Membro do PCC comprou armas após receber autorização do Exército
Mesmo com extensa ficha criminal, homem conseguiu obter registro de CAC (caçador, atirador e colecionador), fornecido pelo Exército, e adquiriu carabinas, fuzil, pistolas, espingarda e revólver
Publicado 21/07/2022 17:30 | Editado 21/07/2022 17:45
Não é apenas por meio de desvios e ações violentas que armas registradas podem chegar às mãos do crime organizado. Em meio à ampla flexibilização do acesso promovida pelo governo Bolsonaro, um membro do PCC (Primeiro Comando da Capital) comprou um fuzil, entre outras armas, após obter um certificado de registro de CAC (caçador, atirador e colecionador), fornecido pelo Exército. E isso foi possível mesmo tendo uma ficha corrida com 16 processos, dos quais cinco indiciamentos por crimes como homicídio qualificado e tráfico de drogas.
Ao todo, o homem adquiriu, já com o registro, duas carabinas, um fuzil, duas pistolas, uma espingarda e um revólver, num valor total superior a R$ 60 mil. A situação foi descoberta após apreensão feita na semana passada pela Polícia Federal em Uberaba (MG), que incluiu ainda um Jaguar avaliado em R$ 230 mil.
Ao que tudo indica, o homem pode ter se beneficiado de fragilidades no processo de obtenção do registro, já que ele apresentou ao Exército somente a certidão negativa de antecedentes criminais na segunda instância, emitida pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais. E conforme determina a legislação, deveria ter expedido a de primeira instância, onde constam os crimes cometidos. O Exército preferiu não se pronunciar a respeito.
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Dificuldades de controle e aumento de CACs
Esse tipo de fragilidade na checagem de documentação já foi apontada pelo Tribunal de Contas da União (TCU) em auditoria ainda em 2016. Com a ampliação das possibilidades de acessar armas e munição, a partir do governo Bolsonaro, a situação gera ainda mais preocupação de especialistas na área da segurança pública.
Ouvido pelo jornal Folha de S.Paulo, Bruno Langeani, gerente de projetos do Instituto Sou da Paz, destacou que “sem corrigir estas falhas e agora com vários novos privilégios, como a possibilidade de portar armas, comprar até 30 fuzis e operar fábricas caseiras de munição em casa, o incentivo para o crime organizado cresceu muito. Assim, temos visto toda semana casos de CACs envolvidos em crime ou em facilitação do crime organizado”.
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Desde 2019, quando Bolsonaro iniciou o processo de facilitação do acesso às armas de fogo, até junho deste ano, mais de 550 mil pessoas se registraram como CACs, o que corresponde a 42% do total de armas registradas no Sigma (Sistema de Gerenciamento Militar de Armas) entre 2003 e junho de 2022, segundo aponta o Anuário Brasileiro de Segurança Pública.
“Em outros termos, significa dizer que, a seguir esta tendência, ao final de 2022, teremos mais armas registradas no Sigma nos últimos quatro anos do que nos 15 anos anteriores somados”, diz o anuário.
Vale destacar ainda que de acordo com o anuário, “a quantidade de munição comercializada no mercado nacional em 2021 ultrapassou os 393,4 milhões de cartuchos, um aumento de 131,1% em relação a 2017”.