Especialistas defendem restrição na venda de álcool durante pandemia
Isolamento social pode aumentar o consumo de bebidas e resultar em aumento de violência e de problemas de saúde mental. Estudos explicam que o consumo de álcool tem influência negativa no sistema imune, tornando o organismo mais vulnerável ao vírus
Publicado 21/05/2020 00:31
Um grupo internacional de pesquisadores publicou um estudo no qual defende a restrição da venda de bebidas alcoólicas durante a pandemia do novo coronavírus, já que o contexto pode desencadear um aumento no número de casos de alcoolismo.
No Brasil, exceto pelo fechamento de bares, não há políticas de restrição de vendas durante a pandemia, o que pode tornar o quadro ainda mais preocupante.
O estudo foi publicado na revista Alcohol and Drug Review, e teve a participação de especialistas do Brasil, Canadá, Estados Unidos e África do Sul, e de órgãos como a Organização Mundial de Saúde (OMS) e a Organização Pan-Americana de Saúde (Opas).
“Um mecanismo sugere que o aumento do sofrimento psicológico desencadeado pela interação de dificuldades financeiras, isolamento social e incerteza sobre o futuro durante e após crises como a pandemia do covid-19 pode piorar os padrões de uso de álcool e aumentar os danos atribuíveis”, aponta o levantamento.
Exemplos
A África do Sul foi um dos países que aplicou uma política de restrição na venda de álcool e proibiu a comercialização até nos supermercados. As autoridades avaliaram que houve uma queda na ocorrência de acidentes e casos de violência por conta da redução do consumo de álcool, o que disponibilizou mais leitos em hospitais.
A professora de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e coautora do artigo Zila Sanchez explica que a mesma ação foi adotada pelo Panamá, Groenlândia e algumas regiões dos Estados Unidos, por exemplo.
“Em alguns lugares dos Estados Unidos, por exemplo, foi proibida a venda de álcool apenas pela internet. No Brasil, vamos na contramão, com inúmeros descontos em aplicativos de venda e artistas fazendo lives patrocinadas por fabricantes de cerveja”, disse Sanchez à Agência Fapesp.
Imunidade
Outros estudos também explicam que o consumo de álcool tem influência negativa no sistema imune, tornando o organismo mais vulnerável a infecções por bactérias e vírus. A bebida alcoólica também é responsável pela ocorrência de episódios de depressão, ansiedade e violência doméstica, que podem ser mais frequentes durante o isolamento social.
“Vários estudos mostram que, depois de um evento como esse, há um aumento de dependentes de álcool na população. As pessoas podem estar consumindo mais álcool agora para lidar com o estresse da situação, mas isso claramente pode seguir como uma dependência após a pandemia. Precisamos considerar a falta de regulamentação na venda de álcool hoje, porque vamos pagar a conta lá na frente”, acrescenta Zila.
Em abril, a OMS recomendou a restrição da venda de álcool no período de pandemia. Segundo o órgão, o uso contínuo por pessoas em isolamento pode acarretar consequência como a piora geral nas condições de saúde, o aumento de comportamentos de risco, problemas de saúde mental e maior risco de violência, inclusive doméstica.
“Devemos nos perguntar quais são os riscos que estamos tomando em deixar pessoas trancadas em casa com uma substância perigosa tanto para suas saúdes quanto pelos efeitos no comportamento, inclusive violência”, afirmou Carina Ferreira-Borges, do Programa de Álcool e Drogas Ilícitas da OMS.
Publicado em Rede Brasil Atual