Tragédia reflete impactos da crise climática e descaso com prevenção
Estado enfrenta pior catástrofe natural de sua história. Situação reforça necessidade de investimentos na preparação das cidades para mitigar efeitos da crise
Publicado 02/05/2024 18:36 | Editado 08/05/2024 11:10
As fortes e constantes chuvas que caem sobre o Rio Grande do Sul, principalmente nos últimos três dias, resultaram no que vem sendo considerado o maior desastre climático do estado. Até o momento, 24 pessoas perderam a vida; 147 cidades registraram alagamentos ou deslizamentos e quase 68 mil pessoas foram afetadas. Mais de 14 mil estão fora de casa — 4,6 mil em abrigos e quase 10 mil estão desalojadas (vivendo na casa de familiares ou amigos).
As regiões mais atingidas são a Central, dos Vales, Serra e a Metropolitana de Porto Alegre. Há, ainda, mais de 150 pontos de bloqueios em estradas e pontes e municípios com problemas no abastecimento de alimentos, água, energia elétrica e telefonia.
Na tarde desta quinta-feira (2), o Governo do Estado confirmou o rompimento parcial da barragem 14 de Julho, no Rio das Antas, entre Bento Gonçalves e Catiaporã, na Serra. A Defesa Civil informou que trabalhava na remoção de famílias de áreas de risco.
Outro resultado das fortes chuvas foi o aumento do volume dos maiores rios do estado, entre eles o Guaíba, que margeia Porto Alegre. Segundo o Governo do Estado, o nível das águas pode ultrapassar os quatro metros nesta sexta-feira (3).
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Já de acordo com projeção feita pelo Instituto de Pesquisas Hidráulicas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), o patamar pode ir além dos cinco metros. A cota de inundação é de três metros, nível atingido hoje no início da tarde.
O recorde até o momento foi em 1941, quando a água subiu a 4,76 metros. Em setembro do ano passado, quando o estado também sofreu com grandes precipitações, o patamar foi de 3,30 metros. Para evitar transtornos no centro da capital gaúcha, as comportas do Cais Mauá foram fechadas.
Crise climática
Segundo explicou o meteorologista da Climatempo, Fábio Luengo, ao portal G1, o Sul do país tem condições que favorecem tempestades nessa época do ano, porém a crise climática agrava essa situação. “O oceano mais quente, como estamos vendo agora, faz com que seja gerada mais energia para a formação das chuvas. Com isso, elas chegam nesses níveis, que nunca vimos antes. A mudança no padrão do clima interfere na atmosfera e muda o ciclo dos fenômenos que aconteciam, deixando-os mais intensos”, destacou.
Nos últimos dois anos, a situação do Rio Grande do Sul tem piorado, o que demanda ações governamentais que preparem o estado e que mitiguem os efeitos de eventos climáticos como esses, reduzindo os danos à população, ao meio ambiente e à infra-estrutura.
Em setembro e novembro de 2023, o Estado também sofreu com fortes chuvas, que deixaram dezenas de vítimas e um rastro de destruição. No começo daquele ano, foram as secas que castigaram os gaúchos.
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Apesar da recorrência de graves eventos decorrentes da crise climática no Brasil, durante o governo de Jair Bolsonaro (PL), o problema foi ignorado, seja no que diz respeito às ações ambientais para combater o desmatamento, seja nos investimentos para preparar o país e evitar tragédias. O descaso com a questão pode ser medido pelo corte de 95% que o então presidente fez no orçamento deixado para 2023 para redução de desastres ambientais.
No caso do governo de Eduardo Leite (PSDB), o orçamento de 2023 da Defesa Civil, de R$ 2,6 milhões, foi cerca de 25% menor do que o de 2015, segundo dados da Bancada do PT. Além disso, conforme mostrou a Agência Pública, o estado chegou a encomendar um Plano de Prevenção de Desastres, finalizado em 2017, mas que nunca saiu do papel.
Ainda segundo a reportagem da Pública, para 2023, “a previsão orçamentária para o aparelhamento da Defesa Civil foi de apenas R$ 100 mil reais. Tinha sido de R$ 1 milhão em 2022. Já o valor previsto para Gestão de Projetos e Respostas a Desastres Naturais passou de R$ 6,4 milhões no orçamento de 2022 para R$ 5 milhões em 2023”.
Apoio e recursos federais
Com a chegada de Luiz Inácio Lula da Silva à presidência, a questão ambiental e a prevenção aos desastres ganharam novo enfoque. Entre outras medidas, o Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional anunciou, no final de abril, que deve entregar, até junho, o primeiro Plano Nacional de Proteção e Defesa Civil, que vai estabelecer orientações e estratégias de atuação da Defesa Civil em cinco frentes: prevenção, mitigação, preparação, resposta e recuperação.
Para a elaboração das estratégias, estão sendo realizados, segundo o governo, levantamentos e análises de dados, bem como diagnósticos situacionais e cenários prováveis de atuação em curto, médio e longo prazos.
Em visita a Santa Maria nesta quinta-feira, juntamente com uma comitiva de ministros, o presidente assegurou que não faltarão recursos e apoio do governo à população do RS. Ele salientou que, neste primeiro momento, a prioridade é salvar vidas e atender os atingidos; depois, os esforços devem se voltar para a reconstrução dos locais afetados, tendo em vista a necessidade de os governos se adaptarem ao novo normal, que será de crises recorrentes e clima severo.
“Não faltará ajuda do Governo Federal para cuidar da saúde. Não vai faltar dinheiro para a questão do transporte e não vai faltar dinheiro para alimentos. Tudo o que estiver no alcance do Governo Federal, seja através dos ministros, em parceria com a sociedade civil ou através dos nossos militares, vamos nos dedicar 24 horas para que a gente possa atender as necessidades básicas do povo que está isolado”, pontuou.