Comissão na Câmara devolve Funai e demarcação de terras para Justiça
Os povos indígenas tiveram uma vitória histórica – ainda não definitiva – contra o único governo eleito, nos últimos 30 anos, que anunciou que não oficializaria mais Terras Indígenas (TIs). De acordo com o relatório da Medida Provisória (MP) 870/2019 aprovado pelo plenário da Câmara dos Deputados, na noite da última quarta (22), a Fundação Nacional do Índio (Funai) volta a ter a competência de demarcar essas áreas e a ser subordinada ao Ministério da Justiça.
Publicado 27/05/2019 10:32
A MP prevê a reorganização das competências e estruturas dos ministérios e foi editada no primeiro dia do governo Bolsonaro. Ela reduziu o número de pastas na administração federal de 29 para 22.
O texto ainda tem de ser referendado pelo plenário do Senado e pelo presidente da República. Não estão descartadas alterações, mas a tendência é que os senadores ratifiquem a redação saída da Câmara. Se a proposta for alterada por eles, terá de ser apreciada mais uma vez pelos deputados. A questão é que a medida precisa ser aprovada até o dia 3/6 ou perderá validade.
Mais difícil é saber se Jair Bolsonaro vai sancionar ou não, total ou parcialmente, o Projeto de Lei de Conversão da MP. O Congresso tem a prerrogativa de analisar os vetos do presidente. Daí o assunto não estar encerrado.
Mudanças na Comissão Mista
A comissão mista especial que analisou a MP 870 aprovou o relatório do senador Fernando Bezerra (MDB-PE), no início do mês, com uma série de alterações à redação original. Ela previa a transferência da Funai do Ministério da Justiça ao recém-criado Ministério da Família, Mulher e dos Direitos Humanos. Além disso, colocou a competência de formalizar as TIs nas mãos do Ministério da Agricultura (Mapa), comandado pelos ruralistas, inimigos históricos das pautas indígenas (leia série de reportagens especiais do ISA sobre a reforma ministerial).
Durante a campanha eleitoral, Bolsonaro repetiu várias vezes que paralisaria de vez as demarcações. A transferência da atribuição ao Mapa faz parte do plano para cumprir a promessa.
“O retorno da Funai ao Ministério da Justiça, com todas as suas atribuições, é nada mais do que a manutenção dos direitos indígenas. Ele reafirma o respeito ao espírito da Constituição no sentido de resguardar esses direitos de qualquer ingerência do agronegócio”, comentou Luís Eloy Terena, assessor jurídico da Articulação dos Povos Indígena do Brasil (Apib).
O advogado avalia que a votação da última semana também é fruto da pressão do movimento indígena, que lutou pela alteração da MP desde o primeiro dia do novo governo. O tema foi um dos motes do Acampamento Terra Livre (ATL), manifestação que reuniu quase quatro mil indígenas, em Brasília, no final de abril.
Ao final de horas de negociações e embates, os ruralistas concordaram em manter a redação sobre a questão indígena, mas exigiram a retirada da emenda que previa o retorno do Serviço Florestal Brasileiro (SFB) à órbita do Ministério do Meio Ambiente (MMA). A MP subordinou o órgão, que controla o estratégico Cadastro Ambiental Rural (CAR), ao Mapa.