Dificuldades na construção da ‘Frente Ampla na Luta Ideológica’

A Frente Ampla é negada, ou seja, ainda não se configurou para a esquerda uma ideia plausível, apesar de que as manifestações de 7 de setembro mostraram o fascismo em sua expressão mais escandalosa e estúpida, que é o fato de querer afirmar a ideia de que a minoria deve se impor a uma maioria, assim como Hitler fez na Alemanha.

‘Frente Ampla na Luta Ideológica’ foi o tema do penúltimo debate realizado pelo Observatório da Democracia, dentro do Seminário “Guerra Cultural e Luta Ideológica – caminhos para reconstruir a democracia”, que contou com a participação do advogado Aldo Arantes; do ex-ministro da Cultura, Juca Ferreira; da Fundação Perseu Abramo; de Carlos Lopes, do Instituto Claudio Campos; do deputado federal Glauber Braga, representante da Fundação Lauro Campos/Marielle Franco, e de Alexandre Navarro, vice-presidente da Fundação João Mangabeira e presidente da Faculdade Miguel Arraes. A mediação ficou a cargo de Carina Vitral, da Fundação Maurício Grabois.

Quem abriu o debate foi Aldo Arantes, que fundamentou em sua fala como que o bolsonarismo foi criado e venceu as eleições. “A guerra cultural da extrema direita no Brasil centrou seus ataques na luta contra a corrupção, no anticomunismo e na luta ideológica. As novas tecnologias trouxeram também um elemento extremamente importante, que são os algoritmos e a direita soube se apropriar deles para exatamente identificar e fazer essa corrente com concepção conservadora e reacionária, que tem no PT e na esquerda, os inimigos”, explicou Aldo.

Para ele, as manifestações de 7 de setembro, juntamente com as declarações antidemocracia do presidente, abriram precedentes importantes, entre eles, a falta de adesão em massa que Bolsonaro e seus aliados esperavam e também a discussão de impeachment por partidos que se recusavam a tratar do tema. “É claro o fato de a política adotada por Bolsonaro isolá-lo, mas outro fato concreto é que ele conseguiu construir uma base que hoje se calcula entre vinte e cinco e trinta por cento da população, o que é algo significativo”, concluiu.

Carlos Lopes trouxe à tona uma reflexão sobre o que a Frente Ampla está negando, ou seja, porque ainda não se tem essa ideia plausível, visto que, segundo ele, as manifestações de 7 de setembro mostraram o fascismo em sua expressão mais escandalosa e estúpida, que é o fato de querer impor a ideia de que a minoria deve se impor a uma maioria, assim como Hitler fez na Alemanha.

Em outro momento de sua fala, durante o debate, Lopes atentou para a questão de a democracia ser fundamental. “Apesar de existir diferenças entre uma democracia burguesa e uma democracia proletária, a luta pela democracia começa no terreno burguês, porque senão você nunca vai alcançar outra democracia. Se você não tem acúmulo de qualidade na democracia burguesa, você não pode dar um pulo de qualidade para qualquer outro tipo de democracia”, explicou.

Alexandre Navarro falou da importância do livro que deu origem ao seminário, elogiando a todos que participaram do projeto. Ele ressaltou a importância da frente ampla, citando a luta ideológica como pilar para a democracia. “A ideologia é o cimento das organizações sociais e, se você perde a disputa ideológica, você perde a disputa política, e nós perdemos. Não estamos conseguindo convencer as pessoas, por mais claro que seja o entendimento do que é saúde, educação, do que é ciência e tecnologia do que é um governo democrático, do que é harmonia entre os poderes (…) estamos perdendo a luta ideológica, como anteriormente, e vamos perder a luta política”, enfatizou Navarro.

Navarro também se referiu aos absurdos nos discursos do ministro da Educação, sobre a universidade não ser para todos e a exclusão das pessoas com deficiência na educação regular, e responsabilizou a elite brasileira por ajudar a eleger alguém tão despreparado para o cargo, ressaltando que sabia disso e é responsável pela situação atual.

Ainda sobre a frente ampla, Navarro citou como exemplo o Observatório da Democracia, criado em 2017, com apenas cinco fundações e que, hoje, já soma dez, sendo que fundações latino-americanas também poderão fazer parte do projeto. “A frente ampla pode virar uma frente política, para isso é preciso esquecer pessoas e ver um programa nacional de desenvolvimento. Nós perdemos a capacidade de planejar o futuro”, alertou. Ele também advertiu que é preciso ter um projeto a partir de ideias, a partir de propostas e capaz de viabilizar pessoas, juntar os partidos políticos e, aí sim, criar uma frente ampla para depois de 2023.

Já Juca Ferreira acha que é preciso gerar um processo de aproximação política que seja capaz de enfrentar a ameaça do neoliberalismo autoritário, que hoje está encarnado em Bolsonaro, mas pode, facilmente, migrar para um outro candidato mais palatável, que venha a substituí-lo. “O Brasil precisa retomar o caminho democrático, o caminho da soberania, o caminho do reconhecimento dos direitos da população, do desenvolvimento cultural ao acesso de todos e o caminho de uma política de sustentabilidade”, apontou.

Mas Juca vê uma dificuldade na construção dessa frente ampla, principalmente pela cultura democrática no Brasil não ser muito aprofundada, pela inconstância da democracia interrompida por processos de instabilidade criados pela burguesia, sempre que a população conquista direitos e espaço. “É preciso consolidar a democracia no Brasil, é preciso criar mecanismos de autoproteção. Um país não avança com essas sucessivas interrupções e, depois, quando o povo consegue reconquistar a democracia, é preciso começar da estaca zero. É o que a gente está vivendo no momento, um processo de demolição de todas as conquistas de aspectos já consolidados há mais de trinta, quarenta anos”, afirmou Juca.

O debate trouxe à tona questões que talvez impeçam uma frente ampla mas que precisam ser superadas, pois está claro que só assim haverá uma real possibilidade de vencer o Bolsonarismo na próxima eleição.

Assista abaixo na íntegra.

Do Observatório da Democracia

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