Os estragos do estresse
“Segundo pesquisadores do Imperial College London, o maior risco da nova variante é devido as 32 mutações que ela carrega na proteína Spike, que é justamente a parte do vírus que a maior parte das vacinas utiliza para que o sistema imunológico barre a COVID-19”, diz Claudio Conceição, em artigo no Blog da Conjuntura Econômica.
Publicado 27/11/2021 08:00 | Editado 26/11/2021 21:17
Marina, minha filha mais nova, que durante a pandemia se enfurnou no apartamento, se recusando a qualquer encontro (no que estava certa), com o arrefecimento no número de casos e aumento da vacinação, começou a tentar voltar a uma vida relativamente normal, revendo alguns amigos, se aventurando a um bar ou restaurante, fazendo algumas viagens, visitando a família, mas sempre com um fundo de tensão e tomando cuidados.
Me disse que reviu alguns amigos nesse último final de semana e que levou um susto: a maioria com cara de cansado, com nítidos sinais de envelhecimento, abatidos, desanimados. Também estavam enclausurados e só agora começam a colocar a cabeça para fora d’agua. Como ela, também abatida nessa longa e dura jornada.
Na pandemia, ela e Bruno, seu marido, deixaram de remar, caminhar, andar de bicicleta, fazer esportes, como era comum. O trabalho duplicou e, apesar de jovens, problemas começaram a pipocar no corpo: dores nas costas, gastrites, dores de cabeça, insônia, ansiedade, depressão. Sintomas que devem ter acometido milhões de pessoas ao longo dessa pandemia, não apenas quem contraiu o vírus.
Embora esteja procurando voltar à uma normalidade, o fantasma de que o vírus continua circulando não reduz a tensão e apreensão. Ao ir a seu apartamento essa semana, para uma visita meio relâmpago, me recebeu com receio, pois no domingo tinha encontrado alguns amigos. O medo que a persegue desde o começo da pandemia é do pai, amigos e família se contaminarem. Afinal, sua mãe, minha ex-mulher, foi contaminada em meados desse ano, gerando um estresse enorme. Felizmente, se recuperou. Mas o quadro com a pandemia é de um permanente foco de tensão.
Com ela e Bruno vacinados, ela me disse:
“Pai, acho que temos que aproveitar esse momento em que a situação está mais sob controle para poder sairmos. Não sei se haverá outra chance. Pode surgir uma nova onda. Se ela vier, o que espero que não aconteça, vamos ter que voltar a um novo isolamento, que ninguém aguenta mais. Com cuidados, temos que aproveitar esse momento. Já passamos do nosso limite. Mas qualquer saída, é ainda muito tenso”.
Tinha acabado de sair de uma consulta com minha oftalmologista, uma jovem nissei, a 100 metros do apartamento de minha filha. Durante a consulta, ela me relatava que teve crises de ansiedade e depressão, necessitando tomar medicamentos para enfrentar a dura realidade de cuidar dos filhos e ficar sem poder trabalhar um período, na época mais brava da pandemia.
Em julho último, tomou coragem, pegou os filhos e o marido e embarcou para a França, levando as crianças à Euro Disney.
“Foi muito tenso. Ficar mais de 10 horas dentro de um avião lotado, deu muito medo. Mas tínhamos chegado ao limite. Foi muito tempo sem sair, ver amigos, ir a restaurantes. Agora, espero, que as coisas continuem melhorando. A ansiedade e depressão melhoraram, mas ainda sinto uma pontinha de medo quando vou a alguns lugares”.
Eflúvio telógeno. É um sintoma que afeta pessoas após períodos de estresse. É o terror para muitas mulheres, pois é um processo de queda de cabelos. Com a maior procura por salões de beleza, que voltaram a ter grande procura, é o principal assunto entre as mulheres, já que é unânime os relatos de perda de cabelo. Alterações no ciclo menstrual, lesões na pele também estão ligadas a possíveis casos de estresse provocados pela pandemia, mesmo sem que a pessoa tenha sido contaminada.
Outro sintoma que tem acometido muita gente, são os casos de doença provocada pelo Herpes zóster que aumentaram 35% durante a pandemia. Ainda não se sabe se é causado pelo vírus em si, mas o estresse é um poderoso gatilho para acionar a doença.
No começo de janeiro deste ano, uma dor começou a me incomodar. Localizada no ombro esquerdo, foi piorando até que criei coragem e fui a um ortopedista. Tomografia tirada, o diagnóstico: Capsulite Adesiva. Traduzindo em português: ombro congelado que é uma inflação dos nervos do ombro que dificultam seus movimentos. Se não tratar, os movimentos ficam limitados, como se congelassem, levando você a ter dificuldades de mexer o braço. Daí o nome. Tratamento: infiltração com corticoides, que descartei. E fisioterapia, que faço até hoje. Está quase “descongelado”, pelo paciente e eficiente trabalho de Olívia, minha fisioterapeuta. A razão disso: estresse e tensão, segundo o ortopedista e Olívia. Mais um legado da pandemia.
Sem entrar em detalhes sobre os casos graves que o vírus traz ao corpo, com o comprometimento do funcionamento de vários órgãos, o estresse e a depressão causadas pela pandemia sobre todos nós são enormes.
Por isso assusta o aumento de casos na Europa, o relaxamento de ações sanitárias, como a revogação do uso de máscaras em alguns estados brasileiros, a proximidade das festas de Final de Ano, como o Réveillon, e, depois, quem sabe, o Carnaval, e agora o surgimento de uma nova variante da Covid-19, com diversas mutações, descoberta em Botswana, onde três casos foram confirmados. Mais seis foram notificados na África do Sul e 1 em Hong Kong.
Segundo pesquisadores do Imperial College London, o maior risco da nova variante é devido as 32 mutações que ela carrega na proteína Spike, que é justamente a parte do vírus que a maior parte das vacinas utiliza para que o sistema imunológico barre a COVID-19. Mais um desafio para a ciência que, esperamos, já tenha ou desenvolva novas vacinas ou medicamentos que enfrentem essa nova ameaça se, realmente, ela proliferar.
É mais um motivo de estresse.
Fonte: Blog da Conjuntura Econômica