Consequências da privatização da Eletrobras

Governo quer vender a companhia por pouco mais que o lucro de um ano.

Wálmaro Paz

Eletrobras

Uma avaliação sobre o programa de privatizações do setor brasileiro de energia lotou o auditório da Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul na noite de quinta-feira (28/11). As duas maiores autoridades brasileiras no setor, os professores Ildo Sauer (USP) e Luiz Pinguelli Rosa (UFRJ) deram uma verdadeira aula sobre o setor, na mesa que teve como mediador o jornalista Juremir Machado da Silva e como anfitriã a vice-diretora da Faculdade de Ciências Econômicas, Maria de Lourdes Furno.

O primeiro a falar foi o professor Ildo Luís Sauer, engenheiro civil, mestre em energia nuclear, ex-diretor da Petrobras, diretor do Instituto Energia e Ambiente da USP. Apresentou a estreita relação existente entre a evolução da humanidade e a apropriação da energia. Segundo ele, tudo iniciou com o domínio do fogo, quando a humanidade começou a trocar a barriga pelo cérebro. O processo demorou mais de dez mil anos incluindo aí a metalurgia. Em seguida entrou o carvão mineral e com ele a energia a vapor movendo êmbolos e máquinas de produção, este processo demorou apenas uns 200 anos e a humanidade deu um salto populacional para 1,2 bilhão de habitantes.

No século XX, apareceu o petróleo e o salto demorou apenas 50 anos levando o salto da população para 7 bilhões de habitantes. Atrás dele vieram todas as outras formas de energia, a atômica e as limpas, hidrelétricas, energia eólica e a luz solar. Sauer lembrou que o Brasil até hoje utiliza a lenha como fonte de calor em quase um terço de suas atividades e o petróleo, carvão e hidroenergia em quase todo o restante. Neste século se iniciou o processo das energias limpas, geradores eólicos e fotovoltaicos que já representam uma grande parte da energia brasileira.

Ele explicou ainda que a maioria dos países mantêm o controle do petróleo e da energia, como uma necessidade estratégica, nas mãos de seus governos. “Por exemplo, os países da OPEP têm o controle da produção diária de barris para poder controlar os preços do petróleo, mas para isso é preciso que o governo controle as produtoras e a comercialização. Já, no caso brasileiro, ainda no governo Collor começou a se perder estes controles, passando partes grandes da Eletrobras para o domínio privado. No governo Fernando Henrique Cardoso começou o processo de privatização da Petrobras que não parou até hoje”.

Para ele é importante a apropriação social do controle energético, cujos lucros devem ser revertidos para a educação, saúde e infraestrutura. Chile foi pioneiro, sob a ditadura de Augusto Pinochet. “O Chile foi o laboratório. Depois é que vieram Thatcher, Regan e outros. O Guedes se formou lá”. Os protestos da população chilena na atualidade são as consequências do modelo, que resulta num Estado esvaziado, problemas sociais agravados.

Conforme Sauer, o Brasil não sabe sequer as reservas de petróleo que tem, “talvez sejam as maiores do mundo”. Reservas medidas são 100 bilhões de barris, “mas podem ser 200 bilhões ou mais com o pré-sal. Isto está sendo vendido em leilões que, justiça seja feita, começaram ainda nos governos do PT. Mas agora inventaram falácia de que a Petrobras estava quebrada, o que foi totalmente desmentido no “grande leilão” do mês passado, ela foi praticamente a única compradora.

A venda dos ativos de uma das maiores petroleiras do planeta está sendo mais rápida do que se tem notícia. Segundo Sauer, o atual governo quer fazer as maldades antes que a população se dê conta”. Ele lembrou ainda as privatizações dos gasodutos brasileiros que foram construídos pela Petrobras, a única empresa que explora e comercializa GLP no Brasil. “Foi o mesmo que ter se vendido a casa de moradia e depois pagar aluguel para continuar morando. Vendemos os gasodutos e a nossa empresa tem que pagar aluguel para vender o gás”. Afirmou ainda que o governo está vendendo as refinarias e, assim transformando o Brasil em exportador de óleo cru e importador de gasolina, diesel e os outros derivados. Salientou que a Eletrobras, que está no calendário das privatizações para 2020, já “está depenada”.

O problema é político

Para o professor Luiz Pinguelli Rosa, o problema é político. Segundo ele, jornalistas da grande imprensa justificam diariamente a necessidade de se vender a Eletrobras para que ela seja eficiente, “mas escondem que a empresa deu lucro de R$16 bilhões em 2018, e no primeiro semestre deste ano deu R$ 8 bilhões. Vão vender ações, para passar o controle da companhia por R$ 20 bilhões, pouco mais do que o lucro de um ano”. “Parece que o país foi tomado por marcianos”, brincou.

Criticou também a oposição que fica enfrentando as palhaçadas do presidente Bolsonaro e esquecem de olhar para o ministro da Economia Paulo Guedes, que está praticando as maldades. Comparou a atual realidade política brasileira com a ocupação da França pelos nazistas durante a Segunda Guerra Mundial, cujo exército se rendeu aos alemães, confiando que o nazismo venceria o socialismo da União Soviética, mas se enganou. Stalin se preparou e os soviéticos resistiram e venceram a guerra, apesar de perderem cerca de 20 milhões de vidas”.

Citou como casos que não mereceram a devida reação da oposição: a venda da BR Distribuidora: “Era o caixa da Petrobras”, e a privatização da distribuição de gás. “O discurso de que a competição fará as tarifas caírem é mentiroso: As tarifas vão aumentar, sentenciou.

O evento foi uma promoção da Fundação Maurício Grabois, o Sinergisul, o Instituo de Estudos Avançados Latino Americanos da UFRGS (Ilea/UFRGS), Faculdade de Ciências Econêmicas da UFRGS, o Sindicato dos Petroleiros, a CTB, CGTB, CSB, UGT, NCST, INTERSINDICAL, SINDIPOLO, SITRAMICO, SINDIMINEIROS Candiota, SINDIMINEIROS Butiá SENGE, SINTERGS, SINDECONSEASOP, SOCECON, CEBRAPAZ e DAECA. Na plateia, atentos, assistiam a exposição estudantes, professores, os ex-deputados estaduais Juliano Roso e Raul Carrion e o ex-governador Olívio Dutra.