Organizações internacionais condenam ataque do MPF a Glenn Greenwald
ONGs internacionais e associações de jornalismo criticaram veementemente a denúncia apresentada pelo Ministério Público Federal contra o jornalista do Intercept
Publicado 22/01/2020 11:54
Organizações não governamentais internacionais e associações de jornalismo criticaram veementemente a denúncia apresentada nesta terça-feira (21) pelo Ministério Público Federal (MPF) contra o jornalista Glenn Greenwald, fundador do site The Intercept Brasil. Na denúncia, o MPF alegou, de forma irresponsável, que Glenn participou ativamente dos crimes de invasão de aplicativos de mensagens de autoridades públicas, ao ter supostamente orientado hackers a apagado arquivos “para dificultar as investigações”.
A Anistia Internacional (AI) qualificou a denúncia como “profundamente grave”, afirmando que o caso representa “uma escalada da ameaça à liberdade de imprensa” no País. “Causam-nos estranheza as informações de que Glenn Greenwald foi denunciado sem sequer ser investigado”, ressaltou, em nota, a organização.
A ONG União Americana pelas Liberdades Civis (ACLU), dos Estados Unidos, pediu a imediata condenação da denúncia por parte do governo americano. “Nosso governo deve condenar imediatamente esse ataque ultrajante à liberdade de imprensa e reconhecer que os seus ataques às liberdades de imprensa em casa têm consequências para os jornalistas americanos que trabalham no exterior, como é o caso de Glenn Greenwald”, postou a ACLU no Twitter.
A Freedom of the Press Foundation – que tem como seu membro fundador o próprio Greenwald – fala em “tática de intimidação”. Conforme a ONG, o americano “lutou bravamente pela liberdade jornalística ao longo de toda a sua carreira” e, agora, é alvo da “escalada doentia dos ataques autoritários do governo Bolsonaro à liberdade de imprensa e ao Estado de direito”. Em nota, assinada pelo diretor executivo da entidade, Trevor Timm, a organização pede que o governo brasileiro “interrompa imediatamente a perseguição a Greenwald e respeite a liberdade de imprensa”.
A Electronic Frontier Foundation (EFF), que luta pela liberdade de expressão, também defendeu Greenwald, classificando a denúncia como “ameaça à democracia”. Já Edison Lanza, relator da Organização dos Estados Americanos (OEA) para a Liberdade de Expressão, afirmou no Twitter haver na denúncia contra Greenwald “preocupantes implicações para a liberdade de expressão”.
No Brasil
A Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) divulgou comunicado analisando trechos da denúncia e refutando os argumentos do procurador Wellington Divino Marques de Oliveira, que a assina. A entidade diz que a denúncia tem “como único propósito constranger” o jornalista e “é baseada em uma interpretação distorcida das conversas do jornalista com sua então fonte”.
Para a Abraji, o MPF abusa de suas funções “para perseguir um jornalista e, assim, violar o direito dos brasileiros de viver em um país com imprensa livre e capaz de expor desvios de agentes públicos”. A Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) afirma que o MPF “ignora a Constituição” ao denunciar Greenwald. “Ao jornalista não cabe o papel de recusar ou não divulgar informações de interesse público, porque obtidas de fontes anônimas e/ou sigilosas”, afirma a entidade, em comunicado.
O procurador Wellington Divino Marques de Oliveira, que assina a denúncia espúria, é o mesmo que acusou o presidente da OAB, Felipe Santa Cruz, em dezembro de 2019, de calúnia contra o ex-juiz federal e atual ministro da Justiça, Sergio Moro. Na semana passada, a Justiça rejeitou a denúncia.
Em 2019, o ministro Gilmar Mendes, do STF, concedeu uma liminar impedindo a investigação do americano pela operação Spoofing, sobre as ações do grupo de hackers, a fim de “garantir a proteção do sigilo constitucional da fonte jornalística”. A decisão de Mendes fortaleceu o Intercept, que vem divulgando uma série de mensagens atribuídas a Moro e a procuradores da Operação Lava Jato, com suspeitas de conluio entre o ex-juiz e o MPF na condução de inquéritos e ações penais contra réus como o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
As mensagens indicam que o então juiz teria orientado ilegalmente ações da Lava Jato, como negociações de delações, cobrado novas operações e até pedido para que os procuradores incluíssem uma prova num processo. Além disso, procuradores cogitaram investigar ministros do STF e tiveram inicialmente dúvidas em relação à delação de um empreiteiro que incriminou Lula. Outras mensagens indicam que o procurador Deltan Dallagnol também tentou aproveitar a exposição pública proporcionada pela Lava Jato para lucrar no mercado de palestras.
Com informações da Deutsche Welle