Aldo Arantes: Renato Rabelo, continuador da obra de João Amazonas
Renato completa 80 anos bem vividos. Tive oportunidade de acompanhar sua trajetória política por vários anos. Ele foi militante de JUC [Juventude Universitária Católica], ingressando posteriormente na AP [Ação Popular], sendo eleito presidente da União dos Estudantes da Bahia.
Publicado 22/02/2022 12:08 | Editado 22/02/2022 22:09
Como presidente da UEB [União dos Estudantes da Bahia], participou das manifestações dos estudantes contra o reitor da UFBa. Durante o ato, passou um carro com o General Juracy Magalhães, Ministro de Relações, que foi vaiado pelos estudantes. O General parou o carro e lançou impropérios contra os estudantes. A vaia aumentou! Em seguida pedras foram lançadas atingindo seu ajudante de ordens o que fez o General sair em disparada.
Diante da perseguição que viria, Renato foi para o Rio. Posteriormente, eleito vice-presidente da UNE.
Perseguido, entrou na clandestinidade e fez um curso na China.
A quase totalidade dos membros de AP evoluiriam para posições marxistas, sob a influência do pensamento Mao Tse Tung. E a AP se transformou em APML (Ação Popular Marxista-Leninista).
Foram se consolidando duas posições na direção de APML em relação ao PCdoB. Uma que pretendia a incorporação ao Partido e outra que se colocava contra. Da primeira posição faziam parte Duarte, Haroldo, eu e Renato, que lideravam a maioria da direção da Organização.
O Comitê Central da APML aprovou, em 17 de maio de 1973, a resolução “Incorporemo-nos ao PCdoB”. Tal decisão foi adotada em função do desencadeamento da Guerrilha do Araguaia.
Para transmitir a decisão, Haroldo e Renato tiveram um encontro histórico com João Amazonas e Pedro Pomar.
Em seu livro Páginas de uma história que vivi, que será lançado no aniversário dos 100 anos do PCdoB, Haroldo descreve este encontro da seguinte forma:
“Reunião iniciada, falamos da AP, da luta interna, do seu desfecho, da situação atual de nossos trabalhos, da nossa presença em escala nacional, da existência de um trabalho especial desenvolvido para ser frente guerrilheira, noticiamos que o Aldo Arantes estava na China. Falaram do Araguaia, da resistência em curso, da importância de respaldar os companheiros que lá estavam, de conhecerem a área especial que estávamos preparando para ser área guerrilheira. Quando a reunião ia terminando, o Amazonas tomou a palavra e disse mais ou menos o seguinte: após o início da guerrilha do Araguaia, ficamos na mira da repressão, a ordem é nos matar. Nesse momento, entrar para o Partido é colocar seu nome na lista dos que estão condenados. E é o que vocês estão fazendo. E estão fazendo isto sem pedir nada em troca, sem pleitear nenhuma posição na direção do Partido. Pois nós queremos dizer-lhes que recebemos vocês de braços abertos, com muita alegria e admiração”.
Fruto da incorporação, Haroldo, Renato e eu passamos a compor a Comissão Executiva do CC [Comitê Central] do PCdoB.
Anos depois, Amazonas foi com Renato, participar do 12º Congresso do Partido do Trabalho da Albânia e fazer contato com o PCCH.
Neste ínterim ocorre a Chacina da Lapa. A repressão pensava que Amazonas estaria na reunião.
O avanço da luta contra a ditadura permitiu que o Partido lançasse as palavras de ordem da luta pela anistia, contra os atos de exceção e pela Constituinte. Tal política permitiu uma maior aproximação do Partido com as massas.
A crise do socialismo, com a queda da União Soviética, levou inúmeros partidos no mundo a abandonarem o marxismo, o socialismo e a revolução. O PCdoB, sob a direção do Amazonas, com a colaboração de Renato, soube, corajosamente, enfrentar a situação.
