Camponeses torturados na Guerrilha do Araguaia têm pedido negado
A Comissão da Anistia negou 307 pedidos de anistia feitos por camponeses perseguidos pela ditadura militar no episódio da Guerrilha do Araguaia, organizada pelo Partido Comunista do Brasil (PCdoB) como parte da resistência democrática, no estado do Pará.
Publicado 18/02/2020 16:32 | Editado 18/02/2020 18:15
O voto do relator em defesa dos crimes da ditadura chamou a atenção. Henrique Araújo, defendeu a ação criminosa dos militares que resultou na morte de pelo menos 67 guerrilheiros e 31 camponeses, segundo o jornal O Globo.
“A Guerrilha do Araguaia não foi movimento legal e nem legítimo de oposição ao regime de 1964, mas sim uma luta armada cuja repressão não configura perseguição política, mas defesa do Estado e da sociedade’, disse, cinicamente, Araújo.
Os casos foram julgados em bloco nesta terça-feira (18). Os processos rejeitados pela Comissão da Anistia, no entanto, se referiam a camponeses que viviam na região do Araguaia durante o episódio.
Segundo os processos, eles foram alvo de perseguição, maus-tratos e tortura durante o período. Muitos foram presos ilegalmente e utilizados como guias pelos militares na caça aos guerrilheiros.
Além de defender a atuação dos militares durante o episódio e negar que a repressão à Guerrilha deva ser encarada como perseguição política, Henrique Araújo alegou falta de provas para concessão da indenização do Estado.
Foco de guerrilha
Especialistas que atuam na defesa dos direitos humanos argumentam, no entanto, que a produção de provas sobre o episódio é muito difícil porque muitas das prisões foram feitas ilegalmente e porque os militares não teriam deixado registros sobre as torturas e assassinatos praticados contra camponeses.
Durante a votação, o general Luis Eduardo Rocha Paiva, que é membro da Comissão, chegou a negar a existência da Guerrilha do Araguaia e disse que o governo acertou ao reprimir o que classificou como “foco” de guerrilha. Segundo ele, “foco de guerrilha tem que ser eliminado na raiz”.
Para a advogada de um grupo de camponeses que pleiteava indenização, Irene Gomes, a decisão da comissão cria um “caos histórico”.
“Essa decisão cria um caos histórico. Há centenas de pessoas que foram afetadas pelas ações dos militares na região e que não tiveram e não terão seus direitos reconhecidos. Os camponeses são tão simples que, muitos, não entendem o impacto disso para a história. Mas é uma situação triste”, afirmou a advogada.
Livro de Ustra
A decisão da comissão de rejeitar os pedidos de anistia dos camponeses do Araguaia acontece dez meses após a ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Alves, mudar a configuração da comissão, órgão que ficou sob a responsabilidade do seu ministério.
Desde que assumiu o ministério, Damares promoveu uma mudança no regimento da Comissão, aumentando de 20 para 27 o número de conselheiros.
Na nova configuração, veio o general Luiz Eduardo Rocha, um dos principais opositores aos trabalhos da CNV e que, frequentemente, leva às sessões um exemplar do livro A verdade sufocada, do coronel do Exército Carlos Alberto Brilhante Ustra, o facínora que comandou o DOI-Codi paulista.
Além dele estão dois ex-assessores do vice-presidente Hamilton Mourão e um policial militar.
Damares tem prometido um “pente fino” nos pedidos e disse que iria abrir o que classificou como “caixa preta” da Comissão de Anistia, insinuando que a existência de irregularidades no funcionamento do órgão.