Polícia Federal, CGU e TCU miram corrupção no Governo Bolsonaro
Esquema na Codevasf baseado na farra das emendas parlamentares do orçamento secreto conta até mesmo com cardápio dos bens e obras oferecidos a deputados e senadores.
Publicado 19/08/2022 20:14
No Governo Bolsonaro, a Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf) tornou-se alvo de investigações por corrupção pela Polícia Federal e pela Controladoria-Geral da União (CGU) assim como Tribunal de Contas da União (TCU). Segundo nova denúncia, da Folha de S. Paulo, deputados e senadores contam até mesmo com uma espécie de cardápio, com fotos, para escolher entre as opções de bens e serviços disponíveis para serem contratadas via emenda parlamentar. Desta forma, podem contratar desde um par de botas em PVC por R$ 110 até um caminhão com carroceria de madeira por R$ 365 mil ou mesmo uma ponte por R$ 810 mil ou dois quilômetros de asfaltamento, ao custo de R$ 2 milhões.
A finalidade da Codevasf seria realizar projetos de irrigação no semiárido brasileiro. Contudo, de acordo com outra denúncia, feita pelo jornal O Globo, a gestão Bolsonaro fura poços pelo sertão, mas não instala os equipamentos do sistema de abastecimento ou em alguns casos, instala equipamentos precários. O resultado é que a água potável não chega às casas e, quando chega, é salobra. A empresa atua em estados do Nordeste, do Norte e no Distrito Federal.
Os pedidos dos parlamentares são realizados por ofício à Codevasf. Na avaliação do Tribunal de Contas da União (TCU), “quando há a indicação do parlamentar ou do empregado público para a realização de obra com um revestimento específico, sem qualquer fundamentação técnica e econômica expressa, indiretamente estão também se direcionando recursos para uma determinada ata [contrato] e, por conseguinte, a uma determinada empresa para a sua execução”.
De 2018 a 2021, o valor empenhado (reservado no orçamento para pagamentos) pela estatal avançou de R$ 1,3 bilhão para R$ 3,4 bilhões, a reboque das emendas parlamentares, que saltaram de R$ 302 milhões para R$ 2,1 bilhões no mesmo período. Inicialmente, o Orçamento de 2022 previa R$ 610 milhões em emendas de relator para a Codevasf. Esse valor passou para R$ 1,2 bilhão com o novo acordo. No total, a Codevasf tem orçamento de R$ 2,7 bilhões em 2022. O relator do Orçamento de 2022, deputado Hugo Leal (PSD-RJ), afirmou ao g1 que o acréscimo foi autorizado por uma portaria publicada pelo Ministério da Economia.
Há cerca de um mês, a Polícia Federal cumpriu 16 mandados de busca e um de prisão no Maranhão, tendo apreendido na ação cerca de R$ 1,3 milhão em dinheiro, além de itens luxuosos, como relógios importados. Um dos alvos da apuração é a Construservice, vice-líder em licitações na Codevasf e que teria se valido de laranjas para participar de concorrências públicas na gestão de Bolsonaro. Desde 2019, o governo já reservou à empreiteira ao menos R$ 140 milhões, tendo desembolsado R$ 10 milhões disso até agora. O empresário Eduardo José Barros Costa, sócio oculto da Construservice, representou a empresa em reunião oficial com o presidente da Codevasf, Marcelo Moreira, na sede da companhia, em dezembro de 2020. De acordo com a PF, nas licitações, empresas de fachada dele disputavam as concorrências entre si e, no fim, saía-se vitoriosa a Construservice. Todos os contratos da empresa foram firmados após 2019, ou seja, no governo Bolsonaro. A empresa também só recebeu recursos federais na atual gestão, segundo dados do Portal da Transparência.
Já a Controladoria-Geral da União (CGU) identificou potencial “manipulação política” em duas licitações da 3ª Superintendência Regional da Codevasf para a compra de tratores agrícolas e retroescavadeiras. A CGU também apurou superfaturamento de, no mínimo, R$ 19 milhões nas aquisições, segundo informações do portal Metrópoles. Os equipamentos serão destinados a cidades de Pernambuco. Foram licitados 325 tratores agrícolas, no valor total de R$ 62,1 milhões, e 175 retroescavadeiras, por R$ 61,7 milhões. Os pregões foram homologados em outubro e dezembro do ano passado. “O Estudo Técnico Preliminar não descreve objetivamente como se chegou à solução proposta e como seriam utilizados esses tratores [e retroescavadeiras] de forma a impactar positivamente a realidade das famílias que dependem da agricultura familiar”, assinalou a CGU.
A Codevasf firmou ainda um contrato de R$ 61,7 milhões para a compra de tratores com uma empresa fundada há apenas dois anos: a Imperiogn Comércio de Máquinas Equipamentos e Serviços, registrada em nome de Ana Luiza Cassiano Batista, de 21 anos. A CGU identificou risco de superfaturamento de R$ 11,8 milhões no negócio firmado pela estatal. A mãe dela, Andrea Cassiano Batista, afirmou que a filha não tem empresa registrada em seu nome e que ela trabalha como diarista em Goiânia.