Sistema tributário progressivo ou regressivo? Veja a diferença
Há características que tornam o sistema tributário brasileiro injusto e desigual. Nesta matéria, vamos abordar uma delas: a regressividade.
Publicado 16/03/2020 15:12 | Editado 16/03/2020 19:30
Em matéria publicada na semana passada pelo Vermelho, vimos que a reforma tributária, uma das prioridades da pauta econômica para 2020, não ataca os principais problemas do sistema de tributação brasileiro. As Propostas de Emenda à Constituição (PEC) 45 e 110, em discussão no Congresso Nacional, que propõem a substituição de tributos pelo Imposto sobre Valor Agregado (IVA) e Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), estão mais para simplificação do que para reforma tributária. O governo federal ainda não enviou proposta própria.
A simplificação pode solucionar questões como a complexidade e a burocracia, além de colocar um fim à guerra fiscal entre as unidades da Federação. No entanto, há características que tornam o sistema tributário brasileiro injusto e desigual. Nesta matéria, vamos abordar uma delas: a regressividade.
Qual é a diferença entre um sistema de tributação regressivo e um progressivo? O regressivo arrecada proporcionalmente mais de quem ganha menos. Já um sistema progressivo consegue arrecadar mais de quem tem mais recursos.
Os sistemas regressivos dão ênfase a impostos indiretos, em geral sobre o consumo. Taxar o consumo onera os mais pobres porque as aquisições de bens e serviços consomem uma parcela maior da renda de quem recebe menos. Alguns exemplos de impostos sobre o consumo são o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). O IVA e o IBS, previstos nas propostas de reforma tributária em tramitação no Congresso, também incidem sobre o consumo. Portanto, se aprovadas, essas propostas não alterariam a regressividade do sistema.
Imposto apenas para assalariados
“Todo mundo fala que no Brasil se paga muito imposto, que a carga tributária é alta, que o sistema é muito complexo. Tudo isso é muito interessante, mas o ponto principal, que ninguém fala, é que nosso sistema tributário é extremamente regressivo. Quem tem renda maior paga menos tributo que quem tem menos patrimônio”, afirma César Roxo Machado, vice-presidente de Assuntos Tributários da Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (Anfip).
Roxo destaca, ainda, que algumas características do sistema dão a ilusão de progressividade – o Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF), por exemplo, tem alíquotas que vão crescendo conforme aumenta a renda do contribuinte. No entanto, o IRPF, apesar de ser um tributo direto e com característica progressiva, onera unicamente aqueles que vivem de salário.
Isso porque a cobrança de imposto sobre lucros e dividendos de pessoas físicas está extinta desde 1996, graças a lei aprovada no governo de Fernando Henrique Cardoso. “O rendimento do capital não é tributado e o rendimento do trabalho é. Só o assalariado, trabalhador, é penalizado. Não vou dizer penalizado, pois os serviços públicos são financiados através dos impostos. Mas quem ganha menos acaba pagando a maior parte”, ressalta César Roxo.
“Jabuticaba”
Segundo Roxo, a tributação sobre lucros e dividendos foi retirada sob a justificativa de atrair investimentos. No entanto, a isenção, prevista inicialmente para ser temporária, é uma “jabuticada”. “Só Brasil e Estônica não tributam lucros e dividendos”, destaca o vice-presidente de Assuntos Tributários da Anfip.
Mauro Silva, presidente da Unafisco, uma outra associação representativa dos auditores fiscais, afirma que a carga tributária no Brasil não desestimula o investimento. “Existe a competição tributária internacional. Os investidores comparam o sistema tributário. É claro que isso deve ser levado em conta. Mas, o nosso sistema tributário está longe de ser um desestímulo ao investimento, ele sozinho. Os países da OCDE [Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico] tributam mais a renda do aqui”, afirma.
Como corrigir a regressividade?
Como vimos, os partidos de oposição – PCdoB, PSB, Rede, PSOL, PDT e PT – lançaram uma proposta alternativa de reforma tributária, batizada de reforma solidária e baseada em sugestões da Anfip e da Federação Nacional do Fisco Estadual e Distrital (Fenafisco). A proposta foi apresentada sob a forma de uma emenda substitutiva global à PEC 45.
Como forma de corrigir a regressividade do sistema tributário, a emenda substitutiva prevê o retorno da tributação sobre lucros e dividendos. Cria, ainda, novas faixas do Imposto de Renda para quem ganha mais.
A emenda também propõem um IVA para estados e municípios e uma Contribuição Social sobre o Valor Adicionado (CSVA) para a União. O motivo é que o IVA proposto na PEC 45 suprime a Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (Cofins), cujos ganhos são destinados exclusivamente à Previdência, saúde e assistência social.
“Na proposta que fazemos, acabamos com PIS-Pasep e Cofins e criamos outra contribuição para financiar previdência, assistência e saúde, só que com uma carga tributária menor”, explica César Roxo.
“O básico é que uma reforma tributária, para ser boa, tem de atacar os grandes problemas. Simplificar é importante. Mas o grande problema é a regressividade. Se não atacar, os preços do produto vão ficar iguais”, conclui.