Reforma tributária: governo Bolsonaro não enfrenta desigualdade

Na avaliação do economista Paulo Kliass, governo federal fez opção “tímida” e que não enfrenta a regressividade do sistema tributário.

Em entrevista ao Portal Vermelho nesta semana, o economista Paulo Kliass comentou a reviravolta envolvendo a reforma tributária no Congresso Nacional e as novas perspectivas para o tema. Na avaliação de Kliass, o governo federal fez uma opção “tímida” diante da impossibilidade de realizar uma reforma ampla, já que não há tempo nem apoio para tanto.

O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), dissolveu a comissão mista da reforma tributária, que trabalhava com base nas Propostas de Emenda à Constituição (PEC) 45 e 110, respectivamente de Baleia Rossi (MDB-SP) e do ex-deputado federal Luiz Carlos Hauly. Com isso, invalidou o relatório do deputado e colega de partido Aguinaldo Ribeiro (PP-PB).

Agora, Lira defende uma reforma tributária fatiada, começando com a tramitação do Projeto de Lei nº 3.887/2020, que unifica PIS e Cofins e foi enviado ao Congresso pelo Ministério da Economia. Na avaliação de Paulo Kliass, o movimento de Lira contempla o ministro da Economia, Paulo Guedes, que deseja marcar a entrega de mais uma das reformas prometidas.

O economista lembrou que Jair Bolsonaro já passou da metade de seu mandato e, até o momento, entregou apenas a reforma da Previdência, mesmo assim desidratada em relação ao que Guedes pretendia.

“Este ano vai ser um ano perdido em termos de economia e ele [Guedes] quer se agarrar em alguma tábua de salvação para dizer: ‘Eu entreguei alguma coisa’. E aí desistiram de caminhar pela trilha da reforma constitucional. O Paulo Guedes pegou a coisa mais simples do mundo, que ninguém é contra: juntar dois tributos federais que incidem sobre a mesma base [Pis e Cofins]”, afirmou Paulo Kliass.

Além de ser fácil obter consenso sobre o tema, o número de votos necessários para a aprovação é menor. Por se tratar de um projeto de lei e não de uma emenda constitucional, a unificação do PIS e da Cofins pode ser aprovada apenas com maioria simples.

Reforma justa e solidária

Kliass destacou também que mesmo a PEC 45 – que propunha unificar cinco tributos federais, estaduais e municipais – não poderia ser chamada de reforma, mas apenas de simplificação tributária. A proposta descartada por Lira não ataca problemas como a regressividade do sistema tributário brasileiro, ou seja, proporcionalmente os mais pobres pagam mais imposto.

“Se você vai ao supermercado e compra um litro de leite, o montante de tributos é exatamente o mesmo, ganhe você o auxílio emergencial de R$ 150 que o Guedes está propondo ou ganhe R$ 300 mil, R$ 400 mil por mês. Por isso é muito injusto. Isso fica mais acentuado porque nossa tributação incide basicamente sobre consumo”, comentou o economista.

Paulo Kliass destacou a isenção da tributação sobre lucros e dividendos, concedida pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso no fim da década de 1990, e, ainda, a não tributação do patrimônio. Previsto na Constituição Federal, o Imposto sobre Grandes Fortunas (IGF) só precisaria de lei complementar para ser implementado – no entanto, isso jamais aconteceu.

Tanto a tributação sobre lucros e dividendos quanto o IGF fazem parte da reforma tributária justa e solidária, proposta pela oposição como uma emenda substitutiva global à PEC 45.

“Agora que não existe mais a comissão especial da reforma tributária as forças políticas da oposição têm que ficar de olho principalmente nas tentações autoritárias do Arthur Lira, ver como vai ser a tramitação dos projetos. Vai caber à liderança da Minoria e aos partidos de oposição denunciar a timidez do governo de não querer enfrentar os aspectos necessários para uma reforma tributária justa e solidária”, comentou.

Confira a íntegra do bate-papo:

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