Quebra de patentes de vacinas contra Covid-19 é debatida na Câmara dos Deputados

Pauta deve ser levada ao colégio de líderes na próxima semana. Tema foi debate de Comissão Geral na Câmara.

Foto: Tania Rego/AgBR

“O mundo clama pelo fim da pandemia e a vacina é uma forma comprovada para combater o avanço do vírus. Como assegurar vacinas para toda a humanidade? Como impedir a mortandade de milhões? Como vencer a negligência de governos negacionistas? Não há como responder a estas perguntas sem tratar da necessária e urgente quebra de patentes das vacinas contra a Covid-19, que pode multiplicar a produção de imunizantes e impedir mais mortes pelo mundo”, disse a deputada Alice Portugal(PCdoB-BA) autora do requerimento para que Câmara dos Deputados realizasse uma Comissão Geral nesta quinta-feira (08) para discutir a quebra de patentes das vacinas contra a Covid-19.

O tema ganhou ainda mais relevância dado o momento crítico vivido pelo país. O Brasil já contabiliza mais de 340 mil mortes por Covid-19 e ainda tem um ritmo lento de vacinação, dada a omissão, negligência e negacionismo do governo Bolsonaro no combate à pandemia e na negociação das doses das vacinas disponíveis no mercado.

Para o líder do PCdoB, deputado Renildo Calheiros (PE), esse é um debate urgente. “Precisamos planejar critérios para a quebra de patentes de vacinas contra a Covid-19 no Brasil. O licenciamento compulsório dos imunizantes pode ser uma saída para acelerar a vacinação, reduzir mortes e retomar a economia”, destacou.

O deputado Aécio Neves (PSDB-MG), que presidiu a comissão geral, afirmou que vai sugerir ao Colégio de Líderes a sistematização das propostas que permitem a fabricação de vacinas no Brasil. Segundo ele, a expectativa é que a Câmara vote as medidas já na semana que vem.

“Medidas excepcionais existem para serem tomadas em momentos excepcionais. Este é o momento mais excepcional e grave que o Brasil vive nos últimos 100 anos. O Congresso Nacional tem o dever de agir para enfrentar o colapso da saúde”, afirmou.

Autora de proposta legislativa sobre o tema, a deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ) observou que os projetos de licença compulsória não tratam apenas da vacina, mas de qualquer medicamento, insumo ou equipamento relacionado ao tratamento da pandemia.

“Precisamos ter uma atitude ampla de construção e de aprovação desses projetos, que podem estar todos apensados num único”, propôs.

A deputada Alice Portugal informou ao final da Comissão Geral que fará de um Grupo de Trabalho (GT) para encaminhar propostas sobre a quebra de patentes das vacinas contra a Covid-19. “O Congresso Nacional precisa dar respostas à sociedade brasileira que está desesperada com a falta de vacinas”, destacou.

Vacina não é mercadoria

Jorge Bermudez, pesquisador sênior da Escola Nacional de Saúde Pública da Fiocruz, afirmou que no mundo há mais de duas mil solicitações de quebra de patentes relacionadas com o tratamento da Covid e que é preciso entender que vacina é um bem público.

“Vacinas e tecnologias não são mercadorias, têm que ser tratadas como insumos no contexto do direito à saúde. Precisamos defender a vida e fortalecer o SUS e encarar os imunizantes e as tecnologias como bens públicos”, disse.

Capacidade de produção

Para o diretor presidente da Bahiafarma, Tiago Vidal de Sá Moraes, o problema da vacina não se resolve simplesmente com o livre mercado atuando, é necessário que entidades multilaterais possam disciplinar, orientar e coordenar a ampliação da capacidade de produção dos imunizantes.

“É fundamental que haja uma coordenação sobre os detentores de tecnologia e sobre quem possui capacidade produtiva. É necessário que a transferência de tecnologia aconteça a partir dessa ação coordenada. A OMS e OMC precisam estabelecer um comitê central que possa identificar a capacidade de produção mundial, quais vacinas precisam ser desenvolvidas, qual a necessidade de investimento. Precisamos dessa coordenação para não ficarmos na lógica do mercado de revacinar, revacinar por conta das variantes existentes nos lugares onde não há vacinação”, explicou.

Direito à saúde x disputas políticas

Eloísa Machado, professora da FGV/SP, afirmou que há razões políticas e humanitárias suficientes para o enfrentamento do debate sobre as patentes.

“Ao mesmo tempo em que a nossa Constituição entende a patente como um privilégio temporário, ela garante o direito à saúde para todos como obrigação do Estado. A nossa legislação já prevê a hipótese de licenciamento compulsório em caso de emergência nacional e interesse público. Se o que estamos passando agora não for suficiente para se acessar esse tipo de flexibilização, a nossa legislação se tornará letra morta”, ressaltou a professora.

O governo Bolsonaro, no entanto, vem atuando contra qualquer medida que combate a Covid-19. Em 2020, por exemplo, contrariando uma postura consolidada no país em defesa da quebra de patentes, o Brasil ficou contra a proposta da Índia e da África do Sul – apoiada por diversas nações – na reunião da Organização Mundial do Comércio (OMC).

Para o deputado Daniel Almeida (PCdoB-BA) é impossível justificar a postura da diplomacia brasileira. “Estamos diante de uma crise humanitária. Nada pode ser mais importante do que oferecer às pessoas possibilidades de sobrevivência, preservar vidas. É muito egoísmo nessa hora preservar patente. O Brasil ficou na contramão dos países em desenvolvimento, contrariando sua postura. Demos um grande passo quando garantimos o acesso aos medicamentos genéricos. O combate à Aids é outro exemplo de sucesso. Mas nesse momento, quando Índia e África do Sul sugeriram isso na OMS, com apoio da OMS e de mais de uma centena de países, o Brasil, “estranhamente”, ficou na contramão. Já ficamos no final da fila na aquisição das vacinas. É inaceitável manter esse comportamento”, destacou.

Além das “trapalhadas diplomáticas”, que também envolvem ataques a países produtores de vacinas, como a China, na avaliação da deputada Alice Portugal, o Brasil está atrasado na vacinação porque o governo Bolsonaro recusou sucessivas ofertas da Pfizer, apostou todas as fichas na vacina AstraZeneca-Oxford, boicotou a Coronavac por disputas políticas e só decidiu comprar outras vacinas quando a fila de países compradores já era gigantesca.

“O Congresso Nacional precisa dar respostas à sociedade brasileira desesperada com a falta de vacinas, mas esta resposta não pode ser a que a Câmara dos Deputados votou nesta semana, franqueando a compra de vacinas por empresas, decisão que afronta nossa tradição de imunização pública para todos os brasileiros. Não podemos aderir à vacinação censitária, onde ricos se imunizam e pobres morrem nos corredores dos hospitais. A vacina tem que ser pública, para todos os brasileiros e urgente, daí a necessidade da quebra de patentes”, destacou Alice.

A deputada Perpétua Almeida (PCdoB-AC) reiterou a falta de preocupação do governo brasileiro em combater a pandemia, trabalhando como um aliado do coronavírus.

“Nós vivemos uma guerra contra um inimigo invisível e extremamente letal. Neste cenário de terror, a quebra de patentes dos imunizantes, insumos e equipamentos vai nos levar a vacinar mais rapidamente a população brasileira e conter a escalada de mortes na pandemia. É urgente que a vacina seja um bem público, de interesse da população do planeta, porque é preciso salvar a humanidade. O Brasil, mesmo tendo mais de quatro mil mortos por dia, passando de 340 mil mortes nesta pandemia, parece não se preocupar com que muitos mais possam morrer. É preciso que o presidente Bolsonaro “caia na real” e perceba que ele foi eleito para cuidar do país e para cuidar da população. Ele não foi eleito para abandonar o povo brasileiro, deixando-o morrer”, pontuou.

Fonte: PCdoB na Câmara

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