Professores criticam decisões isoladas de escolas sobre volta às aulas
Entidades de trabalhadores de todo o país criticam a invisibilização de professores e funcionários de escolas na tomada de decisões sobre a volta às aulas, quando estes também são vulneráveis à Covid-19.
Publicado 27/07/2020 23:32 | Editado 28/07/2020 00:26
Representando mais de vinte sindicatos, a Federação dos Professores do Estado de São Paulo pediu a intermediação do Ministério Público do Trabalho (MPT) para a discussão de um protocolo de retorno às aulas, que garanta condições de trabalho aos professores e auxiliares de administração escolar.
O SinproSP é contra a adoção de medidas isoladas na organização do trabalho letivo. A Apeoesp, por sua vez, faz carreatas contra a volta às aulas sem “redução drástica” da pandemia. Em outros estados, professores se manifestam contra o retorno às aulas, enquanto não houver uma vacina. Na cidade do Rio de Janeiro, professores do setor privado, em assembleia virtual realizada pelo Sinpro-Rio decretaram uma greve pela vida contra a posição da Prefeitura de flexibilizar a retomada das atividades presenciais nas escolas particulares sem que a pandemia da Covid-19 esteja sob controle. Isso para citar alguns poucos exemplos.
Na mídia e nos governos, os professores e outros trabalhadores das escolas são os únicos agentes deste debate que nunca são consultados sobre o assunto. A imprensa faz alarme do risco que significa a volta às aulas para moradores idosos das residências com jovens em idade escolar, mas não o risco para os professores. A denúncia é feita inclusive pelo Dieese, em nota técnica sobre os efeitos para os trabalhadores da educação, alunos e familiares.
Os trabalhadores do ensino privado têm sido apartados de todas as decisões que afetam diretamente a sua vida. As escolas tomam decisões unilaterais, o governo só conversa com as representações patronais e estas se recusam a dialogar com os sindicatos que representam os professores e demais trabalhadores. É o que se vê desde o inicio da quarentena.
Ainda em abril, a Federação Nacional das Escolas Particulares (Fenep) lançou um “plano estratégico de retomada das atividades do segmento educacional privado brasileiro”. O protocolo tem sido replicado pelos sindicatos patronais de todo o país, sem preocupação com as especificidades da situação pandêmica e condições de enfrentamento em cada município, estado ou região. A Contee (Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino) critica que a Fenep tenta responsabilizar a resistência de trabalhadores em educação pelo não retorno e por uma possível falência de escolas em razão da inadimplência, da evasão e dos pedidos por diminuição de mensalidades. “Esses mesmos sindicatos patronais não fazem nenhuma articulação política para cobrar ações afirmativas do Poder Público, entre os quais garantir auxílio a estudantes e seus familiares afetados pelo desemprego e pela crise econômica”, diz a entidade.
No dia 16 de março, com a suspensão das aulas recém anunciada, o SinproSP divulgou uma nota manifestando-se contrário à adoção de medidas isoladas, escola por escola, na organização do trabalho letivo. Desde o início, o Sinpro reconheceu a excepcionalidade da situação e entendeu que somente uma negociação coletiva poderia estabelecer um regramento mínimo para garantir condições de trabalho e preservação da saúde a todas as professoras e todos os professores.
Os sindicatos patronais não quiseram negociar e os órgãos de educação entenderam que as escolas privadas tinham autonomia para fazer o que bem entendessem. Para piorar, uma medida provisória (927), publicada no dia 22 de março, promoveu a desregulamentação de direitos no trabalho a distância, permitiu a antecipação de férias e de feriados e o não pagamento de horas extras, entre outras medidas.
Para os professores, o resultado foi imediato: sobrecarga de trabalho, exigências abusivas, jornadas extenuantes, invasão do tempo privado, desrespeito a direitos, antecipação de férias sem nenhuma consulta.
As denúncias que chegam aos sindicatos nesses quatro meses de quarentena comprovam a acelerada precarização das condições de vida e de trabalho dos professores. Precarização esta que tende a se agravar caso a volta às aulas presenciais ocorra sem garantias mínimas e movida exclusivamente por interesses econômicos.
A iniciativa da Fepesp de solicitar ao Ministério Público do Trabalho a convocação das entidades patronais busca uma mediação que possa levar a um protocolo capaz de assegurar a saúde física e mental e condições dignas de trabalho para todos os atuam na Educação, professores e profissionais não docentes. É preciso agora aguardar a resposta do MTP.
Para o SinproSP e a Fepesp, a volta às aulas só pode ocorrer no tempo certo e em condições que vão muito além das medidas sanitárias.
Já a Apeoesp diz que “não haverá volta às aulas sem redução drástica da pandemia e sem garantia de segurança sanitária para a comunidade escolar”. A entidade entende que não há qualquer expectativa que protocolos dirigidos a promover o retorno das aulas sejam adequadas para assegurar o direito à vida e o direito à saúde da comunidade escolar.
“Não aceitamos um plano epidérmico, que não contempla aspectos relacionados às novas necessidades que o ‘novo normal’ imporá ao projeto arquitetônico das escolas, notadamente quanto à ventilação, ao distanciamento social em sala de aula, com revisão dos módulos por ciclo de formação, à sinalização e à sanitização de todos os espaços, incluindo os refeitórios e as áreas abertas”.
Em abaixo-assinado, a Apeoesp ainda diz que, uma vez alcançado um nível aceitável de segurança sanitária, que a decisão de volta seja antecedida pela elaboração de um protocolo consistente e multidimensional, formulado com o apoio das equipes técnicas de saúde, arquitetura e engenharia. “É de fundamental importância que este debate se comunique com a comissão paritária assim que ela for criada, com a presença das entidades representativas dos servidores da Educação, dos estudantes e das famílias, cuja participação é fundamental para legitimar e fortalecer a atuação estatal. E, ainda, que se dialogue com o Ministério Público e o Tribunal de Contas do Estado, envolvendo, assim, os órgãos de controle externo da Administração Pública”.
A entidade ainda critica a falta de acesso à alimentação aos estudantes, o abuso da jornada de trabalho dos professores, avançando para horários e dias de descanso, além de casos de assédio moral; e a dispensa de terceirizados responsáveis pela higienização das escolas.