A Covid-19, o auxílio emergencial e a estratégia de Bolsonaro

Impacto do auxílio mostrou a Bolsonaro que o governo pode ampliar sua base de apoio

O presidente Jair Bolsonaro “entendeu vários de seus pontos fracos e tem trabalhado neles”. É o que apontam pesquisas realizadas por Esther Solano e Camila Rocha, baseadas sobretudo nos eleitores bolsonaristas e detalhadas em artigo de Esther publicado no site da revista CartaCapital.

Conforme o texto, a renda emergencial foi o gatilho para o aumento da popularidade presidencial, sobretudo no Nordeste. “Camila Rocha e eu realizamos entrevistas com integrantes das classes C e D desesperados por terem perdido o emprego e com muito medo da crise econômica”, explica Esther. “Muitos reconhecem a irresponsabilidade de Bolsonaro na pandemia, mas são os R$ 600 que permitem a sobrevivência. A maioria não faz ideia de que esta medida seja de autoria da oposição. É o governo que possibilita pôr comida na mesa.”

Na visão das pesquisadoras, o impacto do auxílio mostrou a Bolsonaro que o governo pode ampliar sua base de apoio. “Bolsonaro entendeu que, para manter ou aumentar sua popularidade, os R$ 600 são um elemento fundamental – daí também suas viagens ao Nordeste, próxima fronteira eleitoral a atacar. A questão é que o auxílio emergencial entra em rota de colisão com a agenda do ministro Paulo Guedes, e sabemos que Guedes é imprescindível para Bolsonaro manter o apoio dos empresários e do capital nacional e internacional.”

Para Esther, o presidente e seu ministro da Economia podem chegar a um “meio-termo”, mantendo o auxílio – “mesmo com valores mais baixos” – intensificando a agenda de privatizações. “O auxílio poderia se fazer compatível com as reformas de Guedes”, escreve a pesquisadora.

Outra razão para a popularidade crescente de Bolsonaro é a moderação. “Uma das críticas que mais aparecem entre os bolsonaristas entrevistados por nós é o fato de o presidente ser violento demais. Teria um tom autoritário e polêmico que em nada combina com o decoro e a moderação exigidos pelo cargo. Durante a campanha eleitoral, o tom agressivo foi tolerado e, inclusive, comemorado. Mas muitos desses mesmos bolsonaristas que o aplaudiam hoje dizem que, no governo, Bolsonaro não pode continuar a agir dessa forma”, diz Esther.

Ciente disso, “Bolsonaro entendeu o recado e parece que se autodomesticou ou permitiu ser domesticado. Tem fechado a boca e com a boca fechada sua popularidade sobe”. Ao mesmo tempo, os filhos desapareceram. “Até entre as bases bolsonaristas mais radicais o papel dos filhos é muito mal avaliado. Estes são definidos como ‘moleques’, ‘irresponsáveis’ e principais fatores de instabilidade do governo”, afirma Esther. “Mas os filhos se tornaram quase invisíveis – diminuiu muito seu papel nas redes sociais. Outros que fecharam a boca e fizeram a popularidade do pai subir.”

Esther Solano também aponta as limitações da esquerda – e do conjunto da população – no diálogo com os brasileiros. A seu ver, o discurso do “campo progressista” ecoa pouco – “não chega a grande parte da população”. O motivo: “Não temos canais de comunicação (não temos a mídia, não temos as redes e não temos o território). Nas poucas vezes em que o discurso consegue chegar, é visto com enorme desconfiança, pois nós, como interlocutores, fomos criminalizados e descartados nesses últimos anos.”

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