Ministro argentino culpa oposição por alta recorde do dólar e recorre ao FMI

Ministro da Economia tenta desviar a atenção sobre os fracassos do governo Milei, mas mercado é implacável em sua avaliação e evasão de divisas. FMI pode ignorar Milei novamente.

O ministro da Economía da Argentina, Luis Caputo.

Nesta terça-feira (11), o ministro da Economia, Luis Caputo, atribuiu à oposição a responsabilidade pela recente alta do dólar e negou que o país esteja enfrentando uma crise econômica, apesar das evidências de uma alta significativa nas cotações paralelas do dólar, que atingiram 1.300 dólares. O risco país subiu 246 pontos base (19,7%), atingindo o valor mais elevado dos últimos três meses, depois de as obrigações de dívida soberana terem acumulado quedas até 13%.

Durante um evento realizado no Hotel Hilton, Caputo expressou otimismo em relação à aprovação de um desembolso de US$ 800 milhões pelo Conselho de Administração do Fundo Monetário Internacional (FMI), prevista para esta quinta-feira (13). O ministro também anunciou a intenção de lançar um novo programa econômico em meio às tensões cambiais e incertezas sobre a Lei de Bases, que será discutida nesta quarta-feira no Senado.

O discurso de Caputo, que enfatiza uma “herança pesada” e a responsabilidade da oposição pelos problemas atuais, pode ser interpretado como uma estratégia para desviar a atenção das falhas governamentais. Comparações com crises passadas, como o Rodrigazo e a hiperinflação dos anos 80, servem para dramatizar a situação herdada, mas também para justificar a falta de progresso substancial em sua gestão.

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Ele aposta numa narrativa de “situação calamitosa” encontrada ao assumir o cargo, comparando o cenário a crises passadas, como a hiperinflação de Alfonsín e Menem e a crise de 2001. Ele elogiou Milei por conseguir um excedente fiscal desde o primeiro mês de governo, reduzindo um déficit de cinco pontos percentuais, apesar de ter feito isso dando calote nos servidores, aposentados e universidades. Caputo também defendeu a redução das alíquotas e prometeu medidas futuras para ajustar a economia.

“O que aconteceu no mercado é que a política vai tentar atrapalhar, mas não se deixe levar por isso. A macroeconomia é ordenada”, afirmou Caputo, referindo-se ao modo como o Congresso tem encaminhado sua proposta de Lei Omnibus, que reforma a economia. Ele destacou a solidez da economia nacional, mencionando superávits fiscais, comerciais e em conta corrente, somatória de calotes dados em diferentes setores da sociedade.

Tensões cambiais e volatilidade

Embora Caputo tenha minimizado as tensões cambiais, atribuindo a volatilidade ao cenário político, a realidade é mais complexa. A alta do dólar e o aumento do risco país refletem uma falta de confiança na capacidade do governo de estabilizar a economia. A dependência de desembolsos do FMI evidencia uma fragilidade estrutural que não pode ser ignorada. A promessa de um novo programa com o FMI, sem detalhes concretos, soa como mais uma tentativa de ganhar tempo e evitar pânico imediato.

Já no final de maio, o economista argentino Eduardo Crespo, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), sublinhou ao Portal Vermelho, que a crise cambial, com queda acelerada e forte da moeda nacional, agrava o quadro da gestão macroeconômica para o governo Milei. “Isso é um anuncio de que há a expectativa de que a situação está mais complicada do que já se sabia”.

Crespo destacou que o aumento nos valores dos dólares paralelos, como o dólar blue e o dólar MEP (Mercado Eletrônico de Pagos), é um indicador de uma expectativa de piora na situação econômica, que pode se tornar um obstáculo para Milei atingir seu objetivo de remover os controles cambiais.

A redução da taxa de juros pelo Banco Central, ocorrida em meados de maio, acabou marcando um antes e um depois no ânimo dos mercados. O corte foi mais acentuado do que o esperado, de 133% para 40%, decisão que acabou desmoronando as expectativas dos investidores, que perderam o incentivo para permanecer em pesos. Desde então, os dólares livres têm sido negociados em alta e os ativos financeiros ficaram vermelhos, uma tendência que se aprofundou nas últimas semanas após o aumento do ruído político no Congresso.

O ministro defendeu a redução das alíquotas para 40% nominais anuais, argumentando que essa medida é necessária para descomprimir o crédito. Ele enfatizou a necessidade de confiança no modelo econômico proposto e pediu apoio aos empresários presentes no evento. “Eles têm de se capacitar, se estiverem convencidos, a economia começará a recuperar rapidamente, devolveremos o excedente que temos em impostos mais baixos”, prometeu.

Caputo minimizou as preocupações com as tensões cambiais, assegurando que “isso não me assusta, não haverá crise”. Ele atribuiu a volatilidade ao cenário político, lamentando que “maio foi um mês espetacular antes desse ataque político”. Segundo o ministro, antes das recentes turbulências, o risco país estava em 1.200 pontos e o dólar cotava a US$ 1.100, com um superávit fiscal recorde e queda significativa da inflação.

Traições do FMI

As tentativas de Caputo de trazer calma aos mercados não são novas. Há meses que tenta fazer com que o FMI libere fundos, mas sem os resultados esperados: em abril exigiu US$ 15 bi para aliviar as contas externas e melhorar a perspetiva de saída do câmbio. A organização internacional felicitou-o pelos resultados do programa econômico e nada mais.

Caputo manifestou confiança na aprovação do desembolso de 800 milhões de dólares pelo FMI e indicou que um novo programa com a entidade já está em desenvolvimento desde agosto do ano passado. O Governo espera que este dinheiro os ajude a cumprir a promessa de “sair da armadilha cambial”. “A partir daí vamos começar a falar de um novo programa, já o temos desde agosto do ano passado, não vai ser novidade e vamos esperar com esse novo programa, provavelmente vai chegar dinheiro”, explicou.

Essa expectativa reflete uma dependência excessiva de financiamento externo para manter a economia à tona. Sem reformas estruturais e uma política econômica clara, a confiança no mercado continua baixa.

Medidas futuras e apoio empresarial

Caputo também abordou a questão das obras públicas, defendendo a transferência dessas responsabilidades para as províncias. No entanto, essa política tem sido criticada por paralisar projetos essenciais, exacerbando a crise no setor da construção, que registrou uma queda de 37,2% em abril. Gustavo Weiss, presidente da Câmara Argentina de Construção, alertou que a situação atual é “muito pior que a de 2001”, sublinhando a necessidade de um plano de desenvolvimento econômico, além do ajuste fiscal.

Caputo minimizou a importância da aprovação imediata da Lei de Bases, sugerindo que a economia acelerará com ou sem a lei. Ele previu uma vitória expressiva do presidente nas próximas eleições, com 60% a 70% dos votos. “A saída é dura, mas segura, não vamos nos deixar levar pelo fato de 30 não aprovarem no Senado”, acrescentou.

Enquanto Caputo defendia suas políticas, o clima de descontentamento social cresce. Protestos de sindicatos, movimentos sociais e partidos de oposição marcaram a discussão da Lei de Bases no Senado, neste dia, refletindo a resistência popular às medidas de ajuste propostas pelo governo. A crítica do governador de Buenos Aires, Axel Kicillof, e a mobilização de diversos setores reforçam a percepção de que as políticas atuais não têm amplo apoio popular.

A retórica de Caputo, marcada por otimismo e culpabilização da oposição, contrasta fortemente com a realidade econômica do país. A alta do dólar, a crise no setor de construção e a dependência de financiamentos externos são sinais claros de uma economia fragilizada. A confiança no governo está abalada, e as promessas de futuros desembolsos do FMI parecem insuficientes para resolver os problemas estruturais profundos. Sem um plano claro de desenvolvimento econômico e reformas substanciais, a Argentina permanece em um estado de incerteza e volatilidade.

O que acontece com a Lei de Bases esta semana no Senado, as liquidações de exportadores agrícolas, as negociações com o Fundo Monetário Internacional (FMI) e os pagamentos do vencimento da dívida podem definir o ânimo do mercado nas próximas semanas.

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