Fez uma crítica revolucionária aos erros cometidos na construção do socialismo, bem como ao dogmatismo. Reconheceu o papel da União Soviética que abriu caminho para a construção do socialismo. Manteve a opção em torno do marxismo-leninismo, do socialismo renovado e da revolução.
No 7º Congresso, em 1991, o Partido aprovou a resolução O Tempo Não Para. O socialismo vive! Na oportunidade Renato fez importante pronunciamento ao Congresso. O fato é que o desempenho do Renato nas funções partidárias foi permitindo a consolidação de sua liderança.
No processo de preparação do 10º Congresso, que ocorreu em 2001, Amazonas declarou que pretendia propor o nome do Renato para a presidência do Partido.
Em maio de 2002, João Amazonas falece gerando uma grande consternação entre os comunistas.
Amazonas que tanto trabalhou pela vitória de Lula não teve oportunidade de presenciar este importante acontecimento.
À frente do PCdoB, Renato dirige os debates sobre a participação do Partido no governo Lula. Tratava-se de uma decisão inédita que o partido iria adotar.
E a 9ª Conferência Nacional, realizada em junho de 2003, sob a direção de Renato adota a posição de participar no governo para impulsionar as mudanças. E Agnelo assume o Ministério dos Esportes.
Iniciativa ousada foi a aquisição da sede própria para o Partido, em São Paulo. Adquirida com recursos próprios advindos de uma campanha de finanças.
Fato importante foi a aprovação pelo 12º Congresso, realizado em 2009, do Programa Socialista para o Brasil, que definiu que o socialismo é o rumo, o Novo Projeto Nacional de Desenvolvimento é o caminho.
Em 14 de dezembro de 2007, sob a direção do Partido foi realizado o Congresso de Fundação da CTB (Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil).
Na 10ª Conferência, após 13 anos na direção do PCdoB, Renato, seguindo a orientação adotada por João Amazonas, indica Luciana para Presidenta, valorizando o papel da mulher na direção do Partido.
Na continuidade Renato assume a direção da Fundação Mauricio Grabois, dando continuidade à sua preocupação de aprofundar os estudos sobre a realidade internacional e nacional, armando o Partido para enfrentar os novos desafios dos tempos atuais.
Renato fez um balanço das atividades da FMG no 15º Congresso do PCdoB, terminando assim: “É baseado no trabalho de pesquisa e estudo da FMG e nesse contexto mundial e nacional que procuramos assumir uma nova fase na trajetória da Fundação. Exige assumir os meios modernos da tecnologia de informação e formação, novas ferramentas e nova metodologia para não ficarmos à margem na luta de ideias. As nossas linhas de pesquisas se voltou aos temas candentes deste início do século 21, como: as singularidades do capitalismo contemporâneo; as tendências do sistema internacional na atualidade, a luta por uma nova ordem mundial; as experiencias revolucionárias do século 20, ressaltando o estudo das contribuições de Lenin; o papel dos países de orientação socialista, destacadamente a China, que desempenha um lugar central na nova luta pelo socialismo; a atualização do Programa Socialista do PCdoB, centrado no seu caminho relativo ao ideário nacional-desenvolvimentista”.
Firme em suas posições, tranquilo na defesa de suas opiniões, sempre procurando se aprofundar no estudo da busca da saída para os dilemas do mundo atual. Renato se transformou em destacado dirigente do PCdoB, dando continuidade, com criatividade, ao legado de João Amazonas.
Parabéns Renato, pelos seus 80 anos. Longa vida junto à querida Conchita, filhos e netos!
Abraço afetuoso do amigo,
Aldo Arantes
Brasília, 22 de fevereiro de 2022.
*É dirigente nacional do PCdoB. Foi deputado federal por quatro mandatos, deputado constituinte. Aldo foi também um dos fundadores da AP e presidente da UNE. Atualmente é coordenador geral da ADJC.