Ato pela Amazônia pede transparência e participação social em acordos ambientais
Entidades representantes do povos indígenas, parlamentares, governadores, prefeitos, sociedade civil, especialistas e congressistas americanos se manifestaram nesta quinta-feira (15) sobre apoio internacional para a preservação ambiental no Brasil
Publicado 15/04/2021 19:47 | Editado 15/04/2021 21:56
Nesta quinta-feira (15), parlamentares, ativistas, entidades representantes dos povos indígenas e organizações nacionais e internacionais debateram o acordo entre os governos americano e brasileiro para a preservação da Amazônia. Foram dois eventos: Emergência Amazônica – Em Defesa da Floresta e o Fórum Climático da Amazônia. As manifestações nas reuniões virtuais frisaram a importância da proteção florestal e alertaram para a política do governo Bolsonaro de crimes contra o meio ambiente e povos indígenas.
A maior preocupação dos participantes é o escopo reduzido em que o acordo está sendo firmado. Sociedade civil, organizações não governamentais, comunidades amazônicas e povos indígenas não foram consultados sobre a realidade do país e a atuação do governo federal. O repasse de recursos financeiros do governo americano para a gestão de Bolsonaro sem que haja um amplo e transparente debate é um risco para os povos amazônicos e distorce o propósito do acordo, que pode legitimar e financiar a agenda de destruição ambiental promovida pelo governo brasileiro.
A manifestação foi organizada pelo Fórum Nacional Permanente em Defesa da Amazônia (FNPDA-Brasil) e pelo coletivo formado por Coica (Coordenação das Organizações Indígenas da Bacia Amazônica), Gregorio Mirabal, Repam, Fospa, Asamblea por la Amazonía e Amazon Watch, com apoio de várias organizações nacionais e internacionais. O debate está disponível nas redes sociais do Fórum Nacional Permanente em Defesa da Amazônia. Os atos ocorrem às vésperas do encontro de líderes mundiais na Cúpula Climática pelo Dia da Terra, que acontecerá nos dias 22 e 23 de abril de 2021.
Emergência Amazônica
Durante a manhã, o encontro virtual Emergência Amazônica – Em defesa da Floresta e da Vida foi sediado na Liderança da Minoria da Câmara dos Deputados teve a participação de entidades da sociedade civil, movimentos sociais, partidos políticos e frentes parlamentares. Os participantes do evento lançaram uma carta e um manifesto que serão encaminhados a Biden, ao Congresso norte-americano, e aos presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG) pedindo mais transparência e participação social na negociação do acordo ambiental entre os países.
A participação por vídeo gravado do Cacique Raoni, principal liderança indígena do país, foi contundente e endereçada à Joe Biden.
“Presidente dos Estados Unidos, escute com atenção o que vou lhe dizer. Estou triste por saber que, de tudo que eu tenho feito em prol do meio ambiente está sendo cada dia mais ameaçado. Senhor Presidente, o presidente deste país tem contado muitas mentiras. Ouça-me. Não aceito madeireiros ou garimpeiros dentro da minha terra. Quero a floresta em pé. Não sei falar o seu nome, mas o senhor já deve ter ouvido falar de mim. Sempre lutei pela floresta e os presidentes anteriores me ouviram. Espero que me escute também. Somente este presidente está contra mim. Se esse presidente ruim falar algo pro senhor ignore-o e diga: Raoni já falou comigo”, afirmou Raoni.
Outra liderança indígena a se posicionar foi Sonia Guajajara, coordenadora da Associação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib).
“O que nos traz aqui hoje neste ato é a continuidade da vida no planeta. A minha vida, a de você e a de futuras gerações. Para isso, nós precisamos basicamente de duas coisas: as florestas em pé e líderes políticos comprometidos”, comunicou Sonia Guajajara. “Vamos continuar lutando contra qualquer acordo comercial ou qualquer empresa que viole nossos direitos e os direitos da mãe terra. Vamos continuar lutando por um processo que garanta a participação dos povos indígenas na sua governança. Como será o nosso amanhã se não agirmos agora?”
O deputado Airton Faleiro (PT-PA), coordenador o Fórum Permanente em Defesa da Amazônia – entidade organizadora do evento –, reforçou a manifestação contra a postura do governo brasileiro.
“Esse evento se soma às outras iniciativas de cartas da Apib, do Fórum de governadores, que fazem crítica a esta metodologia do governo Biden de fazer acordo a portas fechadas com o governo brasileiro, sem participação da sociedade civil. Somos favoráveis à cooperação internacional, mas discordamos da forma.”, afirmou Faleiro. “Esse governo é inimigo da Amazônia, dos povos indígenas e seu projeto para a Amazônia é criminoso. Não merece confiança e Biden não devia dar atenção a este projeto”.
A deputada Federal Joênia Wapichana (Rede-RO), coordenadora da frente parlamentar mista em defesa dos diretos dos povos indígenas, relembrou que madeireiros e garimpeiros invadem as terras indígenas mais do que antes no governo Bolsonaro. O resultado é destruição do meio ambiente e comprometimento dos direitos dos povos indígenas.
