Publicado 31/12/2018 19:17
Uma clara situação de conflito de interesses com possibilidade concreta de virar crime de prevaricação (uso do cargo público para benefício pessoal). É esta a tendência apontada em longa reportagem do site The Intercep que revela diversos casos em que investimentos pessoais do futuro ministro da Economia, Paulo Guedes, poderão render altos lucros com a agenda econômica ultraliberal que ele pretende implementar no país.
Antes de ser o “Posto Ipiranga” do presidente eleito Jair Bolsonaro, Paulo Guedes, em vias de se tornar o mais poderoso ministro à frente da economia brasileira desde o fim da ditadura militar, construiu sua carreira no universo financeiro, também como um “posto Ipiranga”. A partir dos anos 80, pessoas físicas, empresas e, principalmente, fundos que cuidam do dinheiro de outras pessoas e empresas confiaram na propalada sabedoria de Guedes para aplicar seus recursos.
Nos últimos cinco anos, o faro de Guedes esteve à serviço da Bozano Investimentos, uma gestora de recursos sediada no coração do bairro mais nobre do Rio de Janeiro, o Leblon. Três dias depois da vitória de Bolsonaro, o economista ainda era o presidente da Bozano – depois, se afastou da empresa e disse que venderá suas ações até 1º de janeiro. E a maneira como aplicou o dinheiro gerido pela companhia indica que, para serem rentáveis, esses investimentos dependem de privatizações nas áreas de saúde, educação e energia, além de reformas liberais no setor financeiro, no varejo e na construção civil.
Há também, sob gestão da Bozano, fundos que se concentram em investimentos em títulos públicos, mas “é o posicionamento das fichas de Guedes na roleta do mercado de ações que revela a força da convergência entre as intenções declaradas por ele para a economia brasileira e as apostas feitas em praticamente todas as empresas investidas pela Bozano”, diz a reportagem.
O Intercept analisou as 23 empresas (entre as cerca de 350 que negociam ações na Bolsa brasileira) nas quais a Bozano apostava em julho deste ano com seu único fundo específico para investi-mento em ações, o Bozano Fundamental. Eram R$ 77 milhões em ações dessas 23 empresas em um momento em que Guedes ainda atuava como presidente da gestora de fundos, antes de se afastar para a campanha.
Não é possível saber a composição da carteira de investimentos do fundo nos últimos três meses, porque a Bozano pediu sigilo à Comissão de Valores Mobiliários (CVM), entidade que regula esse mercado. De qualquer maneira, é possível verificar a quantidade de empresas nas quais o fundo aposta e o valor aplicado em cada papel. Em outubro, o fundo estava investindo em 27 companhias.
No recorte de julho, ações do Bradesco e da B3 (antiga BM&F) eram os principais investimentos do fundo da Bozano. Guedes tem alinhamento natural com o setor bancário e com o mercado finan-ceiro, privilegiados pela lógica ultraliberal defendida por ele.
Nesse contexto, a reforma da Previdência, considerada ideal por Guedes, é a primeira ponta de interesse dos bancos privados. Eles estão de olho no sistema de capitalização. Cada trabalhador contri-buiria para a sua própria conta de aposentadoria, que poderia ser resgatada mensalmente até o fim da vida a partir de determinada idade ou sacada na íntegra. Isso acabaria com o sistema atual de repartição, em que a contribuição de cada um serve também para pagar a aposentadoria de outros cidadãos.
Serão os bancos privados a gerenciar o dinheiro dessas futuras aposentadorias – sendo remunerados pelo serviço. Hoje, apenas bancos públicos são beneficiados com esse dinheiro.
O Bradesco, no qual a Bozano investe, lucrou R$ 2,6 bilhões nos nove primeiros meses deste ano somente com o segmento “Vida e Previdência”. Isso foi 18% de todo o lucro do banco no mesmo período. O tamanho do mercado que se abre com o fim do monopólio do INSS na administração das aposentadorias da CLT é gigantesco.
A informação é do Monitor Mercantil