Conferência na Sérvia debate os 20 anos da agressão da Otan
O Fórum de Belgrado por um Mundo de Iguais, o Clube de Generais e Almirantes da Sérvia e a Sociedade Sérvia de Anfitriões organizaram eventos em Belgrado, em 22 e 23 de março, para registrar o 20º aniversário da agressão da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) contra a ex-Iugoslávia. O Conselho Mundial da Paz (CMP) participou e a presidenta Socorro Gomes e outros membros fizeram contundentes denúncia da agressão.
Publicado 26/03/2019 08:57
Com uma grande conferência internacional intitulada “Paz e Prosperidade contra a Guerra e a Pobreza”, os oradores –inclusive autoridades do período da agressão e atuais– condenaram não só a devastação e as mortes causadas pelos bombardeios, como também a ofensa ao direito internacional que abriu precedentes perigosos para todas as nações.
Em 24 de março de 1999, membros da OTAN, liderados pelos EUA, lançaram uma ofensiva contra a ex-República Federal da Iugoslávia que durou 78 dias, usando armas de efeito prolongado, como o urânio empobrecido. Milhares de pessoas foram mortas ou obrigadas a se deslocar em busca de refúgio; danos à infraestrutura foram estimados em mais de 100 bilhões de dólares à época.
Entre os oradores, estiveram o ex-chanceler Zivadin Jovanovic, presidente do Fórum de Belgrado por um Mundo de Iguais, membro do CMP, diversas autoridades políticas e religiosas da Sérvia e do exterior, líderes de comitês internacionais de solidariedade ao povo sérvio que protestaram em massa contra a agressão e os delegados de entidades membros e dirigentes do CMP. Leia ao final da matéria o discurso da presidenta do CMP, Socorro Gomes.
Parte da programação, um painel da juventude foi realizado sob o lema da conferência internacional, “Não Esquecer”, onde pesquisadores e advogados sérvios e solidários internacionais discutiram o tema. Representantes do Cebrapaz, Moara Crivelente, do Movimento da Paz Theco, Milan Krajca, e do Conselho Português para a Paz e Cooperação (CPPC), Filipe Ferreira –membros do CMP– falaram da militarização na América Latina e na Europa e da campanha pela dissolução da OTAN. Leia ao final da matéria a fala de Moara Crivelente no painel.
Agressão imperialista contra a Iugoslávia
O objetivo das potências agressoras era completar a desintegração da Iugoslávia após o fim da União Soviética e da República Federativa Socialista –conformada pela Sérvia, Montenegro, Croácia, Eslovênia, Bósnia-Herzegovina e Macedônia– em 1991-1992, sucedida pela República Federal da Iugoslávia, cujo reconhecimento como sucessora da federação socialista foi boicotado na ONU. A República Federal da Iugoslávia dissolveu-se em 2003, resultando na União Estatal da Sérvia e Montenegro, por sua vez dividida em 2006 entre as duas unidades nacionais. Os membros da OTAN respaldaram ainda a secessão da província sérvia de Kosovo e Metóquia, de maioria albanesa, que declarou independência em 2008 e se tornou praticamente um protetorado das potências imperialistas.
Diversos oradores sérvios, como o atual ministro da Defesa Aleksandar Vulin, enfatizaram a importância da classificação da dita “operação” da OTAN como uma “agressão”; o termo tem definição jurídica e evidencia a intenção criminosa da ação. Além disso, desde 2018 o Tribunal Penal Internacional pode julgar indivíduos pelo crime de agressão –quando um estado usa a força violando a “soberania, a integridade internacional e a independência política” de outro– já classificado pelos Tribunais de Nuremberg e de Tóquio dos anos 1940. Ainda que reivindicações não possam ser feitas retroativamente ao Tribunal e ainda cerca de 35 países aceitaram a emenda ao estatuto da Corte, a definição carrega importante significado político.
“No momento mais obscuro tentaram nos convencer de que éramos culpados pela agressão de que fomos vítimas. Mas aqueles que se solidarizaram conosco nos deram força e inspiração para reagir”, disse o ministro da Defesa. “Vidas de crianças sérvias, policiais e soldados, também contam. (…) Nenhuma nação tem o direito de dizer que civis e crianças foram danos colaterais. (…) Tentaram matar a Sérvia, mas mataram o direito internacional”, afirmou Vulin. Mencionando a integração de países da região e do antigo Pacto de Varsóvia à OTAN, Vulin garantiu que a Sérvia não trilhará o mesmo caminho e “nunca fará às outras nações o que fizeram conosco”.
A prática imperialista dos membros da OTAN, especialmente os EUA, o Reino Unido e a França, de intervenção e agressão contra nações que ousem defender sua soberania, integridade territorial e independência política, foi o principal alvo das denúncias dos participantes da conferência, nacionais e internacionais. Em especial, a campanha midiática de mentiras e desinformação foi amplamente condenada e os paralelos com casos mais recentes, enfatizados, assim como a aliança imperialista com forças paramilitares locais como o chamado “Exército de Libertação do Kosovo” (KLA, na sigla em inglês), a demonização de líderes nacionais e a manipulação de questões étnicas para inflamar conflitos.
Os oradores enfatizaram os perigos do precedente aberto pela agressão contra a ex-Iugoslávia, quando o pretexto de uma intervenção humanitária passa a ser usado para justificar ofensivas.
Neste sentido, os participantes denunciaram agressões subsequentes, inclusive aquelas que não tiveram o respaldo do Conselho de Segurança, como demanda a Carta das Nações Unidas. Foram os casos do Iraque, Afeganistão, Líbia e Síria, assim como as ameaças, neste caso ainda isoladamente, pelos Estados Unidos contra a República Bolivariana da Venezuela, com a clara intenção de impor ao povo venezuelano uma mudança de regime sob o pretexto evidentemente falso de promover a democracia e proteger os direitos humanos.
Além da conferência, a programação dos 20 anos da agressão incluiu ainda uma exibição rica em informações e imagens e visitas aos monumentos às vítimas, onde os participantes puderam prestar sua homenagem.