Aprovação do Mais Médicos na Câmara “consolida política de estado”

Aprovação com pouca oposição revela amplitude política da proposta, ao garantir fixação de profissionais em territórios vulneráveis.

O secretário de Atenção Primária do Ministério da Saúde, Nésio Fernandes, está comemorando a aprovação pela Câmara dos Deputados da Medida Provisório do Programa Mais Médicos, nesta quarta-feira (14). Em declaração ao Portal Vermelho, ele disse que o acordo com todos os campos políticos, garantindo 353 votos contra 58, faz com que o programa se torno “uma matéria que se consolida como uma política de Estado”.

“[A aprovação] é resultado de um exercício político maduro do governo com o parlamento. O Relatório da senadora Zenaide Maia (PSD-RN) aperfeiçoou o texto vindo do Executivo, incorporando 90 emendas”, avaliou ele.

A Medida Provisória 1.165, de 2023, foi aprovada na forma do projeto de lei de conversão, da senadora Zenaide Maia (PSD-RN), que fez algumas adequações ao texto original do governo. Entre elas, em vez da dispensa definitiva de revalidação do diploma para o médico intercambista, ele poderá participar do programa por quatro anos sem a necessidade dessa revalidação. A MP previa o período de três anos.

O texto aprovado prevê a prorrogação de contratos de 3 para 4 anos e cria indenizações para incentivar a ida de médicos para áreas de difícil fixação. Além disso, a MP do Mais Médicos prioriza médicos brasileiros e a contratação direta dos profissionais.

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Amplitude política

Ronald Ferreira dos Santos, coordenador do movimento nacional “Saúde pela Democracia + SUS é + Brasil” e diretor da Fenafar (Federação de Farmacêuticos) também considera um “avanço gigante” a aprovação do Mais Médicos. “A aprovação na Câmara demonstra a tremenda amplitude política que esse movimento gera”, ponderou o sindicalista, em entrevista ao Vermelho.

Além da ampliação de vagas, ele destacou a formação de cursos com especialistas em Saúde da Família, as proteções do trabalho destes profissionais, a garantia de cobertura de áreas vulneráveis, assim como mecanismos para fixação dos médicos nos territórios.

“É um avanço gigante que recoloca a lógica de provimento de profissionais médicos a populações em territórios que foram abandonados do ponto de vista da assistência. Fortalece a mudança da lógico do modelo de atenção primária, especialmente a questão da estratégia da Saúde da Família”, avaliou Ronald. 

Ele explica que a atenção primária é ordenadora dos cuidados, quem vai dar a primeira atenção, que, em muitas localidades, estava sem profissional médico na equipe de saúde da família. “Isso deixa o atendimento capenga e com muita dificuldade de obter resultados. Com o Mais Médicos ocorre uma mudança substancial de qualidade operada pelo Ministério da Saúde”, disse.

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Resistência fascista

Ronald, no entanto, admite que a resistência de setores reacionários e conservadores já está mobilizada contra o Mais Médicos, como já esteve na primeira edição do programa de 2013. “Vai ocorrer resistência de setores da categoria dos médicos, inclusive com sabotagens. Uma parcela barulhenta da categoria médica viu seu poder na sociedade ameaçado”, disse ele.

No Brasil, a categoria médica tem um poder excepcional de influência motivada pelo elitismo da formação e da reserva de mercado garantida por leis corporativistas. Com a ampliação de outros atores operando nessa atividade, Ronald considera que se consolidaram atitudes fascistas e preconceituosas, que têm grande poder político. 

“O combate ao programa inclusive já está circulando fortemente em forma de desinformação e fake news nas redes sociais. São os mesmos que prescreveram cloroquina e sustentam uma autoridade deslocada da sociedade, se aproveitando do reconhecimento que a sociedade tem desse profissional e dessa corporação”, relatou o sindicalista. “O poder de cuidar da vida das pessoas é muito grande e pode ser usado até para florescer posições fascistas”.

Desta vez, o governo evitou o foco na atratividade de médicos cubanos, que foram uma solução bem sucedida na primeira versão do programa, mas que gerou reações violentas de setores da extrema-direita. Ronald explica que a nova versão tenta “contornar uma correlação de forças desfavorável e construir mecanismos que atendam a demanda de atrair médicos”. 

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Novo Mais Médicos

Confira abaixo as principais mudanças do Programa Mais Médicos:

O orçamento estimado pelo governo federal para o programa é de R$ 712,5 milhões em 2023 e de cerca de R$ 3 bilhões para os próximos anos, conforme o texto da Medida Provisória.

A MP prevê o pagamento de uma indenização para médicos que se fixarem por períodos iguais ou superiores a 36 meses em áreas vulneráveis ou de difícil acesso, listadas pelo Ministério da Saúde.

Além disso, médicos que tenham cursado graduação em medicina, financiados pelo Fundo de Financiamento Estudantil (Fies), também serão contemplados com recompensas, caso permaneçam no programa por 48 meses.

A MP ainda permite que períodos de licença-maternidade, licença-paternidade e afastamento por até seis meses devido violência doméstica, conforme decisão judicial, sejam contabilizados como efetivo exercício.

Pelo texto, os médicos brasileiros e estrangeiros formados no exterior poderão participar do programa Mais Médicos por quatro anos sem precisar revalidar seus diplomas, desde que tenham registro para atuar no país de formação. Após esse período, os intercambistas só poderão ser recontratados se fizerem o Revalida. Antes da MP, o prazo era de três anos.

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O texto aprovado também aumentou a periodicidade do exame do Revalida, necessário para que médicos formados no exterior obtenham o registro para exercer medicina no Brasil. O exame era realizado uma vez por semestre e agora será aplicado a cada quatro meses. O Revalida é uma das etapas para obtenção do registro para o exercício da medicina no Brasil.

A MP determina que as mudanças na lei original de criação do Mais Médicos (Lei 12.871/13) tenham validade também para os médicos selecionados em editais publicados em 2022 e com termos de adesão efetivados em 2023, além daqueles que ingressarem no programa em 2023 em decorrência de decisões judiciais.

O texto prevê, ainda, que os médicos intercambistas que revalidarem seus diplomas no Brasil possam contar o tempo de atuação no Mais Médicos como prova de título de especialista em Medicina de Família e Comunidade. Esse tempo também vai valer para atender requisitos de processos seletivos, como provas de concurso público e exames de título de especialista que exijam comprovação de experiência em serviços da atenção primária à saúde.

O texto aprovado prevê a concessão de horário especial sem compensação de carga ao médico participante com deficiência ou que tenha cônjuge, filho ou dependente com deficiência, comprovadas por junta médica oficial.

O novo texto também incluiu a possibilidade de uso de recursos de telessaúde no âmbito do programa Mais Médicos.

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