UNE debate ações para barrar a violência contra a mulher
O debate faz parte da programação do 59º Congresso da entidade. Pesquisa Data Popular mostra que 27% dos homens não compreendem como violência abusar de uma garota se ela estiver alcoolizada
Publicado 14/07/2023 18:43 | Editado 17/07/2023 08:29
“Mulheres, por uma universidade segura, acolhedora e livre de assédio” foi um dos temas em debate na mesa do 59º Congresso da União Nacional dos Estudantes (UNE) que abordou principalmente a necessidade de implantar uma política de enfrentamento nas universidades para derrotar e organizar o processo contra a violência, para que as mulheres possam ocupar o espaço do saber em paz e sem violência.
A mesa de debates foi composta pela vereadora de Recife, presidenta da Comissão de Mulheres da Câmara Municipal, Cida Pedrosa (PCdoB); a jornalista, ex-diretora da UNE, coordenadora da Casa Mirabal que acolhe mulheres vítimas de violência, Claudiane Lopes; a ex-diretora de Direitos Humanos da UNE e secretária parlamentar na Câmara dos Deputados, Mariana Lacerda. Representando o Ministério das Mulheres, a chefe de gabinete da ministra Cida Gonçalves, doutora em Direito, Estado e Constituição (UnB) e mestre em Direitos Humanos e Cidadania, Isís Taboas completou a mesa.
Cida Pedrosa iniciou sua intervenção falando como o tema é necessário para se fazer o debate, já que “durante muitos anos a universidade nos foi negada. “Demoramos muito a entrar porque o patriarcado sempre quis construir a narrativa dos homens, porque nós na universidade significávamos que nós iriamos construir um discurso público a partir do nosso olhar”.
Lembrou que até pouco tempo, a presença das mulheres nas universidades era proibida e que as primeiras que conseguiram foram com muita luta e outras através da justiça, com liminares. “Este é ambiente que nos é inóspito desde o primórdio”.
Segundo a parlamentar, “os homens nos roubam intelectualmente o tempo inteiro e o assédio inclusive é a razão da nossa não permanência. A ciência não pode compactuar com as violências contra as mulheres. Existe um pacto de silêncio dentro das universidades. Quantas universidades tem acolhimento de denúncia?”, questionou.
Cida criticou a falta de dados atualizados sobre violência contra a mulher no ambiente universitário e citou o último estudo da Data Popular em parceira com a Avon de 2015.
De acordo com a pesquisa, 27% dos homens responderam que não compreendem como violência abusar de uma garota se ela estiver alcoolizada. 35% deles também não reconhecem violência a mulher ser coagida a participar de atividade degradante ou que é violência compartilhar fotos e vídeos de mulheres.
A mesma pesquisa realizada entre as mulheres apontou que 97% delas responderam que sofreram algum tipo de violência sexual, psicológica ou física praticadas por homens em ambiente universitário.
Para a parlamentar, a universidade deveria ser um lugar para obter conhecimento, lugar do saber, das construções de igualdade, que deveria ter uma maior compreensão dos direitos humanos e das mulheres. Mas que a realidade não é essa. “O machismo é estruturante, está lá sistêmico, faz parte das estruturas”, criticou.
Do Ministério de Mulheres, Isis Taboas disse que debater o universo feminino no congresso da UNE é importante porque reflete dois grandes momentos vividos no país para as mulheres: “esse é o primeiro congresso que conta com a participação do Ministério das Mulheres, isso porque, somente há seis meses ele foi criado”.
E segundo, contou ela, porque recentemente foi aprovado a lei que assegura igualdade salarial e remuneratória entre mulheres e homens. Proposição do Executivo, que foi aprovada em regime de urgência pelo Congresso Nacional em junho e sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva no último dia 3.
Para Isis, o congresso da UNE representa a festa da democracia. “É um espaço de discussão, de arte, de organização, de luta dos estudantes brasileiros”.
A representante da Marcha Mundial das Mulheres, Mariana Lacerda que é graduada em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Ceará contou sua experiência como voluntária em uma organização feminista.
Destacou que a violência contra as mulheres é a expressão das desigualdades próprias do modelo capitalista. “Neoliberal, colonizador, heteronormativo. A violência não surge do nada”, completou. “É sobre essa ótica que se constitui essas violências contra as mulheres. É um modelo de dominação, de poder”.
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A jornalista Claudiane Lopes, do Coletivo de Mulheres Olga Benário, fez um discurso emocionante sobre as violências e mortes sofridas por inúmeras mulheres em todos os espaços e citou alguns casos que ocorrem nas universidades brasileiras. Lembrou que no ano de 2021, a ONU estimou que mais de 80 mil mulheres foram assassinadas no mundo.
Ela saudou o fato de três mulheres estarem à frente da UNE. “Era poucas mulheres que estavam na direção das entidades. E eu fico muito feliz quando eu vejo a mesa diretora da UNE composta somente por mulheres”.
“Todas nós temos que lutar para que a universidade seja um espaço bom para as mulheres, porque 60% das vagas das universidades públicas são compostas por mulheres. Porém, a grande maioria das estudantes universitárias não está no ensino público, está no ensino privado. E na faculdade privada é pior porque o reitor da universidade privada não é bem “um reitor”. É o empresário do ramo da educação”, ponderou.
As palestrantes citaram ainda as dificuldades vividas pelas mulheres no período pandêmico, mas também pela onda de ódio e do fascismo do governo Bolsonaro. Segundo elas, foi um período de grande ampliação da violência contra as mulheres.
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O tema uníssono no debate foi sobre a participação das mulheres como ação fundamental na derrota do governo de extrema-direita representada por Jair Bolsonaro e que parte dessa derrota foi provocada pelas mulheres feministas que organizaram frontalmente nas ruas, nas redes, essa resistência.
Lembraram que antes mesmo da eleição de Bolsonaro, as mulheres se organizaram no grande movimento que foi o #EleNão. E para elas, o governo Lula tem dado grande contribuição para avançar nos direitos das mulheres. E agora com um ministério exclusivo para mulheres pode contribuir com muito mais.