Blinken encontra Xi Jinping, em meio a tensões
Secretário de Estado dos EUA teria ido a Pequim para tentar aliviar tensões entre os dois países. O clima das reuniões foi otimista e franco, com admissão das divergências
Publicado 19/06/2023 15:29 | Editado 20/06/2023 09:40
Em um encontro não programado, o secretário de Estado dos Estados Unidos, Antony Blinken, se reuniu nesta segunda-feira (19) com o presidente chinês, Xi Jinping.
Blinken, o primeiro titular do cargo a se encontrar com o líder chinês desde 2018, caminhou em direção a Xi com a mão estendida no Grande Salão do Povo, local que a China costuma usar para cumprimentar chefes de Estado – sinais positivos na coreografia da diplomacia .
Blinken disse em entrevista coletiva, que outras autoridades americanas devem visitar Pequim, a partir de agora. Embora o presidente Joe Biden tenha expressado desejo de encontrar Xi, para as próximas semanas, a expectativa passa a ser uma visita a Pequim da secretária do Tesouro, Janet Yellen, que vem se mostrando mais favorável aos interesses chineses. Da mesma maneira, espera-se a passagem da secretária de Comércio, Gina Raimondo.
Como mostrou a rede estatal CCTV, Xi falou a Blinken que “os dois lados fizeram progressos e chegaram a acordos sobre algumas questões específicas”, o que “é muito bom”. “Espero que por meio desta visita, senhor secretário, você faça mais contribuições positivas para estabilizar as relações China-EUA.”
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Xi vinha alertando nas últimas semanas para o que chamou de “cenários mais extremos”, chegando a dizer que não tem “ilusões” com os EUA, ao cobrar preparativos militares de fronteira.
Desacordos e cooperação
A viagem de Blinken tem como objetivo justamente aliviar as tensões que cresceram entre as duas principais potências econômicas mundiais nos últimos meses.
“Concordamos quanto à necessidade de estabilizar nossas relações”, sublinhou Blinken, sobre as reuniões com Wang e Qin, ao abrir a entrevista coletiva. “Vim para Pequim para fortalecer as comunicações de alto nível, para deixar claras nossas posições e intenções em áreas de desacordo e para explorar áreas em que podemos trabalhar juntos, e nós fizemos tudo isso. Eu aprecio a hospitalidade de nossos anfitriões.”
Apesar dos sinais de positividade, Blinken reconheceu que havia questões sobre as quais os dois países discordavam profunda e até veementemente. A China rejeitou uma proposta para estabelecer comunicação entre os militares chineses e americanos. “Quero enfatizar que nada disso se resolve com uma visita, uma viagem, uma conversa. É um processo”, disse Blinken.
O departamento de estado disse mais tarde que nas reuniões de Blinken ele havia levantado “práticas econômicas injustas e não comerciais” da China, violações dos direitos humanos em Xinjiang, Tibete e Hong Kong e “paz e estabilidade no Estreito de Taiwan”. Ainda assim, os dois lados concordaram que deveriam trabalhar juntos contra “desafios transnacionais”, incluindo mudanças climáticas e saúde pública, disse o comunicado.
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“Os dois lados discutiram uma série de questões de segurança global e regional, incluindo a guerra de agressão da Rússia contra a Ucrânia, as ações provocativas [da Coreia do Norte] e as preocupações dos EUA com as atividades de inteligência [chinesa] em Cuba”, disse Matthew Miller, porta-voz do Departamento de Estado.
Pragmatismo
“A viagem do senhor secretário de Estado a Pequim acontece em um momento crítico nas relações China-Estados Unidos. É necessário escolher entre o diálogo e o confronto, a cooperação ou o conflito”, afirmou o chanceler chinês, Wang Yi ao encontrar Blinken por sete horas meia no domingo (18), antes da reunião com Xi, de acordo com o canal estatal CCTV.
Ele culpou a “percepção errônea do lado dos EUA sobre a China, levando a políticas incorretas em relação à China” pelo atual “ponto baixo” nas relações.
O presidente Xi usou um tom ameno em discurso após uma reunião a portas fechadas. Disse que a China tem todo o interesse em melhorar e criar uma “relação estável” entre os dois países. Mas pediu uma “atitude racional e pragmática” de Washington em assuntos que envolvam Pequim.
Já Blinken disse que o presidente dos EUA, Joe Biden, acredita que os dois países “têm obrigação” de se dar bem, e que Washington está disposta a isso.
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As reuniões podem lançar o processo para um maior envolvimento diplomático entre os EUA e a China, preparando o terreno para uma reunião de Xi-Biden, por exemplo, na cúpula da Apec que acontecerá em São Francisco em novembro, disse Rudolf.
Ponto mais baixo
O secretário de Estado norte-americano foi ainda recebido no domingo (18) pelo ministro chinês das Relações Exteriores, Qin Gang, que na hierarquia do governo chinês está abaixo de Wang Yi.
A portas fechadas, Qin disse a Blinken que as relações entre Estados Unidos e China “estão no ponto mais baixo desde que as relações diplomáticas foram estabelecidas” em 1979, de acordo com a CCTV.
O encontro durou sete horas e meia, mais do que o tempo inicialmente previsto, e as duas partes concordaram em manter as linhas de comunicação abertas para evitar futuros conflitos.
As conversas de domingo foram “sinceras, substantivas e construtivas”, afirmou o porta-voz do Departamento de Estado, Matthew Miller.
“Isto não está de acordo com os interesses fundamentais dos dois povos, nem atende às expectativas comuns da comunidade internacional”, acrescentou Qin.
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Bill Gates
Xi Jinping se mostrou conciliador na semana passada ao receber Bill Gates, o bilionário americano do setor de tecnologia que se tornou um filantropo.
“Você é o primeiro amigo americano que encontro em Pequim este ano. Nós sempre depositamos nossas esperanças no povo americano e esperamos que a amizade continue entre os povos dos dois países”, disse Xi Jinping na ocasião, segundo a imprensa estatal chinesa.
Desde que a China se tornou a segunda maior potência econômica, os Estados Unidos tentam contê-la. No entanto, nos últimos meses, diversos episódios acirraram o mau humor dos governos:
Em fevereiro, os Estados Unidos afirmaram que um balão de espionagem sobrevoava os céus da costa oeste do país, mas Pequim disse que o equipamento tem fins de pesquisa meteorológica e se perdeu com os ventos.
Os EUA têm usado para provocações o território de Taiwan, ilha que Pequim considera parte de seu país. No ano passado, a deputada Nancy Pelosi fez uma visita a Taipei. As semanas seguintes foram marcadas por manobras militares de Pequim ao redor da ilha, além de mal-estar diplomático.
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Biden vem incentivando a indústria doméstica de chips, baterias e carros elétricos para fazer frente à produção da China e já deu incentivos de US$ 52 bilhões (cerca de R$ 262 bilhões) ao setor para barrar a importação chinesa. Também tem feito alianças com países para impedir a entrada de empresas de tecnologia chinesa, como o 5G e a Hwauei, mesmo que os EUA não ofereçam o mesmo produto, além de promover ataques jurídicos locais a estas empresas.
As Forças Armadas dos dois países têm protagonizado incidentes militares no Mar da China, em um trecho que Pequim reivindica como seu, mas outros países afirmam serem águas internacionais.