Urbanista critica uso de FGTS antecipado como “bondade eleitoral”
“O fundo é uma das poucas fontes de recurso para infraestrutura urbana, saneamento básico e habitação, sendo jogado numa bacia de oferta de crédito para quem não tem a menor condição atual e futura de pagá-lo”, diz Raquel Rolnik.
Publicado 29/10/2022 11:06 | Editado 31/10/2022 07:43
O uso de dinheiro público na reta final do segundo turno das eleições 2022 parece não ter fim, na opinião da professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, Raquel Rolnik. A análise foi feita em sua coluna na Rádio USP.
Além de usar o crédito consignado, que poderá ser pago com o Auxílio Brasil “futuro”, medida esta que está sendo questionada pelo Tribunal de Contas da União, também está entre as bondades eleitorais o uso do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) “futuro” para financiar o imóvel. Diferente do consignado, esta medida foi menos discutida pela imprensa, por isso ela chama a atenção para as consequências disso.
Ela explica como este recurso não estará disponível para complementar recursos para compra de um imóvel ou em caso de demissão do trabalhador. No momento de “pedir um empréstimo para poder comprar uma casa, adquirir um imóvel, aquela pessoa que não tem renda suficiente para isso pode também usar como renda o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço que ela ainda vai receber no futuro, ou seja, uma espécie de caução. Ela faz a cessão desse fundo futuro para que isso também constitua uma possibilidade de juntar com essa renda. Estamos falando de uma possibilidade de endividamento de um recurso que pode não existir se, por exemplo, a pessoa perder o emprego”.
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O que acontece se o trabalhador perder o emprego?Essa discussão, segundo Raquel, foi levantada no momento da aprovação da lei – o que aconteceu em junho para ser sancionada em agosto -, mas o Conselho Curador do Fundo de Garantia só regulamentou essa lei agora, no dia 18 de outubro. Convenientemente, lotando as agências da Caixa Econômica Federal de pessoas desesperadas, às vésperas da eleição.
Basicamente, a ideia contempla a possibilidade de um seguro de seis meses até que a pessoa possa encontrar um novo emprego, “mas, se não encontrar um emprego, provavelmente o que vai acontecer com ela é ficar inadimplente, perder a casa e ficar com uma dívida”.
Entre outras consequências graves, ela alerta que isso ainda vai deixar um rombo enorme no próprio Fundo de Garantia por Tempo de Serviço. Ela lembra que o FGTS foi criado no período da ditadura militar como grande elemento financiador da moradia, do saneamento e da infraestrutura urbana.
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Agora, esse recurso também foi destinado para empréstimos de microcrédito, com juros que não são claros. A urbanista conclui observando que esse fundo era uma das poucas fontes de recurso para infraestrutura urbana, saneamento básico e habitação, “sendo jogado numa bacia de oferta de crédito, sobretudo para quem não tem a menor condição atual e futura de pagá-lo”.