Flávio Dino critica pacote de Moro: “demagogia” pode piorar violência

O governador Flavio Dino (PCdoB-MA) criticou duramente o “pacote de Moro” – projeto de lei anticrime que o ministro Sérgio Moro (Justiça e Segurança Pública) apresenta nesta terça-feira (19) ao Congresso Nacional. Segundo Dino, o foco do pacote na legislação e a lógica em prender mais formam uma “demagogia populista, simbólica e equivocada”.

Flávio Dino

“Quem estuda a segurança pública no Brasil tem sublinhado, ao longo das últimas décadas, que mais importante do que a mudança de leis são as mudanças de gestão e de práticas”, afirma Dino, em entrevista ao UOL. Moro, em sua opinião, investe numa estratégia infrutífera. “Gastar muita energia em mudança de leis – quando o centro do problema está na estrutura e na forma de atuação do sistema policial de modo geral – é uma prioridade equivocada.”

Em vez de “prender todo mundo”, é imprescindível “cuidar do modo como as pessoas são presas”, diz o governador – que já foi juiz federal, a exemplo do ministro. “Se [as pessoas] forem presas de qualquer forma, vai aumentar a violência na sociedade, o que, claro, ninguém deseja”.

Para Dino, as mudanças propostas no pacote de Moro vão, todas, “na mesma direção. Portanto, colherão as mesmas consequências, que é a ampliação do número de pessoas presas”. Mais presos, explica o governador, requer “mais investimentos e condições para o sistema penitenciário dar conta dessa demanda” – o que, porém, não está previsto.

“Teremos, na verdade, um efeito negativo em relação aquilo que vem sendo anunciado como um dos objetivos principais: combater o poder das facções criminosas”, analisa Dino. “No Brasil, o cárcere ainda é visto como caminho principal de repressão. Mais policiais, mais investigação, mais prevenção, mais pessoas presas – infelizmente é assim que tem sido.”

Outra crítica diz respeito à generalização excludente de ilicitude – uma espécie de “licença para matar” que Moro e Bolsonaro querem estender a todos os policiais. De acordo com Flávio Dino, “as causas de excludente de ilicitude já existentes no Código Penal são suficientes: legítima defesa, estado de necessidade, exercício regular do direito e cumprimento do dever legal. Não há nenhum sentido em alterar isso”.

Na visão de Dino, a forma como o excludente de ilicitude está sendo revisto provocará “a ampliação de casos de sacrifício de vidas”. O governador cita o assassinato do jovem negro Pedro Henrique Gonzaga, que, na quinta-feira (14), foi imobilizado, estrangulado e morto por um vigilante do supermercado Extra da Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro.

“Vimos infelizmente uma tragédia, um caso prático, do que pode acontecer com a generalização dessa nova excludente de ilicitude, essa nova legítima defesa, que foi o caso do supermercado Extra. É tipicamente o que o Sérgio Moro está tentando legalizar – ou seja, o chamado excesso”, opina Dino. “A pessoa, o vigilante no caso, tomado por um medo, justificaria o seu excesso. ‘Eu me excedi porque estava tomado pelo medo, pela surpresa, pelo espanto’, que são as palavras que estão no projeto.”

O caso Pedrinhas

O projeto de Moro – uma das vitrines da gestão direitista de Jair Bolsonaro (PSL) – vão na contramão do que o governador do PCdoB vêm implantando no Maranhão desde 2015. Em linhas gerais, Dino aposta numa política de combate à criminalidade baseada na integração com o quadro social. Essa diretriz melhorou a situação das prisões no Maranhão, em especial o Complexo Penitenciário de Pedrinhas – que, num período anterior, era conhecido pelas frequentes e violentas rebeliões.

“É imprescindível, quando se cuida de segurança pública, não apenas mudar leis, não apenas entupir as penitenciárias, mas cuidar do sistema. O que fizemos em Pedrinhas? Eliminamos a terceirização indiscriminada que havia lá com concurso público. Melhoramos os recursos humanos. Treinamos, capacitamos, ampliamos as oportunidades de trabalho e de estudo”, enumera Dino.

Neste ano, após um mandato de quatro anos de Dino à frente do governo estadual, a notícia que vem de Pedrinhas é positiva: mais de 400 presos foram aprovados no Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) e aceitos em postos de trabalho. “Tivemos no último Enem 900 presos inscritos. Metade foi aprovada. A gente caminha na direção certa e as estatísticas mostram isso.”

Dino rejeita o rótulo “de exemplo” para a experiência da segurança pública no Maranhão. Mas diz que o resultado colhido no estado “pode servir de referência, diria, do que tem que acontecer” no Brasil. O que houve no estado foi, antes de tudo, “o enfrentamento de questões sociais”, seguido da “boa gestão do sistema”. Diante de elevadas taxas de homicídio, o governo investiu no policiamento. A região metropolitana de São Luís já chegou a ter mil homicídios em um ano. “Fechamos ano passado na casa dos 300 e pouco – ou seja, uma redução de mais de 60%”, diz o governador.

“Isso derivou do fato de eu ter colocado mil viaturas novas nas ruas, de eu ter colocado quase 5 mil policiais novos, de concursos públicos. Então, esses números de investimento na política tiveram esse efeito”, afirma

Justiça

Dino também sublinha a ampliação da eficiência da polícia. “Uma política mais eficiente resulta nesses dois subprodutos: de um lado, a diminuição das taxas de criminalidade; e, de outro, como o caminho legal é exatamente o sistema prisional, acabou tendo esse impacto”.

Agora, um dos gargalos está nas mãos do Judiciário, afirma Dino. “A Justiça mantém ainda um grande número de presos provisórios.” Da população carcerária do estado, cerca de 40% “são de presos que não foram julgados ainda. E isso não é uma questão que caiba ao governo – mas, sim, a outros poderes do Estado”. A seu ver, é necessário investir em “penas alternativas e medidas despenalizadoras”.