Cândida Cristina: Uma carta aos agressores de mulheres no Brasil
Assustadoramente, os números apontam que o Brasil é o quinto país em morte de mulheres em todo mundo. Segundo dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, a cada 8 horas uma mulher é morta, simplesmente pela condição do gênero ou pelo ápice da violência doméstica já instalada no âmbito familiar ou na relação íntima de afeto.
Por Cândida Cristina Coelho Ferreira Magalhães*
Publicado 25/11/2019 13:31
Porém, os números ainda não alcançam a verdadeiro mapeamento, haja vista que o crime de violência doméstica é extremamente subnotificado por inúmeras razões. Logo, a condição de violência é ainda mais grave e latente.
Indubitavelmente, os fatos e as estatísticas demonstram que ser mulher é viver em riscos constantes, um estado de guerra ao qual nos sentimos ameaçadas a todo tempo, somos consideradas objetos, constantemente assediadas, violentadas e violadas até nas garantias mínimas, inclusive, mortas pela condição do nosso gênero. Definitivamente, ser mulher dá um frio na alma e um medo valente de transpor tudo que nos aprisiona.
Escrever uma carta com destinatário certo, Agressores e Feminicidas de mulheres, é um sentimento atemporal, esperançoso e revolucionário que chega e faz a alma falar em nome delas:
Apesar de morar no país tão violento contra as mulheres, meu corajoso manifesto chega ao “pé do ouvido” dos agressores de mulheres e minha voz ecoa em alto e bom som:
Venho por meio dessa carta contar que vocês são frutos da sociedade patriarcal e mero reprodutores de um machismo estrutural, desigual e excludente, com profundo reflexo na sua masculinidade. São roubados do melhor presente da vida… A arte de serem apenas sensíveis! Desses que choram, abraçam e respeitam mulheres, crianças e homens.
O sistema enganou vocês, senhores agressores, ao induzirem que seriam “donos das mulheres” e sob todas exerceriam o fraco poder do machismo, pois a falsa sensação de domínio não se mantém no tempo e tampouco serve-lhes de defesa, pois mulheres sabem voar.
Saibam que a violência contra as mulheres não é uma forma de controle e sim um crime tipificado pela Lei Maria da Penha desde 2006. Todas as formas de violência descritas no corpo da Lei podem até lembrar o passado, mas não são toleradas com nenhuma normalidade, pois todos os tipos de violências – física, moral, patrimonial, sexual e psicológica – são violações de direitos humanos.
Portanto, agressores de mulheres, parem de visitar os jardins imaginando que as flores serão aliadas da sua forma de dominação, pois alternância de agressões e flores é um mero reforço do ciclo da violência. Aprendam com os homens o velho ditado: “Em mulher não se agride nem mesmo com uma flor”. Exijo o respeito das minhas decisões. O ”não” de uma mulher é o limite do basta até aqui, simples assim!
Não se engane a respeito do amor. Esse sentimento não mata por ciúmes nem aprisiona o coração. Muitos dizem, como se fosse refrão de música: “Se não for minha, não será de mais ninguém. Matarei por amor”. A ideia de posse sobre nós, mulheres, é a tênue sensação de pertencimento perpétuo e objetificação dos nossos corpos. Não há delitos passionais nem romantização da morte de mulheres.
Desde 2015, o nome desse crime é Feminicídio, ocupa o rol dos hediondos com pena de até 30 anos de prisão. Portanto, amor é vida e respeito…
Importante ressaltar-lhes que, já há algum tempo, deixamos as tranças de rapunzel, abandonamos os sapatinhos de cristal e não mais aceitamos sermos despertadas do sono profundo por beijo roubado. A desconstrução da imagem de um príncipe encantador deu lugar a liberdade e aos sonhos.
Logo, não se trata de um pedido de socorro, mas uma exigência que os direitos humanos das mulheres sejam inatingíveis e preservados. Que se permitam uma profunda reflexão e uma ruptura com as velhas construções para o nascimento de um homem apenas humano.
Basta de violência! A vida nos pertence…
* Cândida Cristina Coelho Ferreira Magalhães é advogada e consultora jurídica