Maia critica Onyx e fala em “distância segura” do governo Bolsonaro

 As relações entre o governo Jair Bolsonaro e o presidente da Câmara Federal, Rodrigo Maia (DEM-RJ), azedaram nas últimas semanas, indicando um desgaste aberto e crescente na articulação do Executivo junto ao Legislativo. Nesta sexta-feira (1/2) – data em que Bolsonaro completa um mês na Presidência –, Maia disputa a reeleição ao comando da Câmara com o apoio do PSL, partido do presidente da República – mas não esconde que está cada vez mais afastado do Palácio do Planalto.

Por André Cintra

Maia x Bolsonaro

 A dois dias da eleição, uma notinha publicada na coluna de Lauro Jardim, no jornal “O Globo”, com o título “Maia e a distância de Bolsonaro”, já dava pistas do cenário: “Rodrigo Maia, quando pede votos aos pares, lista razões para a Câmara guardar uma distância de segurança de Jair Bolsonaro (…). Maia alerta que, a tomar pelos primeiros dias, ninguém aposta um real no sucesso da gestão e, se a casa cair, quem estiver por perto não conseguirá se lançar como alternativa ao eventual fracasso do capitão. Até agora, nenhum deputado discordou da tese”.

Mas a descrença na administração Bolsonaro não é a única razão para as ressalvas de Maia. “Na véspera da eleição para o comando da Câmara e do Senado, a avaliação era a de que, independentemente do resultado, o governo não poderá contar com a gratidão dos vencedores”, registrou a “Folha de S.Paulo”, em seu “Painel”. Conforme o jornal, Maia, “franco favorito” na disputa desta tarde, “confidenciou a aliados que tem, sim, um compromisso com a bancada do PSL, que aderiu à sua candidatura, mas não com o Executivo. Motivo: o ministro Onyx Lorenzoni (Casa Civil) trabalhou o quanto pode para atrapalhar o democrata”.

É consenso em Brasília que o apoio do PSL a Maia diminuiu o protagonismo de Bolsonaro e sua equipe. Demonstrando inexperiência e até mesmo inépcia política, o governo não conseguiu construir uma candidatura própria e mais alinhada nas eleições à presidência da Câmara e do Senado. Sem margem de iniciativa, a opção pró-Maia – admite a bancada do PSL – foi a possível, não a ideal.

Dos 52 deputados do partido que assumem hoje o mandato na Câmara, quem abre o jogo e revela conveniência, sem meias palavras, é a jornalista Joice Hasselmann, eleita em São Paulo com mais de 1 milhão de votos. “É o que temos para o momento”, declara ela ao Valor Econômico. A seu ver, havia o risco de o PT se juntar a partidos de Centro e aos “nanicos” para ter a “prerrogativa” de indicar o presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Assim, segundo Joice, os petistas poderiam dificultar o andamento de projetos de interesse do governo.

“Tem que mudar esse regimento. Mas a regra do jogo hoje é essa”, choraminga a deputada. “A CCJ ia ficar na mão do PT. Como é que eu ia deixar a CCJ na mão do PT? Só se eu fosse louca de pedra”, afirma. Joice, por sinal, era uma das críticas mais ácidas e contumazes do presidente da Câmara. “Vi como é cortar na própria carne. Cortei na própria língua. Porque ninguém deu tanta pancada nesse Rodrigo Maia quanto eu. Tive que esticar minha língua em uma guilhotina bem grande e cortar.”

Outra parlamentar eleita, a deputada estadual Janaína Paschoal (PSL-SP), não escondeu o dissabor em sua conta no Twitter. “Sei que muitos entendem que eu deveria ficar calada. Eu tento (Rs). Mas para não correr o risco de me omitir, vou escrever o que venho falando reservadamente: Os apoiadores do novo governo vão se arrepender AMARGAMENTE de votar em Maia e em Renan! O arrependimento virá rápido!”.

Composição

Na eleição anterior à Mesa da Câmara, em 2017, Maia recebeu os votos até de partidos de esquerda e cumpriu os acordos firmados. Essa composição foi decisiva, por exemplo, para barrar o projeto “Escola sem Partido”, impedir a CPI que visava criminalizar a UNE e os movimentos sociais, além de paralisar o processo de privatização da Eletrobras. Maia também acatou o pedido de deputados como Orlando Silva (PCdoB-SP) e ajudou a adiar para 2030 a entrada em vigor das regras mais draconianas da cláusula de barreira.

Nesta terça-feira, ao pleitear a reeleição à presidência da Casa, o deputado do DEM terá o apoio de 15 partidos, o que dilui o peso do PSL. Se Maia confirmar as expectativas e permanecer à frente da Câmara, haverá sintonia da Mesa com o governo Bolsonaro em pautas específicas. É o presidente da República – e não a presidência da Câmara – que sai enfraquecido nesse precoce cabo-de-guerra entre Executivo e Legislativo.