Turquia contesta disputa de ilhas gregas militarizadas
Pela primeira vez, a Turquia contesta a soberania da Grécia sobre suas ilhas do leste do mar Egeu, que deveriam permanecer desmilitarizadas. O Tratado de Lausanne dizia que a Grécia não poderia construir bases navais, fortificações ou grandes concentrações de tropas nas ilhas.
Publicado 09/02/2022 08:08 | Editado 09/02/2022 00:43
Enquanto a OTAN confronta a Rússia sobre a segurança na Europa, a tensão renovada entre a Grécia e a Turquia está corroendo o calcanhar oriental da aliança.
Em cartas enviadas ao secretário-geral da ONU, Antonio Guterres, em julho e setembro, a Turquia contestou pela primeira vez a soberania da Grécia sobre suas ilhas do leste do mar Egeu, “sobre as quais a soberania foi cedida à Grécia sob a condição específica e estrita de que sejam mantidas desmilitarizadas”.
A Grécia absorveu as ilhas de Limnos, Samotrácia, Lesvos, Samos, Chios e Ikaria do Império Otomano nas Guerras Balcânicas de 1912-13. Foi oficialmente concedida a soberania sobre eles no Tratado de Lausanne de 1923.
Outro tratado elaborado em Londres em 1914 condicionava a posse grega das ilhas à sua desmilitarização.
O Tratado de Lausanne dizia que a Grécia não poderia construir bases navais, fortificações ou grandes concentrações de tropas nas ilhas.
A Grécia nunca construiu bases navais nas ilhas e negou ter colocado forças desproporcionais lá. Segundo militares gregos, as únicas armas que existem são as armas defensivas de curto alcance da guarda nacional. Dizem que a Grécia não pode lançar nenhuma ação ofensiva contra a Turquia a partir das ilhas.
Mas a Grécia começou a colocar forças nas ilhas na década de 1960, quando as relações intercomunitárias se romperam em Chipre entre cipriotas gregos e cipriotas turcos, complicando as relações greco-turcas.
Um dos motivos da desconfiança e cautela grega é que em 1974, a Turquia invadiu Chipre após uma tentativa de golpe apoiada pela Grécia na ilha. A Grécia reagiu reforçando as tropas em suas ilhas do mar Egeu. Recentemente, a Turquia esteve envolvida em invasões à Síria e o Iraque.
Cada centímetro vale muito
Atualmente, cada um deles tem seis milhas náuticas (11 km) de águas territoriais no mar Egeu, mas a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito Internacional do Mar (UNCLOS), concluída em 1982 e ratificada por 158 países, diz que os estados podem reivindicar até 12 milhas (cerca de 20km).
A Grécia, com seus milhares de ilhas, ficaria na posse de 71,5% do mar Egeu, por isso, analistas turcos avaliam o cuidado que os gregos precisam ter para não ignorar os interesses turcos, tomando decisões monolíticas.
O direito a minerar riquezas submarinas tem sido um pomo de discórdia desde 1973, quando a Grécia descobriu o campo petrolífero de Prinos, no norte do Egeu.
A tensão aumentou novamente em 2014, quando uma pesquisa sísmica no Mar Jônico e ao sul de Creta sugeriu que a Grécia poderia estar sobre 70-90 trilhões de pés cúbicos (2-2,5 trilhões de metros cúbicos) de gás natural, com reservas recuperáveis estimadas em US$ 250 bilhões aos altos preços de hoje.
Em 2016, a Grécia arrendou quatro grandes concessões offshore e três onshore para as principais petrolíferas ExxonMobil, Total e Repsol, com a Energean e a Hellenic Petroleum da Grécia incluídas como parceiras.
Provocações
Durante o mesmo período, a Turquia gastou quase um bilhão de dólares comprando ou construindo dois navios de pesquisa sísmica e três navios-sonda – uma indicação clara de que não ficaria para trás na corrida pela riqueza em hidrocarbonetos.
A Turquia alegou que, uma vez que a soberania grega das ilhas é disputada, a Grécia também não pode reivindicar uma plataforma continental para elas.
Junto com isso, em 31 de janeiro de 2020, o navio de exploração sísmica turco Oruc Reis entrou no que a Grécia considera sua plataforma continental, a nordeste de Creta. Uma fragata grega o monitorou por cerca de 24 horas antes de partir.
O governo minimizou o incidente, dizendo que o mau tempo fez com que o Oruc Reis se desviasse do curso, mas o Oruc Reis voltou repetidamente no verão daquele ano, conduzindo o que os especialistas consideraram uma sondagem abrangente do fundo do mar entre Creta e Kastellorizo.
O movimento turco teve consequências militares. Desde então, a Grécia e a Turquia buscaram acordos mutuamente incompatíveis com terceiros.
Em 2019, a Turquia e a Líbia reivindicaram jurisdição marítima sobre o fundo do mar entre elas, reivindicando uma faixa do que a Grécia considera sua plataforma continental – um acordo que os Estados Unidos denunciaram como “inútil” e “provocativo”.
No ano seguinte, a Grécia e o Egito concluíram um acordo de fronteira marítima sobre as mesmas águas. Embora seguisse os preceitos do direito internacional, Ancara alegou que a medida era “nula e sem efeito”.
Enquanto as fronteiras marítimas continuarem sendo uma questão em aberto, sujeita à arrogância política e militar, o potencial para uma conflagração greco-turca, deliberada ou acidental, também provavelmente permanecerá. Ou tudo não passa de pressão turca para manter a Grécia acuada em acordos marítimos.
Com informações da Aljazira