STF torna Sergio Moro suspeito ao condenar Lula no caso do tríplex
A Segunda Turma do STF decidiu, por 3 votos a 2, pela suspeição do ex-juiz Sergio Moro no processo em que condenou o ex-presidente Lula pelo tríplex do Guarujá
Publicado 23/03/2021 18:31 | Editado 23/03/2021 23:23

Por 3 votos a 2, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu a favor do habeas corpus pela suspeição do ex-juiz Sergio Moro no caso que levou à condenação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pelo tríplex do Guarujá, processo que se originou na Lava Jato de Curitiba. O voto determinante foi dado pela ministra Cármen Lúcia que mudou seu voto proferido, em 2018, a favor de Moro.
O ministro Kassio Nunes Marques, indicado por Bolsonaro à corte, que havia pedido vista, começou o julgamento dando voto contra a suspeição de Moro. Com isso, o placar que terminou na sessão anterior em 2 a 2, ficou em 3 a 2 favorável ao ex-juiz.
Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski votaram para tornar Moro suspeito. Em 2018, Edson Fachin e Cármen Lúcia já tinham votado a favor de Moro. Com a mudança de voto da ministra, o placar, portanto, virou para 3 a 2 a favor do ex-presidente.
Segundo a ministra, houve uma “espetacularização” de atos de Moro, como a condução coercitiva de Lula. Também destacou como indícios de parcialidade o grampo nos advogados do ex-presidente e a divulgação de áudios seletivos. “Junto com outros que vão se somando e demonstram, portanto, a conduta do juiz que pretendia que a imparcialidade não presidiu todos aqueles atos do processo.”
Cármen Lúcia concedeu a ordem, seguindo o entendimento de Gilmar Mendes e Lewandowski. Para ela, o ex-presidente tem direito de ser julgado por um juiz imparcial “porque todo mundo tem direito a um julgamento justo, por um juiz imparcial, por um tribunal independente e, principalmente, no qual ele possa comprovar todo os comportamentos que foram aos poucos sedimentando e se consolidando”.
No seu voto, Nunes Marques considerou inviável a apreciação da suspeição de Moro pelo instrumento do habeas corpus. “Admitir a apreciação de suspeição em HC impetrado originariamente no Supremo, depois de julgadas e rejeitadas três exceções sobre a matéria, com base em prova ilícita, desordenaria completamente os ritos e procedimentos da lei processual penal”.
Segundo ele, o HC não é remédio adequado para que se avalie a suspeição de um juiz. Disse que o habeas corpus não admite contraditório entre acusação e defesa. Ele também criticou o voto de Gilmar Mendes considerando “uma manifesta ofensa ao princípio do contraditório”, porque não dá ao ex-juiz a chance de se defender.
Sobre os diálogos vazados entre Moro e os procuradores, o ministro alegou que se trata de prova inaceitável, porque elas são frutos diretos de crimes. “Entender-se de forma diversa, que resultado de tais crimes seriam utilizáveis, seria uma forma transversa de legalizar a atividade hacker no Brasil”, disse. Ele ainda pôs em dúvida conteúdo das mensagens, que podem ter sido editadas.
Reação de Mendes
Gilmar Mendes reagiu duramente ao voto do ministro indicado por Bolsonaro. “Doutrina e jurisprudência admitem habeas corpus como substituto da revisão criminal. As provas estão nos autos, é isso que precisa ser analisado”, reagiu.
Mendes lembrou que a defesa apontou sete pontos que demonstrariam parcialidade antes do vazamento de mensagens. Lembrou do uso de conduções coercitivas sem intimação prévia autorizada por Moro contra o ex-presidente, sendo esse modus operandi, adotado pela Lava Jato, inconstitucional. “Isso, ministro Marques, com a devida vênia, nada tem a ver com garantismo. Isto é uma indecência”, disse.
O ministro ainda falou sobre os grampos telefônicos feitos nos advogados de Lula. “Só isso era suficiente para acolher habeas corpus”, afirmou. “Atrás da técnica de não conhecimento do habeas corpus, muitas vezes, se encontra um covarde”, criticou. E ainda ironizou: “O réu não tem direito à defesa, o juiz tem. É uma fórmula interessante”.
Sobre os vazamentos, Mendes ficou exaltado: “Não vamos ficar de conversa fiada. Não houve ninguém até agora que teve a capacidade de dizer que houve um dado falso nessas revelações. Meu voto está calcado nos elementos dos autos”.
E completou: “Ou o hacker é um ficcionista ou estamos diante de um grande escândalo. Não importa o resultado deste julgamento, a desmoralização da Justiça já ocorreu. O tribunal de Curitiba é internacionalmente conhecido como de exceção”.
“Alguém compraria um carro de Moro? De Deltan Dallagnol? São pessoas de confiança?”, questionou Mendes.
No entanto, fez questão de dizer que a parcialidade do ex-juiz está nos autos apresentados pela defesa do ex-presidente. “Em que país do mundo isso pode ser feito? Qual Código de Processo Penal permite isso? Não se trata de áudio ou hacker. Se trata dos que está nos autos!”, rebateu para depois falar de cada caso levantado pela defesa.
O ministro Ricardo Lewandowski reforçou a posição de Mendes para que se possa debater suspeição em habeas corpus. Além disso, reiterou que a decisão não necessitava das mensagens vazadas.
O advogado de Lula Cristiano Zanin lembrou que o habeas corpus é de 2018, quando não havia qualquer conhecimento da existência de mensagem hackeada.
A sessão prossegue com a leitura do voto do ministro Fachin que reafirmou suas posições contra a suspeição.