Paraisópolis: Ato ecumênico e grafites reforçam luta por justiça
Um ato ecumênico e diversos grafites em homenagem aos nove jovens mortos durante ação criminosa da Polícia Militar em Paraisópolis reuniram, neste domingo (8), moradores, familiares das vítimas e líderes comunitários. O ato foi realizado na viela da escadaria onde acontece o evento musical e contou com a participação de representantes de diversas religiões.
Publicado 09/12/2019 11:08
Emocionado, Danylo Amílcar, 19 anos, irmão Dênis Henrique Quirino da Silva, uma das vítimas, pediu por justiça. “Não é só minha família que está chorando. Tem mais oito. Meu irmão e os demais não voltam mais. Chega de violência. Se pudesse voltar no tempo, faria de tudo para que ele não tivesse vindo pra cá. O que nos resta agora é apresentar os culpados”, afirmou.
Bruno Ramos, representante nacional do movimento funk em São Paulo, também marcou presença. “Todos que morreram não são de Paraisópolis, vieram de fora”, disse. “É ausência total de ações culturais nas comunidades em que cada um dos nove morava. É um problema geral devido à falta de diálogo entre o poder público e as comunidades.”
Segundo o presidente da União dos Moradores de Paraisópolis, Gilson Rodrigues, a comunidade pretende entrar com ação na Justiça. “Vamos entrar com ação civil pública para que cada uma das nove comunidades dos jovens que morreram aqui tenha investimentos em cultura e educação”, disse.
O presidente da Ação Comunitária Nova Heliópolis, José Marcelo da Silva, foi ao ato com 20 moradores da comunidade prestar solidariedade às famílias. “Assim como aqui, nossa comunidade também teve uma morte no mesmo dia. Isso é problema da nossa política de Estado que está ultrapassada. É a mesma política pública de 40 anos atrás, de quando os bailes ainda eram feitos em garagens”, lembrou. “O Estado nunca organizada nada, apenas desorganiza com muita violência.”
O culto ecumênico teve um minuto de silêncio e leitura de passagem bíblica pelo Frei Alamiro, da Igreja Franciscana. Dom Lucas, do Mosteiro Dom Geraldo, também participou da cerimônia. O culto foi encerrado com um abraço coletivo e gritos de justiça. Segundo o pastor Igor Alexandre – que dirige uma igreja evangélica na viela do Massacre de Paraisópolis –, sete dos nove jovens morreram na porta da igreja.
Grafites
A cultura se somou à religiosidade na reação da comunidade. Uma semana após a chacina, as mesmas vielas onde as vítimas foram pisoteadas e sufocadas receberam grafites e novas homenagens. Nos muros, os grafites traziam mensagens de protesto contra a violência policial e pedidos de paz. “Paraisópolis pede paz, chega de preconceito com o povo pobre!”, diz uma das mensagens inscritas na viela.
“A viela é escura, não tem iluminação pública, e a maioria da comunidade tem medo de passar nessa viela, então os moradores se juntaram com os grafiteiros para mudar a cara dela”, conta Igor Amorim, membro da associação de moradores. Os desenhos e frases, feitos por grafiteiros voluntários de Paraisópolis e de outras regiões da cidade, foram feitos ao longo da manhã e tarde do domingo. O ato ecumênico marcou o encerramento de um fim de semana dedicado à memória das vítimas.
Além dos mortos de Paraisópolis, os moradores também lembraram da morte de uma pessoa na favela de Heliópolis, também na zona sul, no mesmo fim de semana. Três policiais militares envolvidos nessa ação foram afastados de suas funções, neste sábado, 7. Durante a madrugada, foi reeditado o Baile da DZ7, mesma festa interrompida pela ação da polícia uma semana antes. Muitos foram vestidos de branco, em referência aos pedidos de paz na comunidade.
A festa também foi marcada por homenagens às vítimas, com orações do Pai Nosso entoadas pelos presentes. Moradores disseram que o baile foi esvaziado em relação à semana passada e edições anteriores. A PM manteve um esquema de segurança reforçado no entorno da favela, e não houve ocorrências.
Segundo nota divulgada pela Prefeitura, uma comissão de secretários municipais e estaduais se reúne hoje com lideranças comunitárias de Paraisópolis. A intenção é “dialogar com a comunidade para criar e intensificar programas e políticas públicas que atendam às necessidades da população local”, diz a Prefeitura. Moradores devem entregar uma carta de reivindicações ao governo estadual nesta segunda (9). Uma audiência popular, só com membros da comunidade, deve ser realizada no sábado (14).