A feiura da democracia brasileira
Entre 1996 e 2001, cursei o Ensino Médio e Técnico no Centro Federal de Educação Tecnológica da Bahia (CEFET-BA), atual Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia da Bahia (IFBA). Lá, tive a oportunidade de estudar Geologia e aprender sobre os processos de formação da Terra, especialmente sobre as várias etapas de depuração da água, as quais têm por finalidade levar saúde à população.
Por Armando Januário dos Santos*, na Carta Maior
Publicado 14/09/2019 16:06
Recordando esse período da minha vida, lembrei também da declaração de Janaína Paschoal (PSL-SP), em 30 de junho de 2018, justificando seu apoio ao presidente da República, à época, candidato. Segundo ela afirmou, é ele quem possui condições para liderar “a continuidade do processo de depuração”. Utilizando a palavra depuração e indicando a suposta capacidade de Jair Bolsonaro para purificar moralmente a cultura política brasileira, Janaína – a mesma que recebeu R$ 45 mil do PSDB para a elaboração do pedido de impeachment da presidenta Dilma Rousseff – hoje se diz chocada com o presidente.
Como se percebe, depuração é um termo antagônico às ações do Governo Federal. São inúmeras as evidências nesse sentido, logo, é melhor não se prender aos grandes eventos que comprovam a falta de asseio moral do mandatário da República e seu grupo – ataques aos direitos sociais e trabalhistas, apoio aos grandes proprietários de terra que perpetraram o Dia do Fogo na Floresta Amazônica, suspeita de relações com as milícias do Rio de Janeiro – e voltar a atenção para a imagem que o presidente e seu ministro da Economia têm da primeira-dama da França, Brigitte Macron.
As declarações misóginas de Bolsonaro, reforçadas por Paulo Guedes, dizem muito sobre a dimensão imaginária da nossa sociedade. Demonstram a agressividade de parcela da população brasileira, que ao não se reconhecer na cultura de outros povos, ataca seus valores. Nesse cenário, percebemos como certos estratos políticos refletem de modo emblemático seus eleitores: há no Brasil um expressivo contingente social de pensamento autoritário, partindo de um ego adoecido para projetar nos outros o que pensa de si, contudo, ao não encontrar identificação, posiciona-se, intolerante, para produzir violências, sobretudo, no campo da linguagem.
Por favor, Brigitte, fique tranquila. O conteúdo do que foi falado – e reafirmado – para lhe ofender, na verdade, não foi dito para você. Não lhe cabem tamanhas afrontas. De fato, a ausência de beleza reside em nossa democracia, agonizante nas mãos de pessoas toscas e sem brilho.
Impuro e insalubre, tóxico e nauseabundo, nosso modelo político se esvai em ares impossíveis de respirar. Disforme e desengonçada, a democracia brasileira ruma para o cemitério. Entretanto, há esperança na luta por sua regeneração, certamente capaz de superar todas as adversidades.