Nágyla Drumond: O espetáculo pink and blue
"Por trás e por dentro da frase genialmente infame há um projeto de poder que reforça a submissão feminina ao mando masculino, patriarcal. Uma ode ao machismo, à truculência, à violência em meio a palmas e gritos de glória que tocam forte o coração daquelas milhares de gentes que regozijam em oração”.
Por Nágyla Drumond*
Publicado 04/01/2019 11:01 | Editado 04/03/2020 16:22
“Menina veste rosa; Menino veste azul” é uma frase-síntese genial. Perdoem-me, mas genial sim. Mais simples e direto, impossível. Mais alinhada ao repertório da agenda que vocifera abolir o socialismo no Brasil, impossível.
Numa frase pretensamente angelical, a nocividade de consolidar modelos naturais de feminino e masculino numa perspectiva que aborta o esforço de décadas na garantia de uma agenda de direitos sexuais e direitos reprodutivos; sociais, políticos, culturais.
Por trás e por dentro da frase genialmente infame há um projeto de poder que reforça a submissão feminina ao mando masculino, patriarcal. Uma ode ao machismo, à truculência, à violência em meio a palmas e gritos de glória que tocam forte o coração daquelas milhares de gentes que regozijam em oração. Uma oração que evoca a morte, a eliminação do diferente, a negação da alteridade. Sempre com um sorriso no rosto.
Em nossa bolha soa como bizarro. Lamento informar que eles não falam para nós. Só lamento. Acho que até eles já ficam esperando pela enxurrada de memes e deboche. Não criminalizo o deboche, mas há limites.
O espetáculo “pink and blue” integra uma plataforma econômica e política entreguista, lesa-pátria , vendilhã. São outras páginas, da mesma agenda conservadora, falseada de moderna pelos batedores de continência, Chicago's Boy e congêneres.
Todas as declarações se ancoram em: o povo não quer mais o modelo passado; as pessoas querem mudar; as pessoas votaram por suas famílias; o povo quer resgatar as famílias. Já paramos para pensar quantas vezes em reuniões familiares nos deparamos com debates dessa natureza? Pensemos.
Menos meme, meu povo. Mais estratégia. Eles não são imbecis. Se o fossem, seriam inofensivos. Eles são fascistas.
*Nágyla Drumond é Socióloga, professora, doutoranda em sociologia (UFC)
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