valor no primeiro turno, pois, caso não avançasse para o segundo turno, já teria utilizado os recursos conforme a emenda constitucional. Isso poderia criar uma pressão desproporcional sobre esses candidatos, obrigando-os a planejar e gastar de maneira pouco estratégica.

Além disso, um dos artigos do projeto anistiava os partidos que não cumpriram a aplicação proporcional de recursos do fundo eleitoral para campanhas de pessoas negras, permitindo que escapassem impunes. Por isso, eu e meu colega de partido, o Deputado Orlando Silva propusemos que a cota só fosse considerada cumprida se o recurso não aplicado nas eleições passadas pudesse ser utilizado na eleição de 2026, além dos 30% já estabelecidos.

Em debates com os presidentes dos partidos políticos, foi solicitado que o valor não aplicado para as pessoas negras fosse utilizado nas quatro eleições seguintes, em adição aos mínimos estabelecidos nesta PEC, começando nas eleições de 2026.

É inadmissível que, em um país onde 27% da população é composta por mulheres negras, esse grupo represente apenas 2% do Congresso Nacional e menos de 1% na Câmara dos Deputados. O contrassenso legislativo é evidente e, embora seja difícil de explicar, torna-se claro quando consideramos o conhecido verbete popular do “ganha, mas não leva”.

O projeto também ignorava o contexto histórico de exclusão e marginalização enfrentado por negros e mulheres na política brasileira. A desigualdade racial e de gênero nas candidaturas políticas reflete a desigualdade estrutural presente em nossa sociedade. As políticas de cotas são instrumentos essenciais para corrigir essas distorções históricas e promover uma democracia mais representativa e inclusiva.

Além das questões mencionadas, é crucial destacar a importância da transparência e da fiscalização rigorosa no cumprimento das cotas. A implementação eficaz dessas políticas depende de mecanismos claros de monitoramento e de sanções para os partidos que não cumprirem as regras estabelecidas.

Contudo, a PEC 09/2023, ao propor alterações que poderiam enfraquecer as cotas raciais e de gênero, representava um retrocesso significativo nas conquistas de inclusão e igualdade política. Por isso, a movimentação política do PCdoB foi para reduzir distorções que prejudicam significativamente a população negra. A luta por uma representação mais justa e equitativa continua, e é nosso dever garantir que os avanços alcançados até agora não sejam desfeitos.