Marina Silva assumirá novamente o Ministério do Meio Ambiente

Marina agrega ao governo Lula enorme prestígio internacional como ambientalista.

Marina Silva durante anúncio de sua nova gestão no Ministério do Meio Ambiente por Lula (Foto: Reprodução)

Marina Silva, deputada federal eleita pela Rede Sustentabilidade, foi convidada pelo presidente e aceitou assumir o Ministério do Meio Ambiente. Desde que se incorporou a campanha eleitoral de Lula, Marina sempre foi um nome natural por ser uma ativista histórica na área e por já ter chefiado o ministério durante todo o primeiro e parte do segundo mandato do atual presidente eleito, entre 2003 e 2008.

O convite foi feito na sexta-feira (23), logo após ficar decidido que a Autoridade Climática, órgão a ser criado por sugestão da própria Marina Silva, será subordinada ao ministério e não à Presidência da República. A ambientalista já atua internamente para organizar a estrutura da pasta. Na manhã desta terça-feira, ela tem reuniões no gabinete de transição de governo.

Amadurecimento

A indicação foi bem recebida pelos pares da deputada federal eleita, especialmente por nomes ligados à comunidade indígena e ecologistas. Diante da indefinição do cargo, várias organizações não-governamentais e ambientalistas assinaram a Carta de Apoio ao nome da ex-senadora para o Ministério. A carta contou com a adesão de pessoas ligadas ao Ibama, MMA, Ongs e indígenas de diversas estados. 

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O professor de Meteorologia e Climatologia na UFAM e Diretor do Centro Ciências do Ambiente (CCA), Eron Bezerra, destacou ao Portal Vermelho a enorme capacidade de interlocução de Marina com o terceiro setor (ONGs), que atua na frente ambiental, assim como com os fóruns internacionais que polemizam a questão ambiental. “Isso lhe assegura, por certo, trânsito e mobilidade nesse setor”, aposta ele.

O especialista, no entanto, faz uma ressalva em relação a questão da sustentabilidade observada em suas primeiras gestões do Ministério. Para ele, ela tem um passivo com o setor rural produtivo, em decorrência da política de comando e controle (multa e repressão), que caracterizou o modus operandi dos órgãos de gestão ambiental na sua passagem anterior pelo ministério. Esta, inclusive, foi a razão de seus conflitos com o governo passado e motivação para deixar o Ministério.

“Espero que agora, mais experiente, procure o necessário equilíbrio na busca do desenvolvimento efetivamente sustentável, o que implica compreender que não há desenvolvimento sem sustentabilidade e nem sustentabilidade sem desenvolvimento”, diz ele, que é contra a visão santuarista que ignora as condições de vida humana na floresta. Quatorze anos depois, muita água rolou em cúpulas internacionais de meio ambiente, e Marina volta com nova bagagem.

Dito de forma mais direta, ele considera que é preciso preservar os recursos naturais e, ao mesmo tempo, garantir a elevação do padrão de renda para a sociedade, especialmente aos agricultores de base familiar, pescadores, extrativistas e demais camadas populares.

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Primeira indígena eleita deputada federal por Minas Gerais, Célia Xakriabá celebrou o nome de Marina para ministra. Segundo a parlamentar, o convite é “indicativo de que voltaremos a cuidar dos nossos biomas”. Ex-ministro do Meio Ambiente de Lula, Carlos Minc, também defendeu a indicação de Marina Silva. 

Desafios

Marina reencontra-se com Lula no cenário de aceleração das mudanças climáticas, que mobiliza todo o mundo em direção a medidas preservacionistas, mais afeitas a sua mentalidade ambiental. Lula tem repetido sua prioridade na governança por redução das emissões de gases estufa e redução do desmatamento. Além disso, a questão da preservação ganha conotação de sustentabilidade, conforme o Brasil explore a economia de créditos de carbono. Tudo isso faz seu regresso ao Palácio ganhar nova dimensão, além de não ser mais do partido do presidente, representando a amplitude do governo.

Outro desafio de Marina é reverter a terra arrasada que Bolsonaro deixou no meio ambiente, alterando a percepção do mundo sobre o Brasil. Ela precisará reorganizar o sistema de proteção e controle ambiental desmontado pelo bolsonarista Ricardo Salles.

A política de Bolsonaro levou os ministros do atual governo a favorecer os interesses do agronegócio mais predatório, facilitando o desmatamento ilegal e o uso de defensivos venenosos. Marina terá a tarefa de enfrentar o garimpo ilegal, a negociação clandestina de madeira e a violência em territórios indígenas. Mas espera-se também que o MMA enfrente as questões ambientais urbanas, como o problema da destinação de resíduos sólidos e da logística reversa, a universalização do saneamento e a geração de energias limpas.

Trajetória

Maria Osmarina da Silva Vaz de Lima, 64 anos, nascida em Rio Branco (AC), é historiadora, psicopedagoga, ambientalista e fundadora da Rede Sustentabilidade (REDE). Ao longo de sua carreira política, exerceu os cargos de senadora entre 1995 e 2011, e de ministra do Meio Ambiente entre 2003 e 2008. Também foi adversária de Lula, Dilma Rousseff e Fernando Haddad nas campanhas presidenciais de 2010, 2014 e 2018. 

Ela começou sua carreira política no PT, e ajudou a liderar o movimento sindical de seringueiros, elegendo-se para o seu primeiro cargo público, o de vereadora de Rio Branco, em 1988. Nessa época, ela atuava com Chico Mendes, que foi assassinado por sua luta ambiental. Em 2009, deixou o PT e filiou-se ao Partido Verde (PV), tendo passado também pelo PSB, antes de criar a Rede.

Marina passou os anos 1960 de sua infância em situação de muita pobreza entre o Acre, o Amazonas e o Pará. Viu sua mãe e irmãs morrerem na pobreza, assim como também contraiu hepatite e malária nas condições precárias de trabalho nos seringais. Marina sofreu até com a contaminação por mercúrio. Somente aos 16 anos se alfabetizou, chegando a graduação em História pela UFAC e especializando-se em psicanálise, posteriormente.

Quando tinha 42 anos de idade, Marina converteu-se à Igreja Evangélica, alegando o conforto espiritual durante suas recuperações das doenças graves que contraiu. Enquanto no passado pensou em ser freira e pregava a Teologia da Libertação, passou a circular pelo Congresso Nacional com a Bíblia a tiracolo. Tornou-se, nesta campanha eleitoral, também uma das interlocutoras de Lula com o segmento evangélico.

Como parlamentar, destaca-se seu projeto propondo a criação do Fundo de Participação dos Estados e do Distrito Federal – FPE – para as unidades da Federação que abrigarem em seus territórios unidades de conservação da natureza e terras indígenas demarcadas. Marina também é considerada a primeira voz a defender, no Senado, a importância do Governo Federal assumir uma postura em relação a redução das emissões de gases de efeito estufa.

Em sua gestão ministerial, Marina enfrentou conflitos constantes com outros ministros do governo quando insistia na visão preservacionista em detrimento do desenvolvimento econômico local. Uma das notáveis divergências envolvendo a ministra ocorreu em 2008, quando se desentendeu sobre a coordenação do Plano Amazônia Sustentável (PAS) ter sido destinado à Secretaria Especial de Assuntos Estratégicos, vinculada diretamente à Presidência da República. 

Em dezembro de 2006, enfraquecida por uma disputa com a Casa Civil, de Dilma Rousseff, que sugeria haver atraso nas licenças ambientais para a realização de obras de infraestrutura, a ministra resolveu deixar o governo em 13 de maio de 2008.

Durante sua administração no Ministério do Meio Ambiente, Marina Silva perdeu a disputa contra os transgênicos, contra a usina nuclear de Angra 3, e também não conseguiu que a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CNTBio) tivesse um caráter ambientalista, que era uma de suas metas formais.

Por outro lado, medidas adotadas pelo governo Lula nos últimos anos foram de sua autoria ou contaram com sua participação e articulação política, como a proteção maciça a todas as espécies de peixes do rio Madeira, a redução em oito vezes do tamanho do lago do rio Madeira e a redução da vazão de água na transposição do rio São Francisco.