“Além de matar os nossos defensores de direitos humanos, além de desmantelar toda a política de proteção ao meio ambiente, além de atacar constantemente os povos indígenas, o governo ainda tem negado o direito de falar por si só em relação à defesa do meio ambiente”, afirmou Joenia Wapichana.
A deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ), que teve participação ativa na criação do FNPDA-Brasil, reforçou a atuação suprapartidária junto à sociedade civil no combate à destruição florestal e crimes ambientais, assim como na formulação de políticas públicas do ponto de vista social.
“Vocês terão no PCdoB total apoio nesta batalha pelo desenvolvimento sustentável, na luta contra o desmatamento, contra os madeireiros, na tentativa de agressão e violação dos direitos dos povos indígenas e povos tradicionais, na defesa de todas as políticas contra o desmatamento, contra as violações e desestruturação dos órgãos ambientais da região, de todos eles”, afirmou a deputada.
Jandira ainda reforçou a história de luta do partido e se posicionou contra um acordo que não leve em consideração os principais afetados pela destruição ambiental.
“Nós sabemos que esse governo jamais cumprirá nenhuma meta e não concordaremos com qualquer acordo com o governo norte-americano que não respeite a sustentabilidade”, completou Jandira.
A deputada Alice Portugal (PCdoB-BA), presidente da Comissão de Cultura da Câmara, alertou para a importância da comunicação e cultura na região.
“Estamos alarmados na Comissão de Cultura porque a privatização da EBC acabará com a Rádio Nacional da Amazônia e com todos os sinais de frequência pública. Estamos em defesa do direito da comunicação na região e reforço aqui meu compromisso na luta em defesa do terreno cultural e político da região”, afirmou.
O deputado federal Marcelo Freixo (PSOL-RJ) frisou que o Brasil é uma preocupação mundial, com alto nível de destruição ambiental e recordista em assassinatos de ativistas de direitos humanos.
“Não há como separar democracia, preservação ambiental e direitos humanos. Essas coisas não se separam. O que a gente tá questionando aqui é um modelo de consumo e um modelo de sociedade. A forma de poder. Tem alternativa para isso”, disse Freixo. “Nós temos um antiministro do Meio Ambiente que precisa ser derrubado em nome da vida. O ministério do Meio Ambiente no Brasil virou um caso de polícia. Então que qualquer acordo bilateral, que qualquer ação internacional sobre o Brasil escute os povos das florestas, escute a sociedade civil, escute os setores do parlamento que estão na defesa da vida.”
O presidente do Consórcio Interestadual da Amazônia Legal, o governador do Maranhão Flávio Dino (PCdoB), também participou do evento. Dino informou sobre a reunião realizada na quarta-feira (14) com governadores dos nove estados da Amazônia Legal e embaixadores de países estrangeiros.
“Apresentamos uma visão de desenvolvimento sustentável aos embaixadores, frisando que a questão principal, em nível internacional, não é a obtenção de recursos financeiros apenas, mas sim, sobretudo, saber para onde esses recursos irão, ou seja, quais são as prioridades, valorizando a temática do desmatamento ilegal, que deve ser reduzido sim, porém, vinculando esse objetivo com a temática da geração de emprego e renda para os trinta milhões de brasileiros e brasileiras que moram na Amazônia brasileira”, explicou Dino.
Carlos Augusto Santos Silva, Secretário de Formação e Organização Sindical da Contag (Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais e Agricultoras Familiares), que reúne cerca de 4 mil sindicatos em 17 unidades federativas, reforçou o pedido por transparência.
“Nós precisamos de cooperação, mas uma cooperação, um acordo que tenha um debate com os povos da Amazônia, que tenha uma interação concreta com as propostas, com os projetos, coma história e a trajetória das nossas populações na Amazônia. Nós não aceitamos uma carta de cima pra baixo, nós não aceitamos uma carta que venha esconder e que não venha debater claramente”, declarou Carlos Augusto. “É preciso escutar, é preciso garantir a transparência necessária para debater um tema importante como o tema ambiental.”
Edmilson Rodrigues (PSOL), prefeito de Belém, relembrou o aumento de 34% no desmatamento da Amazônia em 12 meses.
“As instituições do Estado, a sociedade brasileira, a soberania nacional sofrem uma violência, um vilipêndio, um constrangimento sistemático de um governo criminoso, antisoberano, genocida. Não é exagero falar em genocídio”, alertou Edmilson. “O governo comete um crime diante de todas as instituições do Estado, que aqui ou ali se manifestam, mas não conseguem dar um passo decisivo fundamental que é varrer da história esse lixo que é sustentado e sustenta o crime contra a soberania e o crime das organizações criminosas”.
O congressista americano Mark Pocan, de Wisconsin, reconheceu a importância mundial da Amazônia e manifestou sua preocupação com a destruição em curso na região. “Eu concordo que o presidente brasileiro Bolsonaro representa um perigo para a floresta e não é confiável com nenhum suporte financeiro internacional, enquanto medidas concretas para reduzir o desmatamento e proteger os direitos humanos não forem demonstradas”.