Ressurge na Argentina conflito entre mães e avós da Praça de Maio contra o Governo

Milei e sua vice, Villarruel, ambos com laços familiares com agentes da repressão, esvaziaram políticas de reparação e contestam dados sobre mortos e desaparecidos

Imagem de manifestação recente contra o governo Milei representando os lenços das avós

Quarenta anos após o fim da ditadura militar na Argentina (1976-1983), grupos históricos que lutam pela verdade e justiça voltam a enfrentar o governo do país. As Mães e Avós da Praça de Maio, símbolos da resistência contra as violações dos direitos humanos durante o regime militar, estão novamente no centro dos embates políticos, desta vez com o presidente Javier Milei e sua vice, Victoria Villarruel, ambos com laços familiares com agentes da repressão. Eles esvaziaram políticas de reparação e contestam dados sobre mortos e desaparecidos.

Filha e sobrinha de membros da repressão, Villarruel destacou-se por sua defesa da “história completa” do período. Sua incansável organização de visitas aos militares presos e a busca por uma compreensão enviesada dos eventos históricos demonstra o trauma que a Argentina enfrenta.

No dia 5 de março, Sabrina Bölke, ativista trans e membro do coletivo H.I.J.O.S, que busca identificar vítimas LGBTQIA+ da ditadura, foi alvo de um ataque brutal em seu apartamento em Buenos Aires. Os agressores deixaram uma mensagem associada à palavra de ordem do presidente Milei (Viva la libertad, Carajo), evidenciando a gravidade do contexto político no qual o ataque ocorreu.

O orçamento para investigações sobre o período foi drasticamente reduzido, afetando grupos como as Avós da Praça de Maio, que continuam a busca por 255 netos sequestrados pela repressão. Essas avós, incansáveis na busca por seus netos sequestrados, agora enfrentam dificuldades financeiras para continuar suas investigações.

Desde sua fundação em 1977, as Avós da Praça de Maio têm lutado incansavelmente para encontrar os netos sequestrados, entregues a famílias ligadas aos militares ou civis próximos aos agentes da repressão. O movimento já conseguiu recuperar 137 netos, mas continua sua busca por justiça e verdade.

Um dos casos mais comoventes é o de Guillermo Amarilla Molfino, cuja busca por sua identidade revelou uma história de dor e perda. Criado como filho biológico por um militar envolvido nos sequestros de seus pais, Guillermo só descobriu a verdade após anos de suspeitas e investigações. Sua história é um testemunho vivo das atrocidades cometidas durante a ditadura.

Entre os casos emblemáticos está o de Victoria Donda, neta de uma das fundadoras das Avós da Praça de Maio, cujo tio foi condenado por sequestro e apropriação de bebês. Victoria, hoje uma líder política, encontrou sua verdadeira identidade em 2004, após anos de busca e luta por justiça. Seu testemunho sobre o envolvimento de Donda Tigel nos crimes contra sua família é um lembrete vívido do horror que muitos argentinos ainda enfrentam.

No entanto, a luta das Mães e Avós da Praça de Maio enfrenta desafios crescentes sob o governo de Milei. Cortes de verbas, interferência em instituições e tentativas de deslegitimar o movimento colocam em risco os avanços conquistados ao longo das décadas.

Documentos do Exército, já em 1978, afirmam ser 22 mil os detidos e desaparecidos. As mães e avós defendem um número estimado de 30 mil. O número exato só os militares podem dizer. Às vítimas do terrorismo de Estado, restam questões que provavelmente jamais terão respostas.

Enquanto o governo tenta impor sua narrativa sobre o período da ditadura, as vítimas e suas famílias continuam a exigir verdade, justiça e memória. Em um país onde o passado ainda ressoa fortemente no presente, o conflito entre os defensores dos direitos humanos e o poder político evidencia a luta contínua da democracia Argentina.

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