Fake news contra anistiados por ditadura é desmascarada

Além de exagerar a quantidade de beneficiários, post fake ignora que o valor da compensação é limitado pelo teto constitucional

O blog Estadão Verifica, hospedado no portal Estadão e voltado à “checagem de fatos”, desmascarou nesta sexta-feira (26) uma fake news contra os 7.200 brasileiros que foram anistiados por perseguição da criminosa ditadura militar (1964-1985). Segundo a página, é falso que “25 mil anistiados (…) recebam indenizações superiores a R$ 40 mil mensais, como afirma publicação viral no Facebook.

Além de exagerar a quantidade de beneficiários, a mensagem ignora que o valor da compensação é limitado pelo teto constitucional e depende de fatores individuais do anistiado – por exemplo, a ocupação que ele exercia quando afetado pelo regime militar. A análise e aprovação dos benefícios são atribuições da Comissão da Anistia, que desde 2019 está ligada ao Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos.

Porém, os pagamentos para civis e militares são competência, respectivamente, do Ministério da Economia e do Ministério da Defesa. A soma do número de pagamentos realizados pelas pastas indica que, em setembro de 2020, pouco mais de 7.200 pessoas receberam a reparação mensal. O Ministério da Economia publica informações até janeiro de 2021, enquanto os dados mais atualizados da Defesa são de setembro.

Há distinção entre o número de beneficiados de setembro com os registros de agosto (7.221), julho (7.237) e junho (7.265) – mas não há diferenças significativas na quantidade de indenizações pagas.  Os valores naquele mês variam de um salário mínimo (R$ 1.045, em 2020) a R$ 49 mil. Somente oito anistiados, todos civis, receberam indenizações mensais superiores a R$ 40 mil.

Segundo os dados do Ministério da Economia, a compensação foi paga a cerca de 3,9 mil civis em setembro. O valor médio das indenizações, excluindo registros abaixo do salário mínimo, corresponde a R$ 3.880.  Já os documentos do Ministério da Defesa apontam que o órgão destinou pagamentos a 3.288 militares, com valor médio de R$ 12,5 mil – o maior repasse foi de R$ 32.900 mil. Ou seja, se há indenizações polêmicas, é especialmente para integrantes das Forças Armadas (da ativa e da reserva).

A indenização a anistiados políticos é regida pela Lei 10.559/2002. Conforme o texto, podem solicitar reparação ao Estado todas as pessoas atingidas por atos institucionais ou complementares, por motivação política, de 18 de setembro de 1946 até 5 de outubro de 1988.

Os critérios incluem profissionais do setor privado ou servidores públicos que foram punidos, demitidos ou compelidos ao “afastamento das atividades remuneradas que exerciam”, assim como estudantes que foram de alguma forma prejudicados pelo regime.  A indenização é transferível a filhos e cônjuge, ou seja, o filho de um anistiado político pode receber o valor após a morte de seus pais.

Existe tanto a indenização mensal continuada quanto a indenização única. A primeira categoria é destinada aqueles que comprovam vínculos empregatícios na época. O valor, de acordo com a lei, “será igual ao da remuneração que o anistiado político receberia se estivesse na ativa”.

Neste caso, o cálculo do benefício ainda considera eventuais graduações, “direitos e vantagens” incorporados à categoria profissional de quem recebe a indenização. Mas a quantia não pode exceder o teto constitucional, que corresponde ao salário dos ministros do Supremo Tribunal Federal, hoje em R$ 39,2 mil. O benefício também não pode ser inferior ao salário mínimo.

As poucas remunerações acima do teto constitucional e abaixo do piso determinado pela lei configuram “complementos de indenização”. Esses valores acima do teto são todos limitados pelo “abate-teto” constitucional. Trata-se de um dispositivo legal que abate da pensão a quantia acima do teto constitucional. Há, no entanto, uma única exceção que segue o cumprimento de uma decisão judicial.

Já a indenização única consiste no pagamento de 30 salários mínimos (R$ 33 mil, em valores atualizados) por ano de punição do anistiado. Essa modalidade abrange quem não tem meios de comprovar uma atividade laboral durante o regime militar. A prestação é limitada por um teto de R$ 100 mil.

Portanto, os salários de “mais de 40 mil” sugeridos no post enganoso nem sequer são previstos em lei. A compensação a anistiados políticos é objeto frequente de boatos enganosos nas redes sociais. Em setembro, o blog Estação Verifica desmentiu um post que dizia que uma jornalista recebia pensão de R$ 27 mil. Já o site Aos Fatos desmontou uma narrativa falsa que associava o benefício a uma série de artistas e políticos.

Os dados do Ministério da Economia estão disponíveis no site da pasta em uma planilha bastante extensa com todos os pagamentos desde 2002. As informações sobre militares podem ser encontradas no site da Defesa. Com exceção dos dados referentes a setembro, os demais são separados por cada segmento das Forças Armadas.

Com informações do Estadão