Explosão no Líbano ocorre em meio à crise política e econômica
A explosão na região portuária de Beirute ocorre apenas um dia depois da renúncia do ministro das Relações Exteriores, que saiu criticando a gestão econômica do governo. O novo governo tenta responder às grandes manifestações populares contra a profunda crise econômica.
Publicado 04/08/2020 17:04 | Editado 04/08/2020 19:39
O primeiro-ministro Hassan Diab aceitou a renúncia de Nassif Hitti, que anunciou sua demissão pela suposta gestão do novo governo da pior crise do país em décadas. Ele disse que o país arriscava se tornar um “estado falido” e que o governo mostrava falta de vontade de realizar as reformas necessárias.
O governo tem apenas seis meses de posse e já enfrentou três renúncias de alto escalão, pedidos de líderes partidários para demissão do primeiro ministro, a crise sanitária da pandemia de covid-19 e, agora, essa explosão em área nobre de Beirute. Antes da pandemia, o desemprego e a insegurança alimentar já ameaçavam a população mais pobre. O país também recebe e tenta acolher refugiados palestinos e sírios que chegam ou passam pelo país.
Ex-embaixador da Liga Árabe, Hitti foi nomeado em janeiro, quando o gabinete de Diab assumiu o cargo com o apoio do grupo Hezbollah, apoiado pelo Irã, e seus aliados.
“Eu participei deste governo com a base de que tenho um empregador chamado Líbano e encontrei no meu país muitos empregadores e interesses conflitantes”, disse Hitti em sua carta de demissão ao primeiro-ministro Hassan Diab, divulgada na segunda-feira.
“Se eles não se unirem em torno dos interesses do povo libanês e os salvarem, então o navio, que Deus livre, afundará com todos a bordo”.
Em sua carta de demissão, Hitti repreendeu a ausência de uma “verdadeira vontade de realizar reformas estruturais … que nossa sociedade pede e a comunidade internacional está nos chamando a fazer”.
A carta também criticou implicitamente o Hezbollah, um dos principais apoiadores do governo de Diab, pedindo a necessidade do Líbano de fortalecer seus laços com a “comunidade árabe” e ser “radiante em seu ambiente árabe”. O chanceler é contra as relações entre o país e o Irã, e favorável a uma aproximação libanesa com a Arábia Saudita, forte aliado dos EUA.
Golpe no governo
A renúncia de Hitti é o maior golpe até agora para o novo governo de Diab, que se esforçou para cumprir as promessas de que implementaria reformas abrangentes após massivos protestos anti-governo no ano passado.
Embora o diplomata veterano seja o primeiro membro do gabinete de Diab a deixar o cargo, o governo já viu duas renúncias de alto nível de uma equipe que negociava um resgate com o Fundo Monetário Internacional. Ambos haviam citado a mesma falta de vontade de reformar a economia devido aos interesses da elite político-financeira do país.
As conversas com o FMI, que o estado fortemente endividado começou em maio após um default soberano, estão suspensas. Investidores estrangeiros deixaram claro que não haverá ajuda até Beirute fazer mudanças para combater o desperdício e a corrupção do Estado – raízes da crise, que representa a maior ameaça à estabilidade do Líbano desde a guerra civil de 1975-1990.
Na semana passada, Hitti havia expressado sua frustração com o governo Diab em um popular programa de entrevistas, dizendo que estava “drenando meu crédito profissional e diplomático”.
O governo de Diab também enfrentou pedidos repetidos de demissão, devido as dificuldades de negociação econômica e gafes diplomáticas. Mas ele defendeu que permaneceria no poder alegando que uma substituição levaria muito tempo, o que, segundo ele, seria “um crime contra o povo libanês”.
Até o chefe do Partido da Unificação Árabe, Wiam Wahhab, conhecido por manter laços estreitos com o Hezbollah, também havia pedido a saída de Diab depois que o primeiro-ministro libanês fez declarações nas quais questionava o papel dos serviços de segurança e do Estado. O líder do Partido das Forças Libanesas, um grande grupo cristão no Líbano, também pede a renúncia do primeiro-ministro.
Discurso diplomático com a França
A renúncia de Hitti segue-se a um acidente diplomático envolvendo Diab e o mais forte aliado ocidental do Líbano, a França, depois que o ministro das Relações Exteriores da França, Jean-Yves Le Drian, visitou Beirute no mês passado.
Diab pareceu criticar o ministro das Relações Exteriores da França por vincular a ajuda às reformas e um acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI) ao visitar Beirute no mês passado.
Poucos dias após a visita, um tweet da conta oficial de Diab no Twitter disse que Le Drian não trouxe “nada de novo” e que “desconhecia os rumos das reformas do governo”.
“A decisão internacional até agora não é ajudar o Líbano”, afirmou.
O tweet foi mais tarde excluído. Diab também encontrou-se com uma delegação da embaixada francesa e teria expressado seu apreço pelos laços históricos da França com o Líbano.
Hitti foi escolhido por Gebran Bassil, ex-ministro das Relações Exteriores e chefe do Movimento Patriótico Livre (FPM), que possui o maior bloco do parlamento e foi fundado pelo presidente Michel Aoun.
Relatos da mídia local indicam que a renúncia de Hitti foi parcialmente devido à frustração com a manutenção de Bassil em decisões importantes no ministério. Bassil estava insatisfeito com a decisão de Hitti de sair.
A explosão ocorre na mesma semana em que se espera o resultado do julgamento de quatro membros do Hezbollah, acusados de envolvimento no atentado que matou o ex-primeiro-ministro Rafik Hariri, em 2005, com outras 21 pessoas. O partido da Resistência libanesa nega envolvimento.
Com informações da Al Jazira e The Arab Weekly
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