Um pouco da trajetória política e intelectual de Augusto Buonicore
Diante da partida precoce de um dos principais intelectuais marxistas do país, a Fundação Maurício Grabois homenageia a trajetória política e teórica de Augusto César Buonicore. Este breve perfil resgata um pouco de sua história de dedicação ao pensamento marxista, à luta política e ideológica do país e à construção do PCdoB.
Publicado 12/03/2020 13:47 | Editado 12/03/2020 13:58
Augusto César Buonicore nasceu em 21 de julho de 1960. Aos 59 anos, vítima de um linfoma, deixou um legado teórico fundamental para a esquerda e o pensamento progressista. Referência nos estudos de Gramsci e Lênin, Buonicore dedicou sua vida à militância política e aos estudos do marxismo.
Sempre gentil, afetuoso, fala mansa, com sorriso largo no rosto, Buonicore era uma pessoa querida por toda a militância comunista, respeitado por aliados e colegas. Tinha uma impressionante firmeza de convicções e não era condescendente com polêmicas de fundo. Sempre tratava as divergências de forma consistente e profunda, mas com grande respeito.
Como o jornalista José Carlos Ruy disse em sua despedida, “Augusto tinha a delicadeza e a lealdade de apontar, com rigor, o que lhe parecia falho ou inconsistente na pesquisa. O Augusto era assim – um camarada amigo, franco e leal”.
Ingresso na vida política
Seu primeiro contato com a política foi quando ingressou na Escola Estadual Carlos Gomes, no início de 1978, em Campinas. “Ali conheci o movimento estudantil secundarista ainda em fase de reorganização. Em meio a disputa política entre o pessoal da Convergência Socialista (depois Alicerce da Juventude) e os “tribuneiros” (vendedores da Tribuna Operária), optei pelos segundos e ingressei no PCdoB no final de 1979 e início de 1980”, relatou em depoimento recente em seu perfil no Facebook.
Em plena ditadura militar, Buonicore foi um dos organizadores da Associação dos Secundaristas de Campinas (ASC) e, em seguida, participou do processo de reconstrução da União Campineira dos Estudantes Secundaristas (UCES), entidade referência do movimento estudantil secundarista que foi fundamental para a reorganização da União Paulista dos Estudantes Secundaristas e em seguida da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas.
Augusto foi militante do movimento estudantil ao lado de uma geração de jovens que lutavam pelo fim da ditadura militar, em defesa da democracia e da liberdade.
Nessa época, Buonicore já era um entusiasta da propaganda das ideias comunistas. Participava ativamente das brigadas de venda do jornal A Tribuna da Luta Operária em Campinas. Sempre se orgulhou de ser um “tribuneiro”. Em relato sobre sua experiência como tribuneiro, Augusto sublinha a importância daquele trabalho:
“Visando divulgar as idéias comunistas entre os trabalhadores, cada célula partidária deveria adotar uma fábrica para vender a Tribuna Operária. A nossa filha adotiva era uma indústria metalúrgica chamada Bendix. Ali já existia algum trabalho partidário. A situação dos comunistas no interior das empresas era completamente diferente do que ocorria dentro dos colégios e universidades. Os operários comunistas deveriam trabalhar na mais restrita clandestinidade ou perdiam seus empregos. Os materiais partidários eram distribuídos escondidos. Na maioria das vezes eram deixados nos banheiros”.
Início da atividade intelectual
Já militante do Partido Comunista do Brasil, seguiu sua atuação política no movimento estudantil universitário. Augusto cursou história da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
Na PUC, seu interesse pelo estudo da história do Brasil, com recorte para a pesquisa sobre o movimento comunista e operário no país, se aprofundou. Dedicou-se à leitura marxista, ao estudo dos principais teóricos do movimento comunista internacional. Seguiu seus estudos de pós-graduação na Universidade Estadual de Campinas, onde fez mestrado e doutorado em Ciência Política. Aprofundou ainda mais seus estudos e passou a ter uma intensa produção teórica, revisitando clássicos do marxismo, desenvolvendo um trabalho importante sobre Gramsci e Lênin.
Autor de livros e artigos que buscam trazer os debates centrais do movimento comunistas internacional para a realidade brasileira, a partir dos problemas políticos e sociais do país, desenvolveu estudos sobre a questão das mulheres e dos negros no movimento comunistas. Recentemente, escreveu sobre o marxismo e a homossexualidade, mostrando seu compromisso intelectual em buscar elementos para enfrentar temas contemporâneos da luta política e de ideias na sociedade.
Militante e construtor do PCdoB
Apesar da intensa produção intelectual e teórica, Augusto não era um acadêmico distanciado da luta política. Era dirigente do Comitê Municipal do PCdoB de Campinas, onde assumia tarefas militantes e de direção partidária.
Em Campinas desenvolvia um projeto de resgate da memória da cidade no Museu da Imagem e do Som, e ainda encontrava tempo para organizar as atividade do Cineclube Outubro, que ajudou a fundar em 2017 e que exibiu mais de 30 filmes, abordando temas importantes à reflexão contemporânea.
Membro do Comitê Central do PCdoB e dirigente da Fundação Maurício Grabois, Augusto também foi um dos principais entusiastas e responsáveis ao longo das últimas décadas pela política nacional de formação do Partido Comunista do Brasil. Foi um dos Fundadores da Escola Nacional João Amazonas e era um dos professores dos cursos nacionais do Partido.
Mas não foi apenas na direção partidária que Augusto atuou. Na frente sindical, Augusto Buonicore atuou no Sindicato dos Servidores da Unicamp e foi um dos fundadores do Centro de Estudos Sindicais – CES, onde ajudou a desenvolver planos para a formação política e teórica dos dirigentes do movimento sindical. “Sem teoria revolucionária não há ação revolucionária”, repetia sempre.
Nos despedimos de Augusto com um aperto no peito e com a consciência de que num momento em que o pensamento conservador avança no Brasil e no mundo, seu rigor político e intelectual para estudar os fenômenos contemporâneos fará muita falta.
Mas Augusto no deixa um legado imenso que precisa ser estudado e valorizado por todos os progressistas. Abaixo, um pouco da produção da sua Produção:
Livros:
Marxismo, História e Revolução Brasileira: Encontros e Desencontros
Meu verbo é lutar: a vida e o pensamento de João Amazonas
Linhas Vermelhas: Marxismo e os dilemas da Revolução
João Amazonas, um comunista brasileiro
Textos
Fonte: Portal Grabois