Senado aprova projeto de lei sobre planos de adaptação às mudanças climáticas
Bolsonaristas tentaram atrasar a votação, criticaram a proposta a partir de suas pautas negacionistas e atacaram o Ministério do Meio Ambiente. Flávio Bolsonaro (PL/RJ) foi o único voto contrário.
Publicado 16/05/2024 09:50 | Editado 16/05/2024 15:03
Enquanto o Rio Grande do Sul enfrenta uma tragédia decorrente das mudanças climáticas, o Senado Federal aprovou nesta quarta-feira (15) o Projeto de Lei (PL) 4.129/2021, que estabelece regras gerais para a formulação de planos de adaptação às mudanças climáticas. O projeto prevê a elaboração de um plano nacional de adaptação à mudança do clima em coordenação com estados e municípios, além de apontar diretrizes para esse processo.
Após um acordo negociado entre o governo e a oposição, o projeto foi aprovado pela manhã na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado e agora retorna à Câmara dos Deputados, pois foi aprovado na forma de um texto alternativo. A sessão na CCJ acabou se tornando um palanque da extrema-direita para atacar a política e os órgãos ambientais, tendo como alvo a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva. Anteriormente, a proposta passou pela Comissão de Meio Ambiente (CMA).
O projeto visa a criação de um plano nacional de adaptação à mudança do clima, a ser elaborado em articulação com as esferas da Federação e os setores socioeconômicos, garantindo a participação social dos mais vulneráveis aos efeitos adversos das mudanças climáticas e dos representantes do setor privado. O plano será embasado em evidências científicas, análises e previsões de cenários, considerando os relatórios do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC).
Oposição negacionista
Uma emenda apresentada pelo senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) foi aprovada na CCJ para garantir a participação efetiva do setor empresarial na formulação e implementação do plano nacional de adaptação. A alteração foi considerada boa por ambientalistas. Ele foi o único que foi contra o PL na votação final.
“O projeto não traz efeito prático nenhum. É uma elaboração de diretrizes, é uma preocupação de fortalecer ainda mais os órgãos ambientais”, disse Flávio Bolsonaro no plenário. De fato, a redação trata de diretrizes e critérios gerais, mas foi incluída na pauta prioritária da Câmara e do Senado por ter sido considerada a mais completa sobre o assunto em tramitação e adequada para iniciar a preparação à ameaça climática. Junto com isso, o Observatório do Clima (OC) e a Frente Parlamentar Ambientalista também encaminharam uma lista de propostas em tramitação que deveriam ser rejeitadas, o chamado “Pacote da Destruição”.
Alguns senadores alegaram que o PL 4.129 não traz medidas concretas e imediatas, mas não apresentaram nenhuma alternativa. O líder da oposição, Rogério Marinho (PL-RN), chegou a justificar que ele traria mais problemas do que soluções ao atribuir funções a órgãos e técnicos ambientais e prever a participação da sociedade civil na formulação e gestão dos processos de adaptação.
Após conseguir o adiamento da votação, e se posicionarem contra o projeto no colegiado pela manhã, os oposicionistas acabaram aceitando que o projeto fosse aprovado simbolicamente no plenário, com o único voto contrário bolsonarista. A votação ocorreu logo após os senadores chancelarem a suspensão por três anos das dívidas do governo gaúcho com a União, que também sofreu resistências.
Medidas da Estratégia
O projeto também estabelece que as ações de adaptação devem ser avaliadas, monitoradas e revisadas a cada quatro anos, e integradas à Política Nacional de Proteção e Defesa Civil e à Estratégia Nacional de Segurança de Infraestruturas Críticas.
Entre as diretrizes gerais do projeto estão o enfrentamento dos efeitos atuais e esperados das alterações climáticas, a criação de instrumentos econômicos, financeiros e socioambientais para a adaptação dos sistemas naturais, humanos, produtivos e de infraestrutura, e a integração entre as estratégias locais, regionais e nacionais de redução de danos e ajuste às mudanças. O PL prevê ainda que os planos de adaptação municipais e estaduais priorizem áreas, setores e populações mais vulneráveis, conforme critérios de “etnia, raça, gênero e condição de deficiência”.
A proposta também prevê o alinhamento das estratégias de adaptação ao Acordo de Paris e prioriza áreas como infraestrutura urbana, direito à cidade, infraestrutura nacional e setor agropecuário. No setor agropecuário, o projeto estimula a adaptação ao Plano ABC, que visa à economia de baixa emissão de carbono na agricultura.
Diante da atual crise climática e das recentes tragédias no Brasil, a aprovação desse projeto representa um passo importante na formulação de políticas e planos de adaptação que visam enfrentar os desafios das mudanças climáticas e proteger a população e o meio ambiente.
De autoria da deputada federal Tabata Amaral (PSB-SP), o relator do projeto na CCJ foi o senador Jaques Wagner (PT-BA), líder do Governo no Senado, que também foi o autor do texto final aprovado. O projeto foi aprovado inicialmente na Câmara, em 2022, e pela Comissão de Meio Ambiente do Senado no final de fevereiro, onde o relator foi o senador Alessandro Vieira (MDB-SE).
Pontos principais do PL 4.129:
Áreas e populações prioritárias. Os planos de adaptação nacional, municipais e estaduais deverão priorizar áreas e populações mais vulneráveis, conforme critérios de “etnia, raça, gênero e condição de deficiência”. Esses critérios deverão levar em conta a “identificação, quantificação e reporte contínuo das vulnerabilidades e ameaças climáticas”.
Apoio aos municípios. Priorização dos municípios mais vulneráveis e a possibilidade de criação de “consórcios intermunicipais”.
Participação social. Garantia de participação social na coordenação e gestão dos planos nas várias esferas de governo.
Financiamento. Possibilidade de acesso ao Fundo Nacional de Mudança Climática (FNMC) e à cooperação internacional para o financiamento da elaboração e das ações dos planos.
“Soluções baseadas na natureza”. Adoção de medidas como a restauração florestal e a criação de áreas protegidas urbanas, como parte das estratégias de adaptação, considerando os benefícios adicionais e sinergias com as ações de mitigação.