“Passar a boiada”: Congresso aprova projeto que dificulta fiscalização do agronegócio
Aprovado no Senado, texto sobre autofiscalização agropecuária vai à sanção presidencial; produtores poderão criar sistemas próprios de fiscalização, o que traz preocupações sanitárias para o consumo e sobre o bem-estar animal.
Publicado 21/12/2022 16:57 | Editado 21/12/2022 16:58
O plenário do Senado aprovou na terça-feira (20) um projeto de lei que permite a autofiscalização dos produtores agropecuários. Criticado por parcela de produtores rurais e por ambientalistas, o chamado de PL do Autocontrole (1.293/2021) atende a uma demanda da bancada ruralista por flexibilização de regras que coloca de lado a atuação de fiscais do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa).
Com o projeto – que passou pela Câmara dos Deputados e agora vai para sanção presidencial – a fiscalização e controle da produção passa a ser feita pelo próprio “agronegócio”, que pode terceirizar a atividade fiscalizadora. Em outras palavras, a fiscalização e a responsabilização desses produtores ficam dificultadas.
O risco apontado por congressistas, produtores responsáveis e ambientalistas é de que o Brasil possa até mesmo perder a liderança mundial em diversos segmentos de exportação agropecuária ao não ter regras claras sobre fiscalização. Da mesma forma que a União Europeia barra produtos brasileiros originários de áreas de desmatamento, o mesmo pode acontecer sem uma certificação com procedência sobre o controle dos produtos.
Atualmente, quem faz a fiscalização sobre normas sanitárias, defesa agropecuária, saúde e bem-estar dos animais, utilização de agrotóxicos, entre outros aspectos, são os Auditores Fiscais Federais Agropecuários (AFFAs), servidores de carreira do Mapa.
Com a Lei em vigor, esta demanda será repassada para os próprios produtores que ficarão responsáveis pelo sistema de controle, podendo terceirizar etapas desse processo.
Hoje, a atuação dos fiscais do Ministério acontece principalmente em frigoríficos para atender aos procedimentos sanitários e de bem-estar animal, do confinamento ao abate. Os fiscais também são os responsáveis por advertências e multas, mas com a aplicação das novas regras cria-se a dúvida sobre como serão autuadas as agroindústrias que não sigam as normas, sendo que a fiscalização será feita internamente.
O PL do Autocontrole ainda traz a preocupação sobre a segurança do alimento comercializado e quanto à qualidade. Outro ponto que chama a atenção é que a autofiscalização pode acarretar aumento de maus-tratos com os animais em abatedouros, sem respeito ao bem-estar animal e com ampliação de riscos de transmissão de doenças.
Nesse ponto, a fiscalização dos agrotóxicos também pode ficar precária, com a ampliação da utilização dos produtos para maior produtividade – causando mais contaminação para o meio ambiente e intoxicação para lavradores e consumidores.
O Sindicato Nacional dos Fiscais Federais Agropecuários informou, em nota, que tomará medidas sobre pontos como a terceirização e o registro de produtos agropecuários. Com a sanção da Lei, espera-se que a regulamentação envolva diversos setores para atender os pontos preocupantes que o PL do Autocontrole traz para a sociedade.