Movimento Negro protesta contra racismo sofrido por Vini Jr na Espanha
Entidades fazem manifestação em frente ao consulado da Espanha
Publicado 24/05/2023 16:40 | Editado 26/05/2023 14:44
Com sinalizadores vermelhos nas mãos e gritos de “fogo nos racistas”, manifestantes do movimento negro fizeram, no início da noite de desta terça-feira (23), um ato em frente ao Consulado Geral da Espanha em São Paulo, na zona Oeste da capital paulista. O protesto foi motivado pelo reiterado racismo sofrido, na Espanha, pelo jogador de futebol brasileiro Vinícius Júnior.
Estavam presentes representantes da União de Negras e Negros pela Igualdade (Unegro), do Movimento Negro Unificado (MNU), do Movimento Raiz da Liberdade, da Uneafro Brasil, da Coalizão Negra por Direitos, parlamentares, e pelos partidos PCdoB, PT, PSOL, PSB, Rede e Partido Verde.
“O que ele viveu é agressão de um estado racista e de uma extrema direita espanhola que oprime os negros, imigrantes, LGBTQIA+, e mulheres. Não foi um caso isolado, não foi apenas um torcedor. Já o xingaram de macaco, desejaram sua morte, encenaram o seu enforcamento. É violência racial”, diz texto elaborado conjuntamente por entidades do movimento negro participantes e lido em forma de jogral no ato.
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O atleta atua no Real Madrid, time que disputa o Campeonato Espanhol, organizado pela La Liga. No último domingo, Vinicius Júnior foi vítima de mais uma ação racista em um estádio espanhol. Durante a derrota do seu time para o Valencia por 1 a 0, no Estádio Mestalla, casa dos adversários, Vini Jr. escutou insultos racistas e gritos de “macaco” vindos das arquibancadas. O episódio em Valência foi o décimo episódio de violência racial e ódio contra o jogador de 22 anos, desde 2021.
“O Estado espanhol nos deve reparação, as empresas Santander, Microsoft, Puma, Panini, e todos os que patrocinam La Liga nos devem reparação. A La Liga nos deve reparação. Vocês racistas precisam entender: Não passarão”, acrescenta o documento.
“Estamos aqui novamente em manifestação contra mais um ato racista que sempre acontece com nosso povo preto, com nosso povo periférico e, dessa vez, aconteceu do outro lado do mundo. Lá na Espanha. Não vamos mais aceitar isso, não temos mais espaço para o racismo, para intolerância religiosa, para homofobia, para qualquer tipo de preconceito, não temos mais espaço para essas pessoas”, ressaltou o presidente do Unegro, André Alexandre.
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“O estado espanhol tem traços de uma extrema direita neofascista, que é contra a política de imigrantes. O que a La Liga expressa é o que a população negra vive naquele país. O Vini é muito corajoso de denunciar a violência racial e de ajudar a quebrar um silêncio. O Vini é muito odiado pelos racistas porque ele reage a essa violência”, destacou Simone Nascimento, do Movimento Negro Unificado.
“Pra quem ficou surpreso com a resposta do Javier Tebas, presidente da La Liga, que [culpou] Vini Jr. por ter sofrido racismo, é importante saber que essa não é a primeira vez que ele faz declarações absurdas como essa. Tebas é reconhecido por apoiar abertamente o Vox, partido de extrema-direita espanhol, que já se posicionou a favor da expulsão de imigrantes da Espanha e a revogação de leis em favor da comunidade LGBTIA+ e leis contra a violência machista”, publicou a Uneafro nas redes sociais explicando a razão do protesto desta terça-feira.
Os manifestantes estenderam faixas nos portões do consulado e projetaram, na fachada do prédio, frases como “La Liga Racista” e “Chega de Racismo”.
O ativista Douglas Belchior, da Coalizão Negra por Direitos, pede que outros atos sejam feitos nos consulados espanhois em outros estados do país. “Não precisa ser de massa. É simbólico para que o mundo todo veja que não toleramos o racismo contra negros e negras brasileiras em qualquer lugar do mundo!”, defende.
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A vereadora de São Paulo Elaine Mineiro (PSol), ou Elaine do Quilombo Periférico, defendeu que, além dos torcedores acusados, o Estado espanhol responda também pelo racismo praticado contra o jogador.
“É importante a gente estar aqui chamando o Estado espanhol à responsabilidade, porque os Estados, as nações pelo mundo inteiro, se acostumaram a dar desculpas para não responsabilizar os racistas”, disse. “A gente vai fazer com que o Estado espanhol tenha sim que se responsabilizar”, acrescentou.
Nesta terça-feira, a Real Federação Espanhola de Futebol (REEF) anunciou a punição ao Valência por conta do caso de racismo do últimos domingo. De acordo com o comunicado, a entidade determinou o fechamento de um dos setores do Estádio Mestalla, local dos ataques racistas, por cinco partidas.
Nem o Consulado Geral da Espanha em São Paulo, ou as as empresas Puma, Santander, Microsoft e Panini, que patrocinam La Liga se manifestaram sobre o assunto.
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Apoio institucional
Recentemente, o brasileiro depôs na Justiça espanhola no âmbito do caso em que foi xingado de “macaco” por um torcedor do Mallorca em fevereiro deste ano. “Não foi a primeira vez nem a segunda nem a terceira. O racismo é o normal na LaLiga. A competição acha normal, a federação também e os adversários incentivam. Lamento muito. O campeonato que já foi de Ronaldinho, Ronaldo, Cristiano e Messi hoje é dos racistas”, afirmou o atleta em seu perfil no Twitter.
O brasileiro ainda alertou para a imagem que a Espanha passa para o exterior ao permitir que tais ataques aconteçam na maior competição esportiva da nação. “Uma nação linda, que me acolheu e que amo, mas que aceitou exportar a imagem para o mundo de um país racista. Lamento pelos espanhóis que não concordam, mas hoje, no Brasil, a Espanha é conhecida como um país de racistas.”
Após reagir nas redes sociais, o jogador reagiu recebeu apoios de seu técnico, Carlo Ancelotti, de diversos jogadores e clubes pelo mundo e do prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes (PSD).
O governo brasileiro também se manifestou de forma generalizada. A ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, confirmou nesta segunda que o governo brasileiro está em contato com autoridades espanholas para cobrar providências sobre a situação. Em nota conjunta publicada pelos ministérios do Esporte, da Igualdade Racial, das Relações Exteriores, da Justiça e Segurança Pública e dos Direitos Humanos e Cidadania, o governo repudiou formalmente os ataques sofridos pelo jogador, e reforçou a atuação em cooperação com o governo espanhol para coibir as agressões.
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A manifestação formal deu seguimento à fala do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), após participar da reunião do G7 no Japão. Ele pediu que as entidades responsáveis pelo futebol tomem medidas efetivas. “Eu penso que é importante que a Fifa, a Liga espanhola, as ligas de outros países tomem sérias providências. Não podemos permitir que o fascismo e o racismo tomem conta dentro dos estádios de futebol”, destacou.