Candidato ao Nobel da Paz, Raoni pede fim do garimpo em terras indígenas
Manifesto assinado pelo Instituto Kabu, Associação Floresta Protegida e Instituto Raoni alerta para a explosão de desmatamento e grilagem nos territórios da etnia
Publicado 08/10/2020 17:13 | Editado 08/10/2020 17:25
Conhecido mundialmente pela trajetória de luta e defesa dos direitos dos povos indígenas no Brasil, o cacique Raoni é um dos nomes mais cotados na disputa pelo Nobel da Paz 2020. O prêmio será anunciado nesta sexta-feira (09), em Oslo. Em paralelo, o “cacique da paz”, como é conhecido, lança um manifesto urgente com as três associações de indígenas Kayapó (Instituto Raoni, Associação Floresta Protegida e Instituto Kabu) do Mato Grosso e sul do Pará contra a legalização do garimpo em Terras Indígenas e com um alerta para o aumento desenfreado do desmatamento e da grilagem em territórios indígenas nos últimos anos.
Conforme advertem os Kayapó, o desmonte das fiscalizações e o estímulo ao garimpo por parte do governo encorajam as invasões e a exploração predatória. Apenas nos últimos três anos, o garimpo já destruiu cerca de cinco mil hectares de floresta na Terra Indígena Kayapó, um dos epicentros da mineração ilegal. Todo o desmatamento provocado pelo garimpo nessa terra indígena entre a década de 1980 e o ano de 2015 chegou à metade disso: 2,5 mil hectares.
O acirramento dos conflitos coloca em risco a integridade dos indígenas e potencializa o avanço da Covid-19 no território. Já são ao menos 16 mortes e 2.032 casos nas TIs Kayapó, Menkragnoti, Badjokôre, Capoto Jarina e Baú.
“Repudiamos a forma como o governo federal vem estimulando a invasão de nossos territórios, seja pela retórica que fortalece o crime organizado, seja pela omissão e fragilização dos órgãos responsáveis pela proteção dos territórios indígenas e pelo combate a atividades ilegais e predatórias”, diz o documento.
No manifesto, as organizações reconhecem que há indígenas da etnia que decidiram se integrar à cadeia de garimpo, mas ressalta que não representam a totalidade do povo Kayapó. “A crescente pressão sobre nossas comunidades fez com que algumas poucas lideranças fossem seduzidas pelo ganho financeiro rápido e fácil que o garimpo proporciona. Não autorizamos que eles falem em nome do Povo Kayapó (…) Como poderíamos ser a favor de uma atividade que gera profundos impactos ambientais e sociais aos nossos territórios e comunidades? Como poderíamos privar nossos filhos e netos de um território preservado para seguirem vivendo segundo nossos usos, costumes e tradições, como garante a Constituição Federal?”, questiona o texto.
O ano de 2020 vem sendo desafiador para Raoni. Aos 90 anos, o cacique enfrentou a morte de sua esposa, Bepkwyjka, em junho; uma infecção intestinal e a contaminação pela Covid- 19, da qual ainda se recupera. Em janeiro, cerca de 600 lideranças extrativistas, ribeirinhas, quilombolas e indígenas atenderam ao chamado do cacique e uniram suas vozes na aldeia Piaraçu, Terra Indígena Capoto Jarina (MT), no que ficou marcado como o relançamento da Aliança dos Povos da Floresta.
No encontro, Raoni, que parece ter previsto a necessidade de reunir forças para enfrentar um ano marcado pela destruição do meio ambiente e por ameaças aos povos indígenas e tradicionais, novamente ecoou a mensagem que caracteriza sua biografia: “Não vou desistir, vou continuar até quando o meu corpo resistir. Enquanto o indígena tiver ameaçado, eu vou pedir a paz”.
Fonte: ISA (Instituto Socioambiental)