Desvincular recursos afeta direitos pétreos, diz Frente pela Vida
Entidades alertam para inconstitucionalidade na proposta de desvinculação de recursos para saúde e educação
Publicado 24/02/2021 14:39 | Editado 24/02/2021 19:28

A articulação no Congresso Nacional para acabar com a obrigatoriedade do gasto mínimo constitucional em educação e saúde continua sendo criticada por diversos setores da sociedade. Após manifestação de parlamentares e outras instituições, a Frente pela Vida emitiu nota alertando para os riscos inconstitucionais de desvincular recursos do orçamento da saúde e educação.
A nota reforça que a “saúde e educação são direitos pétreos que não podem ser abolidos sob nenhum pretexto”. A Constituição estabelece que estados devem investir 12% da receita em saúde e 25% na educação. Os municípios são obrigados a aplicarem 15% (saúde) e 25% (educação). Já a União não pode reduzir o investimento nas duas áreas que é corrigido pela inflação do ano anterior.
Assim, a mudança pode desmanchar a lógica do Fundeb, discutida em dezembro de 2020, e desfinanciar o SUS em um momento em que a população está envelhecendo e precisa de mais atendimento de saúde. “Aprovar a desvinculação constitucional de receitas mínimas para o financiamento da saúde é asfixiar o direito consagrado nos artigos 6° e 196 da Constituição”, reforça o comunicado.
As centenas de entidades que compõem a Frente pela Vida estiveram juntas na Marcha Pela Vida, em 9 de junho, e vêm acompanhando as ações, comprometidas com o direito à vida, à saúde, à ciência e ao meio ambiente; pelo fortalecimento do SUS, dos laços de solidariedade social, e da democracia.
Leia a nota na íntegra:
Desvincular recursos do orçamento da saúde e educação fere a constituição
Nós, entidades da área da saúde que fazemos parte da Frente pela Vida, apelamos a todos os parlamentares para que atentem para fatos descritos abaixo.
O direito à saúde é direito social fundamental, assim como a educação, protegido constitucionalmente contra qualquer forma de retrocesso em sua garantia, especialmente a diminuição de seus insuficientes recursos orçamentários. Ainda que a Constituição vede em seu artigo 167, IV, a vinculação de receita de imposto a órgão, fundo ou despesa, excetuou a saúde pública e a educação exatamente pela sua relevância individual e social, tanto que os artigos 198, § 2° e 212 vinculam percentuais mínimos de receitas para a sua sustentabilidade.
Ambos os direitos têm caráter prestacional, dependendo de recursos para a sua efetividade, uma vez que podem morrer à míngua se não houver recurso orçamentário suficiente à sua manutenção. A ação estatal na saúde e na educação tem custos, daí a necessidade de ao lado do direito, haver garantia de recursos para a sua satisfação.
Todos sabem que a Constituição mantém como pétreas normas que não podem ser abolidas por emenda constitucional, como as que garantem direitos e garantias individuais, incluídos os direitos sociais considerados fundamentais pelo STF. Assim, saúde e educação são direitos pétreos que não podem ser abolidos sob nenhum pretexto. Isso leva a considerar que normas que dispõem sobre percentuais mínimos de receitas para o financiamento desses direitos também são pétreas dada a sua essencialidade. Sem custeio adequado se estará por via obliqua abolindo o direito que custa sem o excluir da Constituição. Por isso tais normas são geneticamente pétreas por serem as que garantem a sua efetividade.
Desvincular receitas destinadas ao custeio adequado da saúde e da educação se configura, pois, violação ao disposto no artigo 60, § 4°, IV, da Constituição, por configurar retrocesso na garantia de direitos fundamentais ao afetar seus recursos mínimos.
É fato notório que a saúde é subfinanciada há 32 anos, agravada a partir de 2016 pela EC 95 que ao congelar o gasto público por 20 anos, congelou os valores que sustentam a saúde pública ao nível de 2017, corrigido apenas pela inflação. A intensa judicialização da saúde, com mais de 2 milhões de ações judiciais, é o exemplo fiel do subfinanciamento.
Aprovar a desvinculação constitucional de receitas mínimas para o financiamento da saúde é asfixiar o direito consagrado nos artigos 6° e 196 da Constituição, violando a proteção pétrea dos direitos fundamentais. Ao garantir perenidade ao direito à saúde, a Constituição contaminou as normas orçamentárias de garantia de efetividade do direito. A garantia de recursos mínimos para a saúde não pode ser alterada sob pena de se ferir a Constituição, por compor o núcleo essencial do direito.
FRENTE PELA VIDA